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MPF denuncia 4 empresas e 22 pessoas por desastre em Mariana

Para procuradores, a tragédia ocorreu por "omissão criminosa" dos denunciados e "a ganância desmedida das empresas por lucro" foi o que levou aos homicídios

Mariana: Destruição provocada pelo rompimento de barragens da Samarco (Ricardo Moraes/Reuters)

Bárbara Ferreira Santos

Publicado em 20 de outubro de 2016 às 15h01.

Última atualização em 20 de outubro de 2016 às 19h56.

São Paulo - O Ministério Público Federal (MPF) denunciou, nesta quinta-feira (20), 4 empresas e 22 pessoas pelo rompimento da Barragem de Fundão, da Samarco, em Mariana , em Minas Gerais .

Desse total, 21 pessoas são acusadas de homicídio qualificado com dolo eventual, que, em linhas gerais, significa que eles teriam assumido o risco de matar.

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Entre os denunciados estão o então diretor-presidente da Samarco, Ricardo Vescovi;o diretor de Operações e Infraestrutura, Kleber Luiz de Mendonça Terra; três gerentes operacionais da empresa; 11 integrantes do Conselho de Administração da Samarcoe representantes do conselho da Samarco por indicação da BHP e Vale.

Samarco, Vale, BHP Billiton e VogBr, prestadora de serviços de engenharia, foram as empresas denunciadas.

Os procuradores do MPF apresentaram o conteúdo da denúncia durante coletiva de imprensa em Belo Horizonte na tarde desta quinta-feira. Segundo eles, os acusados, "de forma consciente, realizaram uma série de ações e omissões que levaram ao rompimento da barragem".

Eles ainda afirmaram que a tragédia só ocorreu por causa da "omissão criminosa" dos denunciados e que "a ganância desmedida das empresas por lucro" foi o que levou aos homicídios.

Durante a coletiva, o procurador da República José Adércio Sampaio afirmou que, em abril de 2009, houve a necessidade de suspensão de depósitos de rejeitos na barragem por falhas na drenagem.

Segundo Sampaio, em 2011 e 2012 novos problemas foram encontrados, mas o projeto de recuo da barragem, que tinha o objetivo de corrigir as falhas, foi entregue a um engenheiro recém-contratado. "Adotou-se uma solução caseira", afirmou o procurador.

As obras desse recuo só foram informadas à auditoria externa em 2013, de acordo com Sampaio.

Os procuradores também destacaram o papel de responsabilidade do Conselho de Administração da Samarco, que tinha representantes da Vale e da BHP Billiton.

"Mesmo sabendo da falha no recuo da barragem, os conselheiros se mantiveram inertes. A diretoria da Samarco possuía competências e atribuições para adotar medidas de segurança e gestão das barragens, mas nada fizeram", afirmou o procurador Jorge Munhós.

Segundo ele, documentos de gestão de riscos da Samarco previam cenários de risco de rompimento da barragem. "Esses documentos eram periodicamente discutidos com a diretoria, órgãos de governança e o Conselho de Administração da empresa", disse Munhós.

O procurador Eduardo Aguiar explicou que a denúncia está dividida entre crimes contra o meio ambiente e crimes previstos no código penal.

Foram quatro os crimes denunciados previstos no código penal: homicídio, lesão corporal grave, inundação e desmoronamento. Entre os 12 crimes ambientais citados, estão poluição qualificada, crimes contra a fauna, a flora e a administração ambiental.

O que dizem Vale, Samarco e BHP

A mineradora Vale afirmou nesta quinta-feira, em comunicado, que repudia a denúncia de executivos e empresas pelo MPF no caso do rompimento da barragem da Samarco.

A empresa afirmou que seus funcionários "jamais foram informados pelo corpo técnico e diretivo da Samarco sobre quaisquer irregularidades que representassem riscos reais e/ou não tratados à barragem, nem por qualquer das consultorias responsáveis pelo monitoramento técnico daquela estrutura".

Por meio de nota, a Samarco afirmou que "refuta a denúncia" e que o MPF "desconsiderou as defesas e depoimentos apresentados ao longo das investigações", que "comprovam que a empresa não tinha qualquer conhecimento prévio de riscos à sua estrutura".

Segundo a empresa, as medidas sugeridas e implantadas na gestão da estrutura seguiam as "melhores práticas de engenharia e segurança". A Samarco também disse que a estabilidade da barragem foi atestada pela consultoria Vogbr, outra empresa denunciada pelo MPF à Justiça.

Já a BHP Billiton afirmou que está ciente das declarações do MPF, mas ainda aguarda receber a notificação formal da denúncia.

Em nota, a multinacional declarou que "repudia veementemente as acusações contra a empresa e os indivíduos denunciados e irá apresentar sua defesa contra as denúncias oferecidas, prestando também todo o suporte na defesa dos indivíduos denunciados".

O desastre

O rompimento da barragem ocorreu em novembro de 2015 e completa um ano no próximo dia 5. Ele é considerado o maior desastre do gênero da história mundial nos últimos 100 anos e o pior desastre ambiental da história do Brasil.

O desastre deixou 19 mortos, centenas de desabrigados e poluiu o rio Doce, que cruza diversas cidades até alcançar o litoral do Espírito Santo.

Se for considerado o volume de rejeitos despejados – 50 a 60 milhões de metros cúbicos (m³) –, o acidente equivale, praticamente, à soma dos outros dois maiores acontecimentos do tipo já registrados no mundo – ambos nas Filipinas, um em 1982, com 28 milhões de m³; e outro em 1992, com 32,2 milhões de m³ de lama.

Veja a lista completa de denunciados pelo MPF:

EMPRESAS

1- Samarco Mineração S.A.

2- Vale S.A.

3- BHP Billiton Brasil LTDA.

4- VOGBR Recursos Hídricos e Geotecnia LTDA.

PESSOAS FÍSICAS

5- Ricardo Vescovi de Aragão, diretor-presidente afastado da Samarco, brasileiro;

6- Kleber Luiz de Mendonça Terra, diretor de Operações e Infraestrutura da Samarco, brasileiro;

7- Germano Silva Lopes, gerente geral de Projetos Estruturantes da Samarco, brasileiro;

8- Wagner Milagres Alves, gerente geral de Operações de Mina da Samarco, brasileiro;

9- Daviely Rodrigues Silva, gerente de Geotecnia e Hidrogeologia da Samarco, brasileira;

10- Stephen Michael Potter, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da Vale, britânico;

11- Gerd Peter Poppinga, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da Vale, brasileiro;

12- Pedro José Rodrigues, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da Vale, brasileiro;

13- Hélio Cabral Moreira, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da Vale, brasileiro;

14- José Carlos Martins, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da Vale, brasileiro;

15- Paulo Roberto Bandeira, representante da Vale na Governança da Samarco, brasileiro;

16- Luciano Torres Sequeira, representante da Vale na Governança da Samarco, brasileiro;

17- Maria Inês Gardonyi Carvalheiro, representante da Vale na Governança da Samarco, brasileira;

18- James John Wilson, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, sul-africano;

19- Antonino Ottaviano, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, australiano;

20- Margaret MC Mahon Beck, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, estadunidense;

21- Jeffery Mark Zweig, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, francês;

22- Marcus Philip Randolph, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, estadunidense;

23- Sérgio Consoli Fernandes, integrante do Conselho de Administração da Samarco por indicação da BHP Billiton, brasileiro;

24- Guilherme Campos Ferreira, representante da BHP Billiton na Governança da Samarco, brasileiro;

25- André Ferreira Gavinho Cardoso, representante da BHP Billiton na Governança da Samarco, brasileiro;

26- Samuel Santana Paes Loures, engenheiro sênior da VOGBR, brasileiro.

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