Brasil

MP tem problemas para avançar com condenações na Lava Jato

Reveses recentes para os promotores da operação sugerem que o Ministério Público terá que lutar muito para conseguir as condenações que está buscando


	Operação Lava Jato: decisão do STF por prisão domiciliar reduz chances de promotores convencerem executivos a aceitar acordos de delação que poderiam gerar acusações
 (Divulgação / Polícia Federal)

Operação Lava Jato: decisão do STF por prisão domiciliar reduz chances de promotores convencerem executivos a aceitar acordos de delação que poderiam gerar acusações (Divulgação / Polícia Federal)

DR

Da Redação

Publicado em 4 de maio de 2015 às 22h05.

São Paulo -  Reveses recentes para os promotores da Operação Lava Jato, que investiga um grande esquema de corrupção envolvendo a Petrobras, grandes empreiteiras e políticos, sugerem que o Ministério Público terá que lutar muito para conseguir as condenações que está buscando.  

A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na semana passada de libertar nove executivos de construtoras suspeitos de pagar subornos no esquema, colocando-os em prisão domiciliar, reduz as chances de os promotores convencê-los a aceitar acordos de delação premiada que poderiam resultar em outras acusações.

A decisão, assim como a determinação do STF de adiar alguns novos depoimentos, sugere que o “contra-ataque” da defesa, frequentemente baseado em questões processuais, está começando a funcionar. 

Mesmo assim, especialistas legais esperam mais condenações nesse caso, no qual ex-executivos da Petrobras e empresas fornecedoras são acusados de superfaturar contratos de serviços e canalizar os recursos excedentes para suas próprias contas bancárias e para partidos políticos.  Promotores dizem que registros bancários e depoimentos mostram que pelo menos 2,1 bilhões de reais foram desviados.

A investigação já levou a 97 indiciamentos, inclusive de quatro ex-executivos da Petrobras, de executivos de construtoras e do ex-tesoureiro do PT, João Vaccari Neto. 

Dezenas de políticos também foram implicados em uma investigação separada.  As primeiras sentenças ocorreram em dia 22 de abril, quando a Justiça Federal do Paraná condenou 8 pessoas, incluindo o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa e o doleiro Alberto Yousseff, por crimes como lavagem de dinheiro e participação em organização criminosa.

Mas as decisões recentes do STF sugerem que os promotores podem ter dificuldades para alcançar a meta declarada de apresentar mais acusações e enviar diversos políticos e executivos para a cadeia, a fim de mudar o jeito como a corrupção é tratada e punida no Brasil. 

"Vai ser difícil de chegar a essas condenações", disse Luiz Flávio Gomes, advogado criminal e diretor do Instituto Avante, uma organização de combate ao crime baseada em São Paulo. Ele citou como exemplos o “precário sistema judiciário” do Brasil e a recente liberação de alguns acusados.  

A fim de libertar os nove executivos, o STF rejeitou o argumento do juiz federal Sérgio Moro de que os suspeitos poderiam cometer mais crimes caso fossem soltos.  Moro, que está orientando a promotoria, ainda não comentou publicamente sobre a decisão.

Mas a manutenção dos executivos na cadeia era vista como chave para pressioná-los a aceitar a delação premiada e gerar novos indiciamentos. 

POPULARIDADE

Desde que o escândalo veio à tona, no ano passado, a investigação tem desfrutado de um amplo apoio entre os brasileiros que acreditam que a corrupção endêmica impede o país de alcançar o seu potencial. Moro, de 42 anos, e um grupo de nove promotores sediados em Curitiba, muitas vezes foram tratados como celebridades.

E talvez tanta publicidade tenha inflado as expectativas. 

“Por causa do tamanho da investigação e da grande atenção da imprensa… você acaba praticamente presumindo que (os réus) são culpados”, disse Tatiana Farina, uma economista da Universidade de São Paulo.

Moro e os promotores se recusaram a dar entrevista. Eles anteriormente defenderam suas táticas, incluindo o uso da chamada delação premiada, permitida pela legislação brasileira e necessária para avançar um caso desse tamanho. 

O promotor Deltan Dallagnol chegou a falar da oportunidade de gerar uma “transformação social” ao mostrar que a corrupção não será tolerada. 

Um grande obstáculo, no entanto, é o próprio sistema judiciário brasileiro.  Os tribunais brasileiros possuem geralmente jurisdições incertas e que se sobrepõem, tornando os casos passíveis de pequenos erros processuais.  

Advogados de defesa argumentam que os principais elementos do caso não devem ser julgados em Curitiba, na jurisdição de Moro, mas sim no Rio de Janeiro, onde a Petrobras tem sede. 

Leonardo Sica, presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp), disse que esse argumento pode fazer com que algumas das decisões de Moro sejam descartadas nos próximos meses.

Advogados de defesa também prometem continuar recorrendo contra as “prisões preventivas” de suspeitos antes de serem condenados ou até mesmo formalmente acusados. Moro tem decretado a prisão preventiva de suspeitos sob a justificativa de possibilidade de fuga e potencial ameaça à ordem pública.

André Azevedo, membro da equipe de advogados que representa o lobista Fernando Soares, acusado de repassar subornos a políticos, disse que a prática da “prisão preventiva” viola a Convenção Americana de Direitos Humanos, da qual o Brasil é signatário. 

"Temos uma lista de operações que foram anuladas no Brasil por esse tipo de excesso", disse à Reuters.

Ele considerou a decisão do STF de soltar alguns executivos como um “golpe duro” contra Moro.  As decisões do STF também sugerem que a última instância da Justiça brasileira está relutante em dar muita liberdade a Moro.

Isso tem importância porque políticos eleitos gozam de foro privilegiado, o que significa que 34 políticos, incluindo os presidentes do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), e da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que foram citados como possíveis suspeitos devem ser julgados pelo STF. 

Para conseguir as condenações, os promotores terão que provar que o dinheiro foi originalmente roubado da Petrobras, já que empresas podem legalmente fazer doações eleitorais no Brasil e as construtoras de fato fizeram os trabalhos contratados pela Petrobras, embora a um custo elevado. 

"Não é tão transparente assim que é propina", disse Alberto Toron, advogado de defesa que conseguiu a ordem de soltura dos executivos e representa o chefe da empresa de construção UTC, que é acusado de corrupção e lavagem de dinheiro.

O PT diz que as doações foram legais e devidamente contabilizadas nas contas apresentadas à justiça eleitoral.

Janaína Paschoal, advogada e professora da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, disse que estar preocupada que, assim como no caso do chamado Mensalão, os executivos podem ficar um bom tempo na prisão, enquanto a maioria dos políticos ficarão presos por menos tempo.

"Seria terrível para a sociedade", disse ela. "Eu, ao contrário de muitos, não vejo os executivos como os maiores vilões neste escândalo."

Acompanhe tudo sobre:CorrupçãoCrimecrime-no-brasilEscândalosFraudesMinistério PúblicoOperação Lava Jato

Mais de Brasil

Novas regras do BPC: como será a revisão do benefício que pode bloquear cadastros desatualizados

PGR denuncia Nikolas Ferreira por injúria contra Lula

Após ameaça de ala pró-Nunes, Federação do PSDB confirma Datena como candidato em SP

Lula anuncia obras de prevenção a desastres, esgoto, água e mobilidade com recurso de R$ 41,7 do PAC

Mais na Exame