Lula: ex-presidente e seu filho foram denunciados pelo MPF na Operação Zelotes (Fernando Donasci / Reuters/Reuters)
Bárbara Ferreira Santos
Publicado em 9 de dezembro de 2016 às 17h05.
Última atualização em 9 de dezembro de 2016 às 18h31.
São Paulo -- O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e seu filho, Luiz Cláudio Lula da Silva, foram denunciados nesta sexta-feira (9) pelo Ministério Público Federal de Brasília pelos crimes de tráfico de influência, lavagem de dinheiro e organização criminosa no âmbito da Operação Zelotes da Polícia Federal. Também foram denunciados o casal Mauro Marcondes e Cristina Mautoni.
Segundo o MPF, os quatro teriam tido envolvimento em negociações irregulares que levaram à compra de 36 caças do modelo Gripen pelo governo brasileiro e à prorrogação de incentivos fiscais destinados a montadoras de veículos por meio da uma medida provisória.
Os procuradores afirmaram ainda que os crimes teriam sido praticados entre 2013 e 2015 quando Lula, na condição de ex-presidente, teria "integrado um esquema que vendia a promessa de que ele poderia interferir junto ao governo para beneficiar as empresas MMC, grupo Caoa e SAAB, clientes da empresa Marcondes e Mautoni Empreendimentos e Diplomacia LTDA (M&M)". Em troca, Mauro e Cristina, donos da M&M, teriam repassado a Luiz Cláudio pouco mais de R$ 2,5 milhões.
Na denúncia de 154 páginas, os procuradores Hebert Mesquita, Frederico Paiva e Anselmo Lopes afirmaram que teria existido uma “uma relação triangular” entre os denunciados, que seria formada pelos clientes da M&M, pelos intermediários (Mauro, Cristina e Lula) e pelo agente público que poderia tomar as decisões que beneficiariam os primeiros - segundo a leitura do MPF, poderia ser a ex-presidente Dilma Rousseff (PT). No entanto, as investigações não encontraram indícios de que a ex-presidente tivesse conhecimento do suposto esquema criminoso.
A denúncia foi feita, segundo o MPF, foi feita com base em documentos apreendidos por ordem judicial tanto no âmbito da Operação Zelotes quanto da Lava Jato, além de "informações prestadas em depoimentos, como o do próprio ex-presidente Lula e de um representante da SAAB no Brasil, Bengt Janér".
O MPF já havia instaurado um Procedimento Investigatório Criminal (PIC) na Divisão de Combate à Corrupção para apurar a compra dos caças, investigação que também serviu de base para a ação desta sexta-feira.
O processo de compra dos caças levou oito anos. O edital para a compra, considerada a maior aquisição militar da América Latina, foi lançado em 2006. Mas apenas em 2014 foi firmado contrato com a empresa SAAB para fornecimento das aeronaves. Os concorrentes da empresa foram o modelo francês Rafaele (teria sido anunciado como vencedor por Lula), o americano SuperHornet (seria o preferido de Dilma entre 2011 e 2012). Segundo declarações de Janér ao MPF, a empresa teria chegado a acreditar que seria preterida pelos americanos.
As investigações realizadas por integrantes da Força Tarefa da Operação Zelotes revelaram que, ao todo, a M&M teria recebido da SAAB 1,84 milhão de euros, sendo 744 mil euros entre 2011 e 2015.
Segundo os investigadores, Mauro e Cristina teriam convencido os suecos da SAAB de que possuíam proximidade com o ex-presidente, influência que poderia assegurar uma vitória na disputa concorrencial.
O MPF afirma que carta teriam sido endereçadas a Lula em duas ocasiões. A primeira delas teria sido feita em setembro de 2012, com um texto que seria "uma espécie de defesa dos caças produzidos pela empresa sueca".
Os promotores afirmaram ainda que teria havido " intensa troca de e-mails entre funcionários da M&M e do Instituto Lula, com o objetivo de viabilizar um encontro entre Lula e o líder do Partido Sindical Democrata e futuro primeiro-ministro da Suécia Sueco, Stefan Lofven".
Os procuradores apontam que Marcondes e Cristina teriam agido de forma irregular para garantir a aprovação da MP 627.
Segundo o MPF, em um dos artigos da MP, incluídos pelo relator, o então deputado federal Eduardo Cunha (PMDB) - atualmente preso em Curitiba -, garantiu a prorrogação de incentivos fiscais às montadoras MMC e Caoa até 2020, contrariando a posição técnica do Ministério da Fazenda.
O MPF sustenta ainda que o casal teria usado nesse episódio o mesmo procedimento que teria sido adotado na negociação dos caças de promessa de influência política para convencer os clientes a firmarem contratos milionários como a M&M. Durante o processo de tramitação da MP 627, MMC e Caoa teriam enviado R$ 8,4 milhões, cada uma, à empresa de Mauro Marcondes.
O casal foi denunciado pelo MPF pela práticas de crime durante a tramitação de outra MP, a 471. Nesse caso, eles foram condenados por associação criminosa, corrupção ativa e lavagem de dinheiro pela Justiça.
O contrato entre o governo brasileiro e a empresa SAAB, no valor de U$5,4 bilhões, foi assinado em outubro de 2014.
Já a Medida Provisória 627 foi convertida na Lei 12.973, sancionada em maio do mesmo ano.
Segundo o MPF, documentos revelaram que, nesse período, teria havido uma intensa movimentação entre os envolvidos na denúncia e o início dos supostos repasses financeiros da M&M às empresas de Luiz Cláudio, em junho de 2014.
Os promotores alegam que há registros, por exemplo, de que o filho do ex-presidente teria participado de reuniões em quatro ocasiões na sede da M&M e de que Lula, o filho e Mauro Marcondes teriam se encontrado, também, quatro vezes no Instituto Lula. Os encontros, avaliam os procuradores, teriam servido para que fosse acertada a viabilização do pagamento das vantagens indevidas.
Enquadramento dos crimes, segundo o MPF/DF:
Mauro Marcondes – Tráfico de influência ( três vezes), Lavagem de dinheiro (nove vezes), Organização criminosa e evasão de divisas (uma vez)
Cristina Mautoni - Tráfico de influência ( três vezes), Lavagem de dinheiro ( nove vezes), Organização criminosa e evasão de divisas (três vezes)
Luiz Inácio Lula da Silva - Tráfico de influência ( três vezes), Lavagem de dinheiro ( nove vezes), Organização criminosa
Luis Cláudio Lula da Silva – Lavagem de dinheiro ( nove vezes) e organização Criminosa
Casos em que ele é réu na Justiça:
Contrato da empresa de sobrinho e a Odebrecht em Angola
Em 13 de outubro, o juiz Vallisney de Souza Oliveira, da 10ª Vara Federal de Brasília, abriu ação penal contra Lula por participação em organização criminosa, corrupção passiva, tráfico de influência e lavagem de dinheiro.
De acordo com as investigações, o petista teria recebido dinheiro da construtora para defender interesses da Odebrecht em outros países.
Essa denúncia se divide em duas etapas: a primeira, entre 2008 e 2010, quando ele ainda ocupava a presidência da República e, na condição de agente público, teria praticado corrupção passiva. E a segunda, entre 2011 e 2015, já como ex-presidente, momento em que teria cometido tráfico de influência em benefício dos envolvidos.
Além disso, Lula foi acusado pelos crimes de organização criminosa e lavagem de dinheiro. Sobre esse último, foi denunciado 44 vezes. O crime teria sido viabilizado por meio de repasses de valores justificados pela subcontratação da empresa Exergia Brasil, criada em 2009 por Taiguara Rodrigues dos Santos, sobrinho da primeira mulher do ex-presidente e também denunciado na ação penal.
Triplex do Guarujá
Um dos outros casos em que Lula é réu é o do triplex do Guarujá, em que o ex-presidente responde na 13ª Vara Federal de Curitiba por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
Segundo o MPF, Lula teria recebido propina da ordem de 3,7 milhões de reais em contratos da OAS com duas refinarias da Petrobras. Parte desse valor, segundo os procuradores, está relacionada ao caso do tríplex: R$ 1,1 milhão destinados à compra do apartamento, R$ 926 mil para a reforma e o restante para compra de móveis, eletrodomésticos, transporte e armazenamento de bens.
Réu por obstrução da Lava Jato:
Lula é acusado de participar do esquema para comprar por R$ 250 mil o silêncio do ex-diretor da área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, um dos delatores do esquema de corrupção na estatal nas investigações da Lava Jato. Além dele, o senador cassado Delcídio do Amaral e outras cinco pessoas teriam atuado na manobra
Casos em que ele é investigado na Lava Jato:
1. Sítio em Atibaia:
Em outro processo, que corre em paralelo, Lula responde por suspeita de posse de um sítio em Atibaia, no interior de São Paulo. Laudo da Polícia Federal sugere que o ex-presidente e sua esposa, Marisa Letícia, teriam reformado a cozinha do sítio por meio da empreiteira OAS como resultado de suposto pagamento de vantagens indevidas.
2. Supostos repasses à LILS:
Inquérito da Lava Jato busca destrinchar os ganhos da LILS Palestras e o Instituto Lula, que, entre 2011 e 2014, teriam recebido R$ 30 milhões repassados, em boa parte, por empreiteiras com participação já comprovada no âmbito da operação.
3. Inquérito apura obstrução da Justiça por Dilma e Lula:
Em agosto, o ministro do Supremo Tribunal Federal Teori Zavascki determinou a abertura de inquérito para investigar Dilma, Lula e os ex-ministros Aloizio Mercadante e José Eduardo Cardozo por crime de obstrução da Justiça.O pedido de abertura do inquérito, feito pela Procuradoria Geral da República, cita como fatos suspeitos a nomeação de Lula como ministro da Casa Civil e a nomeação do ministro Marcelo Navarro para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) por Dilma.