Exame Logo

Kátia Abreu: de líder do agronegócio a heroína da esquerda

A surpreendente amizade entre esta psicóloga e Dilma levou-a a acusar o próprio partido, PMDB, de conspirar para chegar ao poder

Dilma e Katia: a surpreendente amizade entre esta psicóloga e Dilma levou-a a acusar o próprio partido, PMDB, de conspirar para chegar ao poder (Fabio Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil)
DR

Da Redação

Publicado em 14 de setembro de 2016 às 15h20.

Senadora de centro-direita e principal dirigente do agronegócio no Brasil, Kátia Abreu era tudo que um governo conservador poderia sonhar, mas, ao defender Dilma Rousseff durante o processo de impeachment, tornou-se a heroína mais improvável da esquerda.

A surpreendente amizade entre esta psicóloga de 54 anos, que ficou viúva aos 25 e, desde então, gerencia as fazendas de sua família, e Dilma, ex-guerrilheira marxista, levou-a a acusar o próprio partido, PMDB, de conspirar para chegar ao poder.

Congelou também sua relação de longa data com o novo presidente, Michel Temer, que era o vice-presidente, e não voltou a falar com ele desde a destituição de Dilma.

A empresária, que presidiu de 2008 a 2011 a poderosa Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e foi ministra da Agricultura desde 2011 até a suspensão de Dilma Rousseff em maio, falou com a AFP em seu escritório, em Brasília, onde convivem imagens religiosas, bichos de pelúcia e uma matrioska, a famosa boneca russa, com a imagem da ex-presidente.

AFP: Como é fazer política depois do impeachment?

Kátia Abreu: Não sou uma mulher que se desanima facilmente. Foi um processo equivocado e faria tudo de novo em defesa dessa causa, porque é uma questão de princípios e a legalidade tem que estar em primeiro lugar, independentemente do partido.

AFP: Por que fez uma defesa tão aguerrida, além de inesperada?

KA: Minha defesa da presidente Dilma não tem a ver com partidos, nem com a amizade. Tem a ver com os princípios. Acreditei e acredito que ela é inocente e que está sendo injustiçada, brutalmente arrancada da presidência.

AFP: A atitude de Temer a surpreendeu?

KA: Muito. Eu o conheço há muitos anos. Até certo momento, esteve contido, mas depois apoiou o impeachment. Agora vivemos um vice-presidencialismo (sorri). Ele queria dividir a cadeira com ela? Fomos (seu partido, PMDB) eleitos com ela, tivemos a vice-presidência por cinco anos e eu não apoiei essa chapa. Mas na reeleição fui uma das que mais lutou para que o PMDB mantivesse a aliança (com o PT, partido de Dilma), porque Temer queria mantê-la.

AFP: O Congresso manda no Brasil?

KA: É o maior poder e isso é irreversível. Não estou dizendo se concordo ou discordo. Digo que é irreversível. Estamos praticamente vivendo uma sombra de parlamentarismo. O impeachment de Dilma foi isso, a tiraram como se o sistema brasileiro fosse parlamentarista.

AFP: O que essa crise deixará?

KA: As lições não chegarão agora e sim mais adiante. As pessoas vão entender que o que aconteceu foi equivocado. Se estamos insatisfeitos com o sistema político presidencialista e preferimos o parlamentarismo, temos que mudar a Constituição e decidir por uma nova forma de governo, porque o que aconteceu foi uma brutalidade com o sistema presidencialista.

Não compensa ferir a lei, a norma, a Constituição, para se livrar de um político. São necessárias novas eleições para corrigir os erros, e a impopularidade só é curada nas urnas. O impeachment se tornou sinônimo de alcançar as coisas mais rápido.

"Falsidade e traição"

AFP: Por que Dilma foi destituída?

KA: Foi uma junção de insatisfação popular com a vingança de Eduardo Cunha (deputado também destituído, considerado arquiteto do julgamento político contra Dilma) e a crise econômica. Isso foi animando os que eram a favor do impeachment e também os conspiradores. Porque houve dois tipos de políticos que votaram essa destituição: uma parte que votou seguindo a vontade das ruas, de seu estado, de seu partido, e outra que o fez para chegar ao poder.

Não se importaram se o Brasil foi destruído e ficou reduzido a escombros, e se esses escombros estavam em suas mãos. Essa foi a verdadeira conspiração: a falsidade e a traição para chegar ao poder.

AFP: Pensa na presidência para 2018?

KA: É hora de pensar nos brasileiros, porque, se não fizermos isso, não ficará pedra sobre pedra em 2018. Os que se apressam agora não terão a menor chance, porque desrespeitarão a população. Deve-se melhorar a economia e tentar fazer as reformas necessárias. Colocar ordem na casa e depois discutir 2018.

AFP: Como foram os últimos dias de Dilma?

KA: Não teve nenhum sentimento que se assemelhasse ao desespero, angústia, tristeza exagerada, pranto. No dia do impeachment, fui visitá-la com meu filho e marido. Meu filho - que tem 30 anos - ficou muito impressionado. Ela lhe disse: "Fui treinada para isso, para ser resistente".

AFP: Você vai estranhar a ausência de Dilma em Brasília?

KA: Já estou estranhando.

Veja também

Senadora de centro-direita e principal dirigente do agronegócio no Brasil, Kátia Abreu era tudo que um governo conservador poderia sonhar, mas, ao defender Dilma Rousseff durante o processo de impeachment, tornou-se a heroína mais improvável da esquerda.

A surpreendente amizade entre esta psicóloga de 54 anos, que ficou viúva aos 25 e, desde então, gerencia as fazendas de sua família, e Dilma, ex-guerrilheira marxista, levou-a a acusar o próprio partido, PMDB, de conspirar para chegar ao poder.

Congelou também sua relação de longa data com o novo presidente, Michel Temer, que era o vice-presidente, e não voltou a falar com ele desde a destituição de Dilma.

A empresária, que presidiu de 2008 a 2011 a poderosa Confederação Nacional da Agricultura (CNA) e foi ministra da Agricultura desde 2011 até a suspensão de Dilma Rousseff em maio, falou com a AFP em seu escritório, em Brasília, onde convivem imagens religiosas, bichos de pelúcia e uma matrioska, a famosa boneca russa, com a imagem da ex-presidente.

AFP: Como é fazer política depois do impeachment?

Kátia Abreu: Não sou uma mulher que se desanima facilmente. Foi um processo equivocado e faria tudo de novo em defesa dessa causa, porque é uma questão de princípios e a legalidade tem que estar em primeiro lugar, independentemente do partido.

AFP: Por que fez uma defesa tão aguerrida, além de inesperada?

KA: Minha defesa da presidente Dilma não tem a ver com partidos, nem com a amizade. Tem a ver com os princípios. Acreditei e acredito que ela é inocente e que está sendo injustiçada, brutalmente arrancada da presidência.

AFP: A atitude de Temer a surpreendeu?

KA: Muito. Eu o conheço há muitos anos. Até certo momento, esteve contido, mas depois apoiou o impeachment. Agora vivemos um vice-presidencialismo (sorri). Ele queria dividir a cadeira com ela? Fomos (seu partido, PMDB) eleitos com ela, tivemos a vice-presidência por cinco anos e eu não apoiei essa chapa. Mas na reeleição fui uma das que mais lutou para que o PMDB mantivesse a aliança (com o PT, partido de Dilma), porque Temer queria mantê-la.

AFP: O Congresso manda no Brasil?

KA: É o maior poder e isso é irreversível. Não estou dizendo se concordo ou discordo. Digo que é irreversível. Estamos praticamente vivendo uma sombra de parlamentarismo. O impeachment de Dilma foi isso, a tiraram como se o sistema brasileiro fosse parlamentarista.

AFP: O que essa crise deixará?

KA: As lições não chegarão agora e sim mais adiante. As pessoas vão entender que o que aconteceu foi equivocado. Se estamos insatisfeitos com o sistema político presidencialista e preferimos o parlamentarismo, temos que mudar a Constituição e decidir por uma nova forma de governo, porque o que aconteceu foi uma brutalidade com o sistema presidencialista.

Não compensa ferir a lei, a norma, a Constituição, para se livrar de um político. São necessárias novas eleições para corrigir os erros, e a impopularidade só é curada nas urnas. O impeachment se tornou sinônimo de alcançar as coisas mais rápido.

"Falsidade e traição"

AFP: Por que Dilma foi destituída?

KA: Foi uma junção de insatisfação popular com a vingança de Eduardo Cunha (deputado também destituído, considerado arquiteto do julgamento político contra Dilma) e a crise econômica. Isso foi animando os que eram a favor do impeachment e também os conspiradores. Porque houve dois tipos de políticos que votaram essa destituição: uma parte que votou seguindo a vontade das ruas, de seu estado, de seu partido, e outra que o fez para chegar ao poder.

Não se importaram se o Brasil foi destruído e ficou reduzido a escombros, e se esses escombros estavam em suas mãos. Essa foi a verdadeira conspiração: a falsidade e a traição para chegar ao poder.

AFP: Pensa na presidência para 2018?

KA: É hora de pensar nos brasileiros, porque, se não fizermos isso, não ficará pedra sobre pedra em 2018. Os que se apressam agora não terão a menor chance, porque desrespeitarão a população. Deve-se melhorar a economia e tentar fazer as reformas necessárias. Colocar ordem na casa e depois discutir 2018.

AFP: Como foram os últimos dias de Dilma?

KA: Não teve nenhum sentimento que se assemelhasse ao desespero, angústia, tristeza exagerada, pranto. No dia do impeachment, fui visitá-la com meu filho e marido. Meu filho - que tem 30 anos - ficou muito impressionado. Ela lhe disse: "Fui treinada para isso, para ser resistente".

AFP: Você vai estranhar a ausência de Dilma em Brasília?

KA: Já estou estranhando.

Acompanhe tudo sobre:Dilma RousseffImpeachmentPersonalidadesPolítica no BrasilPolíticosPolíticos brasileirosPT – Partido dos Trabalhadores

Mais lidas

exame no whatsapp

Receba as noticias da Exame no seu WhatsApp

Inscreva-se

Mais de Brasil

Mais na Exame