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João de Deus pode superar caso Abdelmassih, afirma MP

Segundo o Ministério Público de Goiás, a dimensão dos casos pode ser muito maior que do ex-médico condenado a 181 anos por estupros

João de Deus: mais de 200 relatos foram feitos em apenas dois dias da criação de um e-mail para denúncias (Cesar Itiberê/Fotos Públicas)

João de Deus: mais de 200 relatos foram feitos em apenas dois dias da criação de um e-mail para denúncias (Cesar Itiberê/Fotos Públicas)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 12 de dezembro de 2018 às 10h13.

Última atualização em 12 de dezembro de 2018 às 10h15.

Goiânia e São Paulo - É recomendado que os frequentadores utilizem roupas brancas ao entrar na Casa Dom Inácio de Loyola, em Abadiânia (GO). Há dez anos, esse motivo foi utilizado pelo médium João de Deus para tirar a calça escura que uma menina de 13 anos utilizava no local. Em uma sala privada, ele despiu a calça da menina e se aproximou, passando a mão pelo corpo e levando a mão da garota ao seu órgão genital. O relato se une a outros 205 levados até agora ao Ministério Público de Goiás. Os contatos foram feitos por residentes de 10 Estados do País, além de uma mulher que reside nos Estados Unidos e outra, no Canadá.

Coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público (MP) de Goiás, Luciano Miranda Meireles, avalia que as denúncias de abuso sexual envolvendo o líder espiritual João Teixeira de Faria tem potencial para alcançar uma dimensão maior do que o caso de Roger Abdelmassih, ex-médico de reprodução assistida que foi condenado a 181 anos de prisão por estupro de pacientes. "Pela movimentação que estamos assistindo, o número de mulheres que se apresentam como vítimas deverá ser maior. Há relatos de abusos ocorridos há 20 anos."

As mais de duas centenas de relatos foram feitas em apenas dois dias de funcionamento de um e-mail (denuncias@mpgo.mp.br) do MP, criado especificamente para receber informações, após as primeiras denúncias levadas ao ar pelo programa Conversa com Bial, da TV Globo. "Orientamos que todas, independentemente da data em que ocorreu o fato, procurem o Ministério Público de seus Estados para formalizar a denúncia", disse Meireles.

A coleta de informações até o momento sugere três crimes: estupro, estupro de vulnerável e violação sexual mediante fraude. "Nos relatos que recebemos, todas as mulheres se mostram muito abaladas, independentemente da data do ocorrido. Nenhuma fala em dinheiro ou qualquer outro benefício. A maior parte diz querer apenas justiça", disse o promotor.

É o que diz a jovem de 24 anos, que sofreu o assédio na adolescência e falou sob anonimato à reportagem. "Depois (da ação), ele falou: 'Tudo bem, agora você está limpa'. Fiquei chocada, sem reação. Eu não tinha nem dado um beijinho ainda, era muito nova. Fiquei mal comigo mesma."

A garota foi levada ao espaço pela avó para tratar um quadro de depressão, que se agravou após o abuso. Ela chegou a tentar o suicídio e intensificou o tratamento psiquiátrico e psicológico, que mantém até hoje.

Na época, não contou nada para a avó. Ela sempre teve vontade de denunciar, mas tinha medo. Só no domingo, ela procurou uma delegacia e, depois, com o apoio de uma ONG, fez a denúncia no MP do Paraná.

A reportagem levantou alguns dos registros pelo País. Em Minas, houve cinco denúncias; no Rio Grande do Sul, quatro oficialmente, além de outras nove feitas informalmente. Já no Paraná foram três. Em São Paulo, cinco mulheres prestaram depoimento nesta terça-feira, mas há mais oitivas marcadas.

Segundo a promotora Silvia Chakian de Toledo Santos, todas as vítimas falam em abusos sexuais. Segundo ela, os relatos até agora datam de 2017 e o modus operandi é "muito parecido", sempre envolvendo a sala de atendimento privado.

Abuso constante

Uma das vítimas, de Goiânia, que também não quis se identificar, tinha 19 anos e era modelo na época em que se consultou com o médium. Seus avós faziam parte da linha de frente dos trabalhos espirituais. O médium a deixava por último na fila de espera para atendimento. "A hora que eu entrava, tirava minha blusa e muitas vezes meu sutiã e pegava nos meus seios. Eu chorava, mas ele nunca teve piedade. Implorei para ele parar várias vezes. Um dia eu falei que não ia mais e ele disse que sabia onde meus avós moravam, e mataria cada um deles. Esse medo que me fez voltar", relata.

Ele diz que os abusos são conhecidos em Abadiânia. "As pessoas que trabalham há muitos anos lá sabem que ele faz isso."

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