Greve dos caminhoneiros adia entusiasmo do brasileiro com a Copa
Ao contrário do que aconteceu na mesma época nas últimas edições do maior torneio de futebol do planeta, ainda não há clima de Mundial
Estadão Conteúdo
Publicado em 29 de maio de 2018 às 09h21.
São Paulo - A greve dos caminhoneiros adiou a euforia dos torcedores com a Copa do Mundo. A torcida está mais preocupada com a crise de abastecimento e a consequente instabilidade política e econômica que se seguiu do que com o esquema tático do técnico Tite. Ou com a recuperação do Neymar. Ao contrário do que aconteceu na mesma época nas últimas edições do maior torneio de futebol do planeta, ainda não há clima de Mundial. E há quem duvide que a euforia vai se instalar.
"A cena política nacional tem atraído atualmente mais atenção da opinião pública do que os preparativos da seleção brasileira para o Mundial", opinou o professor José Carlos Marques, da Universidade Estadual Paulista (Unesp).
A presença da Copa do Mundo em segundo - em terceiro e até quatro lugares - na lista de prioridades do torcedor comum ficou evidente na visita que o jornal O Estado de S.Paulo fez nesta segunda-feira às ruas do centro da cidade de São Paulo, especialmente à rua 25 março, maior centro de comércio popular do país.
O endereço obrigatório para quem quer comprar todo tipo de bugigangas de Copa do Mundo registrou um movimento 50% menor do que nos dias normais, de acordo com os lojistas. A ladeira Porto Geral, sempre entupida de carros, estava vazia. Bandeiras, óculos, colares, chapéus, vuvuzelas - sim, elas estão prontas para voltar -, apitos e camisetas enchem as prateleiras. E, até segunda ordem, vão ficar lá.
De acordo com Ondamar Ferreira, gerente da maior loja da região, a greve foi um balde de água fria, e o clima de Copa só vai começar quando a paralisação acabar. "Na semana passada, as vendas estavam indo bem. Mas a greve esfriou tudo", disse o vendedor. "Todos nós estamos preocupados. Nossa esperança é que a seleção vá longe", afirmou o empresário Pierre Sfeir.
Os poucos torcedores que pararam nas vitrines para analisaram os produtos reclamaram dos preços e disseram que vão esperar um pouco mais. "Acho que a gente ainda não está com a cabeça na Copa. Está cedo, né? Tem outras coisas na frente", disse a cabeleireira Ana Pereira Lima, que estava namorando um colar, mas não o levou.
A paralisação dos caminhoneiros é o problema mais urgente, principalmente nas prioridades de consumo, mas não é o único. Victor Melo, coordenador do Laboratório de História do Esporte e do Lazer da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), afirma que o entusiasmo dos torcedores com a Copa vem caindo nos últimos anos.
"No passado, o envolvimento do brasileiro com o evento era maior. Talvez porque grande parte dos jogadores não jogue mais no Brasil, reduzindo-se a identificação. Ou talvez possa ser algum desdobramento da última Copa, realizada no Brasil, quando tivemos algumas decepções, entre as quais um resultado inesquecível (do ponto de vista negativo) em um jogo contra a Alemanha e os inúmeros problemas que ocorreram antes, durante e depois do evento, o fracasso da promessa de que esse deixaria um legado para o país", disse o estudioso.
Atletas
Os jogadores perceberam que algo está diferente. "Esses momentos de dificuldade, com certeza, chegam pra gente. Também nos afeta e afeta nossas famílias", afirmou o goleiro Alisson antes do embarque para a Inglaterra.
Na última sexta-feira, o lateral-esquerdo Filipe Luís também havia declarado que a greve dos caminhoneiros preocupava o grupo de jogadores, apesar de a delegação não ter enfrentado nenhum tipo de dificuldade ao longo da semana, quando se concentrou na Granja Comary, em Teresópolis (RJ).