Presidente Jair Bolsonaro. (Marcos Corrêa/PR/Divulgação)
Reuters
Publicado em 1 de março de 2021 às 13h03.
Última atualização em 1 de março de 2021 às 16h47.
Em meio ao pior momento da pandemia de coronavírus no país e ao quase colapso do sistema de saúde em diversos Estados, o presidente Jair Bolsonaro decidiu abrir guerra mais uma vez com os governadores pela resposta à crise da Covid-19, e foi rebatido com firmeza por chefes dos Executivos estaduais.
Dezesseis governadores rebateram os ataques do presidente sobre as medidas de enfrentamento à pandemia em uma carta na noite de domingo, em que acusaram o governo federal de produzir informações distorcidas e gerar interpretações equivocadas.
"Os governadores dos Estados abaixo assinados manifestam preocupação em face da utilização, pelo governo federal, de instrumentos de comunicação oficial, custeados por dinheiro público, a fim de produzir informação distorcida, gerar interpretações equivocadas e atacar governos locais", disseram no documento.
"Em meio a uma pandemia de proporção talvez inédita na história, agravada por uma contundente crise econômica e social, o governo federal parece priorizar a criação de confrontos, a construção de imagens maniqueístas e o enfraquecimento da cooperação federativa essencial aos interesses da população".
Durante o fim de semana, Bolsonaro, seus filhos e ministros do governo iniciaram uma campanha nas redes sociais acusando veladamente os governadores de não terem usado corretamente os recursos repassados pelo governo federal para o enfrentamento à pandemia.
Postagens preparadas pela Secretaria de Comunicação da Presidência foram compartilhadas pelo presidente, seus filhos Carlos e Eduardo, e pelo ministro das Comunicações, Fábio Faria, apontando as transferências a cada Estado feitas pelo governo federal em 2020.
As publicações misturam recursos extras para a Covid-19 com repasses obrigatórios para saúde e outras áreas vindos da redistribuição de impostos obrigatória, além do pagamento do auxílio emergencial --que não foi pago aos Estados, mas diretamente aos beneficiários-- e a suspensão das dívidas estaduais aprovada pelo Congresso.
"Estamos há um ano com a Covid e centenas de bilhões de reais do governo federal foram para os estados, O ex-Mandetta (ex-ministro da Saúde) dizia que o isolamento era para as pessoas ficarem em casa, achatar a curva até que os Estados pudessem construir os leitos de UTIs. E aí, para onde foi o dinheiro?", escreveu Fábio Faria.
Segundo a carta dos governadores, no entanto, a postagem contabiliza "majoritariamente os valores pertencentes por obrigação constitucional aos Estados e municípios, como os relativos ao FPE, FPM, FUNDEB, SUS, royalties, tratando-os como uma concessão política" do governo federal.
"Em nenhum desses casos a distribuição tributária se deve a um favor dos ocupantes dos cargos de chefe do respectivo Poder Executivo, e sim a expresso mandamento constitucional," acrescentou a carta.
Os governadores lembraram ainda que a arrecadação de impostos em 2020 chegou a 1,479 trilhão de reais. "Se os valores totais, conforme postado hoje, somam 837,4 bilhões de reais, pergunta-se: ´Onde foram parar os outros 642 bilhões de reais que cidadãos de cada cidade e cada Estado brasileiro pagaram à União em 2020?'".
Onze governadores não participaram da elaboração da carta. Segundo o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), a reunião foi feita no grupo de WhatsApp dos governadores na noite de domingo porque havia um alto grau de indignação, mas não foi possível a todos participarem.
Além de Dino, outros desafetos de Bolsonaro assinam a carta, como o governador de São Paulo, João Doria (PSDB), mas também subscreveram o documento alguns partidários do presidente, como o governador em exercício do Rio de Janeiro, Cláudio Castro (PSC); o governador do Paraná, Ratinho Júnior (PSD); e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM).
Os governadores reagiram também em suas redes sociais.
"O presidente da República mistura, sem explicar, todos os repasses federais, até os obrigatórios pela CF (Constituição Federal), e fala que mandou 40 bilhões para o RS. Se a lógica é essa, fica a dúvida: como o RS mandou para Brasília 70 bi em impostos, cadê os nossos outros 30 bi?", escreveu o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB).
Dino disse que o presidente "insiste em agredir a verdade para tentar atingir os governadores" e chamou Bolsonaro de "irresponsável".
"A mentira federal sobre repasse de recursos ao Maranhão é tão absurda que o valor informado (36 bilhões) equivale quase ao dobro do Orçamento do Estado em 2020", escreveu Dino.
A nova ofensiva de Bolsonaro vem depois de diversos governadores tentarem reagir individualmente à nova avalanche de casos de Covid-19 e ao iminente colapso dos sistemas de saúde, sem que haja qualquer orientação clara por parte do Ministério da Saúde. Em diversos Estados foi decretado, mais uma vez, o fechamento de negócios com atendimento ao público e toques de recolher.
Bolsonaro reagiu com irritação e minimizou os efeitos da pandemia. Distribuiu vídeos de uma empresária reclamando do fechamento em Brasília e de um protesto em frente à casa do governador do DF, Ibaneis Rocha (MDB.
"Hoje, ao fecharem o comércio e novamente te obrigarem a ficar em casa, vem o desemprego em massa com consequências desastrosas para todo o Brasil", escreveu o presidente em suas redes sociais.
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