Sérgio Cabral: o ex-governador do Rio supostamente recebia o dinheiro em envelopes entregues ao seu ex-assessor, Wagner Jordão (foto/Getty Images)
Agência Brasil
Publicado em 15 de março de 2017 às 21h40.
O engenheiro Rafael Campello, que trabalha há quase 20 anos na construtora Andrade Gutierrez, disse hoje (15) que em cinco oportunidades entregou envelopes, presumivelmente contendo dinheiro, ao ex-assessor do ex-governador Sérgio Cabral, Wagner Jordão, apontado como operador financeiro de propinas relativas à Secretaria de Obras do Estado do Rio de Janeiro.
Campello afirmou que foi orientado pelo gerente da empresa, Alberto Quintaes, para passar no departamento financeiro da empreiteira, pegar os envelopes e fazer as entregas.
Para isso, ele marcava um encontro, por telefone, com Jordão.
"Ele entrava no meu carro, a gente dava umas voltas e eu entregava o envelope dentro de um jornal", contou o engenheiro, durante depoimento à 7ª Vara Federal Criminal, em audiência presidida pelo juiz Marcelo Bretas, com a presença do procurador da República Leonardo Freitas, coordenador da força tarefa da Lava Jato no Rio.
Rafael Campello disse que presumia que dentro dos envelopes havia dinheiro, mas que nunca abriu nenhum deles para comprovar.
Tinha informação sobre os valores que a empresa empregava na obra de urbanização da comunidade de Manguinhos, pelo Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), porque, como gerente que atuava na obra, fazia o controle das planilhas.
Destacou que não podia garantir se dentro dos envelopes havia as quantias definidas nos documentos da empreiteira.
O engenheiro revelou ainda que em alguns desses encontros, Jordão reclamou que as outras empresas que participavam do consórcio de Manguinhos, a EIT e a Camter, não estavam comparecendo com o pagamento da propina acertada, referente a 5% do valor da obra.
Antes de assinado o contrato, houve ainda um pagamento mensal pela empresa, por um ano, de R$ 350 mil, para o esquema de propinas.
Além disso, havia a chamada "taxa de oxigênio" específica para pagamento ao ex-secretário de Obras, Hudson Braga.
"Era uma forma diferente de pagamento da propina", informou o procurador Leonardo Freitas.
A mesada foi confirmada pelo superintendente da Andrade Gutierrez, João Marcos de Almeida Fonseca, que prestou depoimento, na tarde de hoje (15), antes de Campello.
"Mesada para que fosse aquinhoada [a empreiteira] com projetos futuros", apontou.
O superintendente que aderiu ao acordo de leniência da empreiteira, trabalha na Andrade Gutierrez desde 1979, mas atuou no Rio de Janeiro nos anos de 2007 e 2008, início do primeiro mandato de governador de Sérgio Cabral.
A gerente da joalheria Antônio Bernardo, no Shopping da Gávea, no Rio, Vera Lúcia Guerra, também prestou depoimento hoje na condição de testemunha e contou que Sérgio Cabral e o empresário Carlos Miranda, apontado como operador financeiro do esquema de propinas costumavam comprar joias na loja sem nota fiscal para receberem descontos.
Segundo ela, as compras eram parceladas com cheques pré-datados, que depois eles mesmos trocavam por dinheiro em espécie nos vencimentos.
"Davam dez cheques e todo mês iam lá trocar por dinheiro".
Cabral e Miranda, de acordo com Vera Lúcia, eram clientes antigos da loja, onde compravam joias em datas festivas.
"Aniversários, Dia das Mães, dos Namorados, Natal. Sempre com desconto e sem nota fiscal a pedido deles. Eventualmente, pagavam com cartão", revelou, acrescentando que Adriana Ancelmo, mulher de Sérgio Cabral, também comprava joias com este esquema.
A gerente disse ainda que Cabral nunca foi à loja para fazer a troca dos cheques por dinheiro.
Sempre mandava alguém e algumas vezes quem fez isso foi o motorista Pedro Ramos.
O procurador Leonardo Freitas disse que os depoimentos realizados nesta tarde, no âmbito da Operação Calicute, que identificou a atuação de uma organização criminosa para o recebimento de propinas no Rio de Janeiro, confirmam que as investigações, até agora, estão no caminho certo.
"Para nós está bastante seguro a produção da prova até o momento", falou.
Quanto a troca dos cheques na compra de joias, ele disse que ainda precisa aprofundar as investigações para garantir que se tratava de um esquema de lavagem de dinheiro.
O procurador destacou que a quantidade de fatos que surgem com as investigações, não cansa de surpreender os integrantes da Força Tarefa.
"Pelo valor, pela dimensão e pelo próprio pedido de adiantamento, como as testemunhas hoje confirmaram, antes de qualquer obra ser realizada.
Mostra uma estrutura muito intensamente voltada para esta prática criminosa. Não sei onde terá fim essa apuração, mas a gente segue apurando", apontou.