Ex-ministro José Dirceu: de ídolo político para réu de um dos maiores processos brasileiros (Marcello Casal Jr./Agência Brasil)
Da Redação
Publicado em 5 de outubro de 2012 às 10h31.
São Paulo - Hoje ele é o réu mais importante dentre os 37 envolvidos no processo do mensalão e deverá, na próxima semana, ter o futuro selado pelo Supremo Tribunal Federal (STF). As perspectivas não são boas para ele: nesta quarta-feira, Dirceu foi considerado culpado pelo crime de corrupção ativa pelo relator Joaquim Barbosa (ainda falta o voto dos demais ministros, mas tudo indica que a maioria votará com o relator).
Pode ser que José Dirceu, que já foi considerado um "primeiro-ministro" do Brasil e alimentou ambições presidenciais, seja lembrado, prioritariamente, apenas como "mensaleiro".
De 2003 a 2005, no governo do ex-presidente Luis Inácio Lula da Silva, José Dirceu foi ministro chefe da Casa Civil e era considerado o homem forte da administração federal. Muito por conta disso, Barbosa fez questão de reiterar em seu voto que o ex-ministro “foi o mandante do esquema” e que era impossível que não soubesse das negociações com Marcos Valério.
Com as denúncias de corrupção dos Correios, em 2005, Dirceu pediu demissão e voltou ao cargo de deputado no Congresso Nacional. No mesmo ano, porém, teve o mandato cassado, tornando-se inelegível até 2015 e, de quebra, levou umas bengaladas de um escritor indignado que visitava o Congresso.
Herói político
A provável condenação de José Dirceu será um golpe pesado para o PT, que sempre defendeu uma imagem heroica do ex-presidente do partido. O réu mais famoso do mensalão fez parte da luta de resistência contra a ditadura militar no Brasil.
O início da atuação política de Dirceu foi no movimento estudantil da década de 1960. Logo em uma famosa reunião da União Nacional dos Estudantes, em Ibiúna, no auge da repressão, em 1968, o então presidente da União Estadual dos Estudantes em São Paulo foi preso.
Aí começa o mito Dirceu: um jovem bonito, eloquente, cabeludo e revolucionário que foi detido pela repressão quando tentava se eleger presidente da entidade. Um ano depois, ele estava na lista dos prisioneiros a serem “trocados” pelo embaixador dos Estados Unidos que havia sido sequestrado por militantes.
Dirceu passou por um período exilado em Cuba e o mito cresceu. Surgiram boatos de que ele teria ido para Paris e sobrevivia tocando nas praças, ou de que estava em São Paulo se preparando para derrubar a ditadura. Mas a verdadeira história do réu tem contornos ainda mais fortes de ficção.
Na ilha de Fidel Castro, Dirceu recebeu treinamento militar de guerrilha, trabalhou e estudou. Anos mais tarde, voltou à Cuba com um único objetivo: fazer uma cirurgia plástica que o tornasse irreconhecível. Retornou ao Brasil com um nome diferente, casou-se e continuou sua atuação política clandestinamente (nem sua esposa sabia sua real identidade).
Com a anistia de 1979, Dirceu desfez a plástica, ajudou a fundar o Partido dos Trabalhadores e se tornou um gigante partidário.
Na campanha de Lula para a presidência em 2002, já era claro que o então presidente do partido tinha um papel enorme nas decisões, como continuaria tendo durante o governo. Dirceu se orgulhava de ser “um trator”, agindo com mão de ferro e, nos bastidores, articulando desde decisões sobre a imagem do candidato até sobre quem seria seu vice.
Com a eleição do primeiro operário presidente do Brasil, Dirceu tornou-se mais do que um ministro. Como chefe da Casa Civil, era sabido que ele tomava muitas das decisões - ainda que nos bastidores - e por isso acabou conhecido por apelidos como o “super-ministro” ou “primeiro-ministro”.
O escândalo do mensalão pôs um fim à escalada de poder de José Dirceu. Ele sempre se declarou inocente, mas sua saída da Casa Civil deixou dúvidas: o presidente Lula saberia do suposto esquema ou Dirceu foi considerado culpado pelo governo?.
No julgamento, por enquanto, José Dirceu foi declarado culpado (de corrupção ativa, ainda falta julgar a acusação de formação de quadrilha) pelo ministro relator do Supremo Tribunal Federal, Joaquim Barbosa, que afirmou: “O conjunto probatório (...) coloca o então ministro-chefe da Casa Civil em posição central, posição de organização e liderança da prática criminosa, como mandante das promessas de pagamento de vantagens indevidas”.
Ainda restam os votos dos demais ministros e, se condenado por mais cinco dos dez juízes, dependendo da pena, até mesmo voltar à prisão. Isso encerraria, pelo menos provisoriamente, a movimentada carreira de consultor de empresas que José Dirceu seguiu nos últimos anos.