Bope: Segundo PM, os policiais do Bope foram atacados por homens armados (Spencer Platt/Getty Images)
Talita Abrantes
Publicado em 28 de fevereiro de 2018 às 15h21.
Última atualização em 1 de março de 2018 às 11h19.
São Paulo – O que os acusados por envolvimento no tráfico de drogas têm em comum? Segundo pesquisa da Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro, eles geralmente são homens, não tinham antecedentes criminais, foram pegos em flagrante portando até 60 gramas de cocaína ou 100 gramas de maconha e, pasmem, boa parte deles estava desarmada na hora da apreensão.
Durante a tramitação do processo, mais coincidências saltam aos olhos: segundo o estudo, agentes de segurança tendem a ser a única testemunha nessas ações e, na maior parte dos casos, a principal prova usada pelos juízes na hora de definir a sentença.
A pesquisa foi feita com base em 2,5 mil sentenças relacionadas a 3,7 mil pessoas proferidas entre agosto de 2014 e janeiro de 2015 na capital e região metropolitana do Rio de Janeiro. Veja os principais resultados:
Antes de serem presos e acusados de crimes relacionados ao tráfico de drogas, a maior parte dos réus (77,36%) não tinha antecedentes criminais e 73,85% eram réus primários. Mais da metade deles foi preso em flagrante e apenas 6% após uma investigação policial.
30% dos réus portavam uma arma ou rádio transmissor (o que indicaria ligação com o tráfico) quando abordados pela polícia. Em 26% dos casos houve tentativa de fuga:
Condições em que se desenvolveu a ação | % |
---|---|
Droga na posse do Réu (em mochila, bolsa, roupa) | 56,01 |
Droga acondicionada de forma que demonstra intenção de venda | 52,75 |
Apreensão em ponto conhecido pela venda de drogas | 42,41 |
Réu abordado pela polícia em razão de comportamento suspeito | 31,49 |
Portava rádio transmissor e/ou arma | 30,05 |
Tentativa de fuga | 26,13 |
Encontrado dinheiro com o acusado | 25,89 |
Drogas com inscrições/ identificação de facção criminosa | 19,02 |
Drogas encontradas próximas ao réu (em terreno, beco, etc) | 17,79 |
Droga encontrada dentro da casa em que o réu morava/estava | 15,93 |
Quantidade não condizente com uso pessoal | 13,15 |
Droga encontrada com companheiro/amigo/familiar do réu | 8,07 |
Encontrado material para endolação (balança, sacos, tubos etc.) | 4,09 |
Outras | 13,84 |
Ainda segundo o estudo, 65,84% dos casos em que o local da ocorrência foram considerados como ponto de venda de drogas, as sentenças mencionam que as ocorrências foram em favelas, morros ou comunidades.
De acordo com o estudo, nem sempre o juiz menciona em sua sentença a natureza da substância encontrada durante a ocorrência. Nos casos em que as drogas são citadas, cocaína (1.841 ocorrências) e maconha (1.576) lideram seguidas de crack (413). Em metade dos casos, foi encontrado apenas um tipo de droga com o réu.
Metade dos réus portavam até 100 gramas de maconha no momento do flagrante — apenas 12,6% tinham posse de mais de um quilo quando abordados pela polícia. No caso da cocaína, em cerca de 50% das ocorrências, os réus portavam até 60 gramas da substância.
Segundo a análise, em 62,3% dos casos, os agentes de segurança foram as únicas testemunhas ouvidas durante todo o processo — apenas 24% dos processos contaram com testemunhas de defesa, além dos policiais.
"Na grande maioria dos casos, estes agentes são os juízes de sua própria atividade, pois são eles que fornecerão as declarações que o juiz tomará como base para condenar ou não o acusado", afirmou o defensor público Ricardo André de Souza, subcoordenador de Defesa Criminal da Defensoria Pública do Rio de Janeiro, em nota.
Em pouco mais da metade dos casos, o depoimento dos agentes foi a principal prova usada pelos juízes para basear suas respectivas decisões. Quando isso aconteceu, a maior parte das sentenças (77,6%) determinaram a condenação dos réus e quase 60% das condenações resultaram em penas que previam regime inicial fechado.