Dívida faz museu de Santos Dumont fechar as portas
"Vamos fechar antes que aconteça o mesmo que aconteceu com o Museu Nacional, no Rio", anunciou a curadora Mônica Castello Branco
Estadão Conteúdo
Publicado em 14 de janeiro de 2019 às 09h03.
Sorocaba - A cultura brasileira está prestes a receber mais um golpe: o Museu de Cabangu, que funciona na casa onde nasceu Santos Dumont, em 1873, no município que leva seu nome, em Minas Gerais, recebeu neste domingo, 13, seus últimos visitantes. Atolado em dívidas e com a estrutura deteriorada e o acervo ameaçado, o museu deve amanhecer nesta segunda, 14, com as portas fechadas, após ter exibido por 70 anos importante coleção de cartas, fotografias, documentos, roupas e móveis do "pai da aviação".
"Vamos fechar antes que aconteça o mesmo que aconteceu com o Museu Nacional , no Rio", anunciou a curadora Mônica Castello Branco, filha do fundador. O museu carioca, um dos principais do País, foi destruído por um incêndio na noite de 2 de setembro de 2018.
Mônica atribui o fechamento aos atrasos na subvenção da prefeitura, de R$ 12,6 mil mensais. Alegando falta de repasse de verbas estaduais devidas ao município, a prefeitura suspendeu os pagamentos em agosto. "Já havia atrasos anteriores e a dívida foi se acumulando pelos juros e encargos. Hoje, o museu tem débitos de R$ 150 mil, a maior parte em dívidas trabalhistas."
Os quatro funcionários estão sem receber regularmente há um ano. O aperto financeiro reduziu o investimento em conservação e três galpões de apoio estão fechados há cinco anos. O acervo foi transferido para a casa principal, que também tem infiltrações e rachaduras.
Em 2018, a fundação lançou a campanha online Somos Todos Museu Cabangu, com o objetivo de arrecadar R$ 177 mil, mas só conseguiu R$ 7 mil. Os débitos levaram à inscrição do CNPJ no cadastro de devedores e a fundação não consegue as certidões negativas para se beneficiar da Lei Rouanet de incentivo à cultura, por exemplo.
Na cidade de 46,3 mil habitantes, na Zona da Mata mineira, o fechamento do museu desperta reações. "É um símbolo importante que estamos perdendo. Ser a terra de Santos Dumont sempre foi um orgulho da nossa gente", lamentou a secretária paroquial Maria Luiza de Lima.
'Voto de confiança'
O local, que recebe 2 mil visitantes por mês, chegou a ficar uma semana fechado em fevereiro de 2018, mas reabriu depois que a prefeitura pagou dois dos seis meses de salários atrasados dos funcionários. O presidente Tomás Castello Branco disse na ocasião que a reabertura seria um "voto de confiança" ao município, mas logo os repasses voltaram a atrasar.
A casa onde Alberto Santos Dumont nasceu funciona como museu desde 1973 - ano do centenário do inventor - e foi tombada pelo Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais (Iepha). Em 2018, a prefeitura fez um projeto para restauração, orçada em R$ 12 milhões, mas faltou recursos. O imóvel pertence à prefeitura, mas os cuidados e manutenção foram assumidos pela Fundação Casa de Cabangu, com apoio do município. A Aeronáutica cuida da segurança do museu e da área externa e, mesmo com o fechamento à visitação, manterá esse serviço para proteger o acervo.
Intervenção
O secretário de Administração de Santos Dumont, José Geraldo de Almeida, disse que a prefeitura não permitirá o fechamento. "Se fechar, vamos entrar com medida judicial. A área é do município, podemos cancelar o convênio e assumir o museu." Procurado, o governo de Minas informou ter repassado, na primeira semana da atual gestão, R$ 500 milhões para os municípios mineiros. Informou que trabalha para regularizar os repasses às prefeituras.