A Pensilvânia se tornou um "estado vital para fornecer esses serviços de aborto no nordeste" dos Estados Unidos (AFP/AFP)
AFP
Publicado em 18 de outubro de 2022 às 17h08.
Última atualização em 18 de outubro de 2022 às 17h28.
Jen Sloan, uma enfermeira de 52 anos que vive nos arredores de Pittsburgh, Pensilvânia, votou no Partido Republicano a vida inteira. Mas nas eleições de meio de mandato de 8 de novembro, votará nos democratas porque quer proteger o direito ao aborto, questão muito presente na campanha.
Para essa mãe divorciada de três filhos, "tudo mudou" no final de junho, quando a Suprema Corte dos Estados Unidos anulou a sentença do caso "Roe vs. Wade" de 1972, que desde então garantia esse direito constitucional federal, deixando sua regulamentação para cada estado.
"Foi como um tapa na cara. Achei que era algo intocável (...) que nunca aconteceria na minha vida", diz. Por isso, é impossível dar seu voto ao partido de Donald Trump, no qual votou em 2016 e 2020.
No estado da Pensilvânia (nordeste), onde se anuncia uma feroz batalha por um assento de senador que será fundamental na maioria da câmara alta de Washington, a campanha democrata parece ser um referendo sobre o direito ao aborto, em um contexto de forte inflação que não os favorece.
Em Doylestown, uma pacata cidade do norte da Filadélfia, a filial da organização de planejamento familiar Planned Parenthood dá uma mãozinha.
"Nossas pacientes não vêm aos nossos centros de saúde por motivos políticos" ou "por razões religiosas: elas vêm porque precisam de cuidados", diz sua vice-presidente, Lindsey Mauldin.
"As pacientes vêm de Ohio ou Virgínia Ocidental", os estados vizinhos que restringiram ou proibiram o aborto, comenta à AFP.
A Pensilvânia se tornou um "estado vital para fornecer esses serviços no nordeste" dos Estados Unidos, apesar de ter menos de 20 clínicas para mais de 13 milhões de habitantes.
Entre cartazes dizendo "Meu corpo, minha decisão", Angela Jacobs, uma mãe de 51 anos, diz que é a primeira vez que sai às ruas para protestar.
"Fiz um aborto quando tinha 20 anos e por anos nunca falei sobre isso por vergonha. Mas agora tenho uma filha de 20 anos e quero que ela tenha acesso a isso caso um dia precise", explica.
Lara Putnam, professora do departamento de história da Universidade de Pittsburgh, diz que desde a decisão da Suprema Corte mais eleitores se inscreveram em listas democratas do que em listas republicanas.
"Uma ruptura clara" que reverte temporariamente uma tendência estrutural no estado, onde a base que os democratas tinham na era industrial vem encolhendo, explica.
Perto de Doylestown, Randy Charlins, um eleitor republicano de 61 anos, não acredita. Gerente de bar, ele tem certeza de que o "Dr Oz", como é conhecido Mehmet Oz, médico estrela da TV que concorre na chapa republicana, "será eleito" em detrimento do democrata John Fetterman, ex-prefeito de uma cidade pequena e desindustrializada.
"Está muito acirrado. Mas acho que há uma maioria silenciosa. Há muitos conservadores que se calam por medo", diz.
Para Randy Charlins, a principal preocupação é a inflação, como para 18% dos eleitores, segundo pesquisa nacional do Siena College publicada na segunda-feira pelo New York Times, ante 5% que consideram o aborto uma prioridade.
"Meus clientes vinham três vezes por semana (...) e agora só vêm uma vez. A inflação afeta minha renda, mas também a do meu chefe, o que significa que ele não pode me dar um aumento", diz.
Em todo o país, os republicanos administram sua opinião sobre o aborto com discrição, sabendo que posições muito extremas podem custar-lhes votos.
A publicidade da campanha republicana foca principalmente na luta contra a insegurança e a inflação, e levanta a ameaça da legalização de todas as drogas e uma explosão de insegurança com John Fetterman.
Os democratas lembram que Mehmet Oz e o candidato republicano a governador na Pensilvânia, Doug Mastriano, um ultraconservador, são a favor da restrição e até da proibição quase total do aborto.
A Pensilvânia é conhecida por suas batalhas políticas acirradas: em 2016, deu uma vitória apertada a Donald Trump e quatro anos depois apostou por pouco no lado democrata com Biden.
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