Dilma Rousseff: para analistas, união nacional promovida no combate ao Zika pode beneficiar presidente (REUTERS/Ueslei Marcelino)
Da Redação
Publicado em 11 de fevereiro de 2016 às 19h44.
O zika é uma curiosidade no Brasil: o governo Dilma Rousseff não está sendo amplamente culpado pela crise e uma mobilização contra o mosquito pode até ajudar a presidente a deixar seus problemas políticos para trás.
Na cidade de Limoeiro, no Nordeste do país, os escândalos de corrupção e a recessão cada vez mais profunda reduziram o apoio ao Partido dos Trabalhadores.
Mas a cidade no estado do Pernambuco é também o centro da epidemia viral do Brasil. Glecya Aparecida Fernandes de Melo, uma técnica de laboratório que teve a família toda doente por causa do vírus, diz que as pessoas estão se inscrevendo para as iniciativas do governo de combate à doença em vez de culpar os políticos ou organizar protestos.
“Eu acredito que a gente deveria deixar de lado essas negociações políticas e se unir mais na educação, nos esclarecimentos, ou o surto vai piorar”, disse Glecya. “A gente tem que entender que o mosquito é a causa disso. A gente tem que tomar conta da nossa cidade”.
O zika disparou um alerta global, mas existe um sinal doméstico de esperança para Dilma, que está recrutando soldados, estudantes e funcionários públicos em um esforço para conter a propagação da pandemia.
A presidente começou 2016 sob ameaça de impeachment pelo Congresso, após um ano de crise política e econômica que custou ao país seu grau de investimento.
O apelo pela união nacional em uma emergência de saúde representa uma chance de mudar o foco, segundo Américo Freire, professor de história contemporânea da Fundação Getúlio Vargas, no Rio de Janeiro.
Crise "terrível"
“Dilma está tentando algo, se colocar como chefe de estado”, disse Freire. “Essa crise terrível na saúde pública pode ser um elemento para dar alguma sustentação política, moral, sair de uma agenda de disputa partidária”.
A Organização Mundial da Saúde declarou emergência de saúde pública internacional por causa do vírus zika, que se espalhou por mais de 20 países. No Brasil, a doença está ligada a mais de 4.000 casos suspeitos de microcefalia.
Quando as agências internacionais de saúde deram o alerta, a visão brasileira sobre a crise começou a mudar, disse Humberto Costa, líder do PT no Senado. Costa, que foi ministro da Saúde durante o governo Lula, é de Pernambuco e visitou Limoeiro em dezembro.
“No começo, quando ficou parecendo uma coisa muito brasileira, muito nordestina, muito pernambucana, houve uma tendência maior de culpabilizar os gestores”, disse Costa. “Hoje fica como uma coisa que tem uma dimensão internacional. O mosquito não está escolhendo nem governador, nem prefeitura, nem governo federal”.
Embora os governos locais e federal devam ser responsabilizados pelas medidas de saneamento básico que teriam controlado as populações de mosquitos, o zika não é "uma falha única do sistema de saúde do Brasil”, disse Eric Farnsworth, vice-presidente do Conselho das Américas.
Apenas 9 por cento dos brasileiros disseram que o governo Dilma era bom ou ótimo, segundo uma pesquisa da CNI/Ibope realizada em dezembro.
No entanto, o processo de impeachment perdeu impulso desde então e Dilma -- que não pode concorrer à presidência novamente -- agora parece ter uma maior probabilidade de sobrevivência, dizem parlamentares e analistas.
Exército da saúde
O zika pode ser uma questão decisiva no segundo mandato da presidente, que termina em 2018.
Histórias sobre o custo humano da doença, desde bebês abandonados até abortos clandestinos, estão começando a ocupar parte do espaço na mídia normalmente dedicado às investigações de corrupção.
Em um pronunciamento ao país, em 3 de fevereiro, Dilma conclamou os brasileiros a se unirem. "Formemos um grande exército de paz e de saúde”, disse.
Glecya, em Limoeiro, disse que se apresentará -- unindo-se aos soldados e funcionários da saúde que planejam ir de porta em porta pelo país, em 13 de fevereiro, em busca da água parada onde os insetos transmissores da doença colocam ovos.
“Tem de ter a consciência de todo o mundo”, disse ela. “Não só os políticos”.