Lula: diante de milhares de simpatizantes horas antes de ser preso, ex-presidente posou de mãos dadas com os pré-candidatos à Presidência do PCdoB, Manuela D'Ávila, e do PSOL, Guilherme Boulos (Francisco Proer/Reuters)
Reuters
Publicado em 9 de abril de 2018 às 18h45.
Última atualização em 9 de abril de 2018 às 18h47.
São Paulo - Confirmada a cada vez mais provável hipótese de o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, agora preso, não poder entrar na corrida presidencial de outubro, o destino do espólio eleitoral do petista, que lidera as pesquisas de intenção de voto, deverá seguir indefinido em meio a uma disputa entre candidatos à esquerda, entre eles o PT, por quinhões deste capital político.
A cerca de seis meses da eleição e a quatro meses da definição oficial das candidaturas, as pesquisas eleitorais divulgadas até agora dão sinalizações ainda precárias de quem será o principal herdeiro da força eleitoral de Lula. Movimentações do petista durante seu ato pré-prisão no fim de semana tampouco são capazes de sinalizar claramente a direção de seu capital político.
"As pesquisas mostram, quando são realizados os cenários sem a presença do Lula, que os votos dele se dividem entre o Ciro Gomes (PDT) e a Marina Silva (Rede), em porcentagem de por volta de 15 por cento dos votos dele para cada um. Agora, sobram 70 por cento que vão para os brancos, nulos e indecisos. É um quadro de muita incerteza", disse o analista político e diretor-geral do Cepac, Rubens Figueiredo.
No fim de semana, e diante de milhares de simpatizantes horas antes de ser preso, Lula posou de mãos dadas com os pré-candidatos à Presidência do PCdoB, Manuela D'Ávila, e do PSOL, Guilherme Boulos.
O gesto, no entanto, e de acordo com analistas ouvidos pela Reuters, não teve a intenção de sinalizar que ali estavam dois herdeiros do capital político lulista para o pleito de outubro. Além disso, Boulos --como líder do Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto (MTST)-- e Manuela --cujo partido comanda boa parte do movimento estudantil-- representam setores de movimentos sociais que serão importantes para Lula neste momento.
"É bom ter uma certa cautela olhando para isso, porque nenhum dos dois é do partido dele. De modo que a percepção de que ele estava transferindo para esses dois, acho que é um pouco de precipitação. É um gesto, em certa medida, de tentativa de união desse campo", disse o cientista político da FGV Cláudio Couto, lembrando que o PT, mesmo com o forte desgaste que sofreu recentemente, ainda é a legenda hegemônica entre as esquerdas.
"Não dá para imaginar que o Lula esteja passando o bastão para eles. Não está", acrescentou.
Para Couto, será necessário aguardar as próximas pesquisas eleitorais para saber se o cenário em que Ciro e Marina aparecem como principais beneficiários da ausência eleitoral de Lula se manterá e para saber o que o especialista chamou de "ritual" feito por Lula horas antes de sua prisão terá impacto imediato na preferência do eleitorado.
Ao mesmo tempo, parece pouco provável, na avaliação dos analistas, que o PT decida abrir mão de lançar candidato próprio ao Palácio do Planalto em favor de um candidato de outra legenda de esquerda.
A estratégia do partido de seguir insistindo na candidatura de Lula, mesmo com a cada vez mais provável inelegibilidade, representa um risco, já que pode-se perder o timing de lançamento de um nome alternativo.
Ao mesmo tempo, especialistas também apontam que essa deve ser a estratégia com maior chances de maximizar a capacidade de transferência de capital político do Lula.
"A estratégia do Lula vai ser: ele vai querer participar do processo até quando der. Quando ele for impugnado, ele vai dizer 'já que eu não posso, esse vai ser o meu candidato'. Ele fica no cenário o máximo possível, ele fica mais forte, mais presente, mais ativo, e aí até 17 de setembro o cabeça de chapa pode ser trocado", disse Figueiredo, do Cepac, apontando o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad como preferido no momento para ser o Plano B petista.
Pela legislação eleitoral, é possível a mudança na cabeça de chapa até 20 dias antes da eleição, cujo primeiro turno está marcado para 7 de outubro.
De todo modo, o tamanho do espólio eleitoral de Lula deverá ficar aquém dos cerca de 35 por cento de intenção de voto que o petista já registrou nas pesquisas, na avaliação da especialista em pesquisas de opinião Fátima Pacheco Jordão.
"É mais do que suficiente para ser um candidato competitivo, mas dificilmente chegará no patamar de Lula. Ficará aquém", avalia.
"Provavelmente, uma vez definidos os candidatos, essa esquerda ou está pulverizada --e o candidato do PT estará sozinho--, mas em um caso ou em outro a soma deles, inicialmente, provavelmente não chegará a 35 por cento que Lula já obteve de intenção de voto."
Para a especialista, aliás, o cenário eleitoral atual de grande incerteza, tanto no campo da esquerda quanto no da direita e no do centro, faz com que a definição sobre o destino do capital político de Lula ainda seja incerta.
"A população não está, neste momento, enxergando as eleições. Ela vai começar a enxergar daqui a uns meses com a definição dos candidatos", disse a especialista.
(Edição de Maria Pia Palermo)