Coincidência de pagamentos reforça repasse de salário a Flávio Bolsonaro
Relatório da Coaf mostra 15 pagamentos foram feitos no dia que caía salário dos funcionários da Assembleia Legislativa do Rio ou em até três dias úteis
Estadão Conteúdo
Publicado em 12 de dezembro de 2018 às 12h09.
Última atualização em 12 de dezembro de 2018 às 15h45.
Rio e Brasília - Mais da metade dos depósitos em espécie recebidos em 2016 por Fabrício José Carlos de Queiroz, ex-motorista do deputado estadual e senador eleito Flávio Bolsonaro (PSL), filho do presidente eleito, Jair Bolsonaro, foram feitos no dia do pagamento dos funcionários da Assembleia Legislativa do Rio ou até três dias úteis depois.
Uma análise do relatório do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que apontou movimentações financeiras atípicas em contas de assessores e ex-servidores do Legislativo, mostra que 34 das 59 operação financeiras seguiram o mesmo padrão. O restante ocorreu em até uma semana.
O jornal O Estado de S. Paulo identificou que 15 depósitos em espécie na conta de Queiroz ocorreram nos mesmos dias de pagamento dos servidores da Alerj em 2016.
Essas datas variaram a cada mês, por causa da crise do Rio, que levou a atraso nos salários, mas foram mapeadas em cruzamento do relatório do Coaf com o cronograma de pagamentos da Assembleia fluminense. Outros 19 depósitos na conta de Queiroz ocorreram em até três dias úteis após os funcionários receberem seus vencimentos.
Os valores depositados mensalmente também se repetem ou são aproximados. Investigadores analisam se há padrão nas ações, em valores ou periodicidade.
O jornal Folha de S. Paulo publicou nesta terça-feira, 11, que, logo após receber os valores, Queiroz realizou saques em espécie em quantias aproximadas às que haviam entrado em sua conta.
A coincidência de datas ocorre logo nos primeiros depósitos feitos em 2016. Em 12 de janeiro, dia de pagamento na Alerj, por exemplo, o então assessor recebeu três depósitos em espécie, nos valores de R$ 4.400, R$ 5.566 e R$ R$1.771. Outra sequência é vista em 14 e 15 de abril, dia de pagamento na Alerj.
No primeiro dia, Queiroz recebeu um depósito de R$ 7.400. No seguinte, foram feitos outros dois depósitos, de R$ 1.771 e R$ 4.300, na sua conta.
Em maio de 2016, os funcionários da Alerj receberam no dia 11. Nessa data, Queiroz ganhou três depósitos, novamente no valor de R$ 1.771, outro de R$ 3.071 e um último de R$ 1.000.
Um dia depois, em 12 de maio, foi feito na conta outro depósito, de R$ 6.300, e no dia 16 caiu o último valor do mês, de R$ 1.160. Os padrões se repetem em junho e em novembro. O relatório, no entanto, não diz quem realizou os depósitos.
No relatório preliminar da operação Furna da Onça, a delegada Xênia Ribeiro Soares chegou a citar a suposta existência de esquema de funcionários fantasmas e auxílio alimentação que seriam repassados pelos servidores dos gabinetes aos deputados.
De acordo com a delegada, o procedimento foi mapeado no gabinete do deputado estadual Paulo Melo, preso pela operação, mas já foi "identificado em outros gabinetes e que se afigura como uma prática criminosa disseminada na Alerj". "As informações apresentadas são de máxima gravidade e demandam uma enérgica resposta da Justiça", diz o texto.
Depoimento
O ex-motorista deve depor na semana que vem no Ministério Público do Rio, que investiga o caso. O jornal apurou que as transações entre funcionários do Legislativo estão entre os motivos que levaram os bancos a classificar as movimentações como atípicas e a advertir o Coaf a seu respeito.
O relatório indicou que pelo menos nove funcionários e ex-funcionários do gabinete de Flávio Bolsonaro fizeram operações (depósitos ou recebimentos) na conta do ex-motorista e ex-segurança do deputado. Entre elas, estão, as filhas de Queiroz, Nathalia e Evelyn Melo de Queiroz, e a sua mulher, Marcia Oliveira de Aguiar.
O próprio Coaf, em seu relatório anexado à operação Furna da Onça, que investiga corrupção no Legislativo do Rio, classificou o fluxo financeiro como atípico. Parte dos recursos depositados na conta de Queiroz por assessores do gabinete superavam o salário do servidor.
Em nota, a assessoria de Flávio Bolsonaro ressaltou que ele não é investigado, "visto que não praticou qualquer ilícito em sua atividade parlamentar".
O texto afirma ainda que o deputado "segue à disposição para prestar esclarecimentos às autoridades, se instado for" e "espera ver, dentro dos trâmites legais, a completa resolução do caso pelas autoridades competentes". Procurado, Queiroz não quis se manifestar. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.