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Crivella admite chance de nova onda de coronavírus após flexibilização

Prefeito do Rio admitiu preocupação com as consequências da reabertura e voltou a pressionar governador por oferta de leitos de UTI

Rio de Janeiro: estado está em fase de flexibilização da quarentena (Daniel Resende/Estadão Conteúdo)
AO

Agência O Globo

Publicado em 19 de junho de 2020 às 20h15.

Última atualização em 19 de junho de 2020 às 20h49.

O prefeito Marcelo Crivella admitiu preocupação nesta sexta-feira com a possibilidade de que a reabertura das atividades econômicas no Rio possa de fato provocar uma segunda onda de casos de covid-19 , como também comentou nesta quinta o secretário estadual de Saúde, Fernando Ferry.

Caso este cenário se torne real, Crivella não descarta adiar o plano de flexibilização ou até retroceder etapas. Hoje, o Rio se encontra na segunda fase das seis previstas no processo. Entre as atividades já autorizadas até o momento estão o funcionamento de shoppings (com um terço da capacidade), e de centros comerciais e áreas de lazer — incluindo as caminhadas no calçadão da orla.

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"Tem risco. Se o Hospital Ronaldo Gazolla [ em Acari, de referência para tratamento do novo coronavírus ] e o hospital de campanha do Riocentro ficarem entupidos de gente, e o mesmo acontecer na Baixada Fluminense, nós vamos fechar tudo. Não tenha dúvida. Curitiba fez isso, Porto Alegre também. Além disso, as pessoas têm de continuar usando máscaras, higienizando as mãos e não se aglomerando. Mas estamos preparados. Montamos uma Arca de Noé [ em referência aos equipamentos médicos e leitos reservados para tratar pacientes ]. A arca não evita dilúvio, mas permite enfrentar o dilúvio", disse o prefeito.

Crivella, no entanto, diz que essa segunda onda pode não ter tantos casos graves e fatais como no início da pandemia, em março:

"Essa onda, se vier, nunca será igual à anterior. Nossos médicos estão em um nível de aprendizagem espetacular, que permite que vençam a doença, através de diagnósticos precoces", afirmou.

As declarações do prefeito foram dadas durante uma cerimônia no Riocentro em que o prefeito emprestou 50 respiradores e 40 monitores para que os municípios de Duque de Caxias, Queimados, Itaguaí e Petrópolis abram novos leitos de UTI na região metropolitana e outras cidades do estado.

Um dos objetivos da prefeitura com a medida é tentar desafogar a demanda por vagas na rede municipal do Rio. Isso porque, hoje, todos os leitos públicos do Rio são administrados em uma espécie de pool.

Eles atendem a demandas não apenas da capital como também de municípios da Baixada que integram a chamada Região Metropolitana 1 da Saúde. Antes, Bara do Piraí, Guapimirim, Mangaratiba, Nova Iguaçu e Seropédica já haviam recebido aparelhos.

"São 180 kits com respiradores [ 220 equipamentos no total ]. Isso permitirá suprir parte das necessidades desses municípios. E permitirá que avencemos para a fase 3 da reabertura — disse a secretária municipal de Saúde do Rio, Ana Beatriz Busch, ao lembrar que as taxas de ocupação e oferta de leitos estão entre os itens que permitem a mudança de estágio. A terceira etapa está prevista para o dia 1º de julho. Nessa fase está programada, por exemplo, a reabertura do comércio de rua.

O prefeito mais uma vez destacou, no entanto, que a evolução do cronograma também depende que o governo estadual cumpra sua parte, ampliando oferta de leitos, conforme prometido quando lançou o plano de enfrentamento à covid.

Crivella lembrou que parte do cronograma — hospitais de campanha — não foi cumprida em meio a denúncias de superfaturamento nos contratos firmados pela Secretaria de Estado de Saúde para a montagem das estruturas móveis e aquisição de respiradores.

"O governo do estado tinha a esperança de abrir 1.000 leitos e não conseguiu", pontuou.

Crivella revelou tambám ainda esperar por mais recursos para a própria rede de Saúde do município. O prefeito afirmou que o estado ainda não cumpriu um acordo firmado há mais de um ano, que envolve um repasse de 57 milhões de reais como aporte extra para ajudar no custeio dos hospitais Albert Schweitzer, em Realengo, e Rocha Faria, em Campo Grande, municipalizados em 2016.

Um aporte extra de cerca de 200 milhões de reais por ano em recursos da União para ajudar a manter outros hospitais e policlínicas transferidas para o Rio nas últimas duas décadas também não saiu. Crivella tenta um acordo com a União desde 2017 e no mês passado chegou a tratar do assunto diretamente com o presidente Jair Bolsonaro.

"O processo parou com a saída do ministro Henrique Mandetta do Ministério da Saúde. Esses 200 milhões de reais seriam essenciais", lamentou.

"É o fim do mundo", diz Crivella sobre escândalos de corrupção

Ainda no ato de entrega dos equipamentos, Crivella acrescentou que a pandemia ajudou a ampliar a solidariedade do carioca, e citou ações em igrejas e centros espíritas.

"Essa pandemia trouxe coisas importantes para a minha cidade. Nunca se distribuiu tanta cesta básica. Nas áreas menos ricas isso é feito espontaneamente. As igrejas, então, meu Deus do céu. Todas elas. Centros espíritas, também. O desemprego cresceu. Não tem atividade econômica. Nunca se viu tanta solidariedade e amor ao próximo. É isso que vai mudar o Brasil para ser um país melhor", comentou.

O prefeito comentou também sobre escândalo de corrupção, sem especificar qual, o que ele definiu como "fim do mundo."

"Há maluquices, como o escândalo da corrupção. Desgraçadamente descobrimos que irmãos nossos usavam o desespero das pessoas para ganhar dinheiro. É o fim do mundo. Os responsáveis vão se reeducar nas penas que cumprirão nos presídios",— disse o prefeito.

Prefeito cita queda no número geral de mortes na capital

Outro ponto levantado por Crivella durante a coletiva foi um cenário que, segundo ele, é de queda no número geral de óbitos na cidade do Rio. E não apenas por covid-19. De acordo com o prefeito, neste mês, até quinta-feira, o Rio tinha registrado seis sepultamentos a menos em comparação ao mesmo período de junho de 2019.

O prefeito atribuiu os dados à quarentena, que, ele analisa, reduziu tanto o número de casos do novo coronavírus como outras ocorrências, como mortes provocadas por acidentes de trânsito e tiroteios provocados por incursões policiais.

"Mas não temos nada o que comemorar. Em maio registramos mais de 10.000 mortes na cidade. Por outro lado, as medidas tomadas para conter a epidemia surtiram efeito. Estamos ajudando a abrir leitos no entorno do Rio. Quanto mais leitos, mais respiradores, monitores, o que pudermos colocar à disposição, nós vamos", ressalvou.

Os aparelhos que a prefeitura do Rio está emprestando equipavam unidades de saúde da capital e foram desativados, dando lugar a aparelhos mais modernos, comprados da China no fim do ano passado. Na época, nem sequer haviam sido identificados casos, mesmo no país asiático.

A proposta original era modernizar o parque tecnológico das unidades da Secretaria Municipal de Saúde. Entre os equipamentos comprados estavam cerca de 800 novos respiradores, carrinhos de anestesia, além de novos tomógrafos.

"Nesse ano, houve restrições de aquisição de equipamentos comprados em cima da hora. Nós compramos antes da pandemia, com um preço fixo em real [ o que evita oscilações da moeda ] para os contratos serem quitados em cinco anos", esclareceu Crivella.

Presenças políticas

A cerimônia para a entrega de equipamentos no Riocentro virou um ato político, com a presença, principalmente, de vereadores e deputados do Republicanos — partido do prefeito Marcelo Crivella — e de aliados do presidente Jair Bolsonaro que permaneceram no  PSL mesmo depois que ele deixou o partido. Entre as figuras mais festejadas estava o bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), Célio Lopes. Célio está afastado do templo há cinco anos desde que assumiu a secretaria-geral do Republicanos no estado.

Lopes atuou como uma espécie de interlocutor da prefeitura do Rio e os municípios que estão recebendo os aparelhos. Antes da chegada de Crivella, gravou vídeos com representantes dos municípios da Baixada para agradecer a cessão dos aparelhos.

Entre os políticos presentes estava a deputada estadual Alana Passos (PSL), que em seu site oficial se apresenta como a ''01 do Bolsonaro." Alana é pré-candidata a prefeita de Queimados, sua base eleitoral. Também ligada à Iurd, outra presença foi a de Leide (Republicanos), vereadora de Caxias que foi candidata a vice na chapa de Anthony Garotinho ao governo do estado nas eleições de 2018.

"Ouvia as demandas do vereadores dos municípios e encaminhava as demandas para a Secretaria Municipal de Saúde do Rio que fez as avaliações técnicas dos pedidos. Isso não tem ligação com igreja. Há cinco anos estou licenciado da  Iurd. Como secretário-geral do Republicanos, sou responsável pela coordenação dos vereadores do estado", esclareceu Célio Lopes.

Os deputados federais Rosângela Gomes e Jorge Bráz (também ligados à Iurd) e filiados ao Republicanos também estavam entre os presentes. Em tese, não há restrições para eventos do gênero. Inaugurações de obras e ofertas de serviços públicos em ano eleitoral são permitidos num prazo de até 90 dias antes das eleições. Neste ano, a restrição começa em 7 de julho.

Em Itaguaí, vereadores negociam no lugar do prefeito

Itaguaí recebeu dez respiradores que permitirão tratar pacientes com covid. Por lá, o acordo entre a prefeitura e o município da Baixada foi marcado por uma situação curiosa. Ameaçado de impeachment, o prefeito Carlos Bussatto Júnior não tem sido visto há semanas em seu gabinete. Os vereadores da cidade alegam que isso seria uma tentativa de evitar que ele fosse citado no processo de impedimento. Com isso, a negociação foi feita com a comissão de vereadores que acompanha a evolução da pandemia.

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