Conselho proíbe internação de crianças e adolescentes em comunidades terapêuticas
Órgão público afirma que esses estabelecimentos possuem estrutura 'baseada no isolamento, violência, abstinência e não transitoriedade'
Agência de notícias
Publicado em 12 de julho de 2024 às 11h41.
O Conselho Nacional dos Direiros da Criança e do Adolescente (CONANDA) determinou nesta sexta-feira a proibição da internação de crianças e adolescentes em comunidades terapêuticas. Em uma resolução publicada no Diário Oficial, o órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania afirmou que o acolhimento de menores de idade nesses locais "viola as regras protetivas previstas na Constituição Federal ".
As comunidades terapêuticas consistem em estabelecimentos privados, ligados a igrejas na maioria dos casos, que se baseiam na religiosidade, abstinência e em atividades ocupacionais como formas de tratamento a pessoas com dependência química. Denúncias de trabalho forçado, tortura, casos de intolerância e contenções físicas são investigadas pelo Ministério Público Federal (MPF) e pelo Conselho Nacional de Psicologia.
Na decisão divulgada nesta sexta-feira, o conselho caracteriza a internação de crianças e adolescentes nesses espaços como uma ação de privação de liberdade, "infringindo os direitos à liberdade, participação e convivência familiar" desse público. Segundo a resolução, essas entidades apresentam estrutura "baseada no isolamento, violência, abstinência e não transitoriedade".
O órgão público também determinou que, em casos de atendimento de urgência, o atendimento ocorra preferencialmente em Centros de Atenção Psicossocial (Caps), hospitais ou em uma Unidade de Acolhimento Infanto-juvenil de Saúde (Uais).
Além disso, o Poder Executivo também deve identificar todas as crianças e adolescentes que estão atualmente internadas nesses locais. Depois disso, o governo será responsável pela elaboração de um plano para reencaminhá-los para atendimento em centros de tratamento adequados.
Controvérsia no governo
O Ministério da Saúde, de Nísia Trindade, defende o fim do apoio às comunidades. Mas o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, comandado por Wellington Dias, mantém o financiamento, com a ajuda de emendas parlamentares, em uma aproximação com bases evangélicas.
Há uma semana, a Frente Parlamentar da Saúde Mental também divulgou o relatório “ Raio-X das Comunidades Terapêuticas ” com dados que embasam as críticas a essas comunidades, que tiveram o descredenciamento já pedido pelos conselhos nacionais de Saúde, de Direitos Humanos e de Criança e Adolescente e de Assistência Social.
A análise de 288 projetos terapêuticos apoiados financeiramente pelo governo federal entre 2019 e 2022 mostrou que 14% não tinham médicos na estrutura, 28% não contavam com psicólogos e 67% não possuíam enfermeiros. Mas 95% destacaram a espiritualidade como uma forma de cura, e 37% faziam uso de laborterapia, o tratamento através do trabalho.
O relatório aponta que o investimento federal no setor alcançou R$ 560 milhões entre 2017 e 2020, segundo estudo do Conectas Direitos Humanos e o Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), mas muitos métodos dos projetos não têm respaldo científico. Há propostas baseadas em “ciência da espiritualidade” e “doutrina criacionista.
Morte em Cotia
O assunto ganhou maior projeção ao longo desta semana quando um funcionário da Comunidade Terapêutica Efata foi preso, nesta terça-feira, suspeito de torturar e matar um dos pacientes, em Cotia, em São Paulo. A vítima, no entanto, era adulta.
Segundo as investigações, um dos suspeitos de autoria do crime é o homem identificado como Matheus de Camargo Pinto, de 24 anos, era um interno e não tinha formação para atuar no local.
A vítima, Jarmo Celestino de Santana, 55 anos, morreu após ser amarrado em uma cadeira. O momento das agressões foi filmado e o vídeo circulou nas redes sociais. O homem chegou a ser encaminhado para o hospital, mas não resistiu aos ferimentos.
De acordo com a Polícia Civil, Matheus enviou uma mensagem de voz para um perfil chamado "Danny vovó criminosa" e confessou ter agredido Jarmo. Ainda na mensagem, ele admite "bater tanto" na vítima que acabou com a mão machucada. O áudio e as agressões contra o paciente foram compartilhadas nas redes sociais.
“Cobri no cacete, cobri... chegou aqui na unidade... pagar de brabo... cobri no pau. Tô com a mão toda inchada”, relatou Matheus. Em depoimento, o homem confessou o crime e disse que outros funcionários também participaram da agressão.