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Comunidade de surdos vai ao STF por provas de concursos em Libras

Entidades defendem acesso de surdos a provas na língua de sinais e possibilidade de respostas para as questões dissertativas em Libras

Homem conversa com mulher falando em Libras  (FENEIS/Divulgação)

Homem conversa com mulher falando em Libras (FENEIS/Divulgação)

Talita Abrantes

Talita Abrantes

Publicado em 23 de novembro de 2017 às 17h14.

Última atualização em 23 de novembro de 2017 às 20h03.

São Paulo – A Federação Nacional de Educação e Integração de Surdos (Feneis) entrou com uma ação no Supremo Tribunal Federal (STF), na semana passada, pedindo para que surdos tenham a possibilidade de fazer exames de processos de seleção, como concursos públicos, na Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Na ação, a Feneis, em conjunto com o Instituto Vertere, alega que um trecho da Lei 10.436, de 2002, é inconstitucional. Essa é a lei que reconheceu a validade da Libras em todo território nacional. O problema, segundo as entidades, é que o artigo 4º, em seu parágrafo único, afirma que tal idioma não pode substituir a modalidade escrita da língua portuguesa.

Isso significa que em um concurso público, por exemplo, os surdos devem usar, preferencialmente, a língua portuguesa tanto para compreender as questões quanto para responder às perguntas dissertativas.

O ponto, segundo a Feneis e o Instituto Vertere, é que a Libras é a língua natural dos surdos, portanto, obrigá-los a fazer uma prova em outro idioma feriria o princípio constitucional de igualdade de condições. "Obrigar o surdo a usar a língua portuguesa traz uma concorrência desigual", diz Abel de Santana, graduando em Direito e responsável pela ação.

“A nossa língua [dos ouvintes] é oral e escrita. Já a dos surdos é gestual e visual. A estrutura linguística é completamente diferente. Se a gente obriga os surdos a se comunicar em uma língua que não faz sentido para eles, isso tem um impacto muito grande”, afirma Bruno L'Astorina, coordenador do Instituto Vertere.

A proposta das entidades é autorizar os surdos a gravar suas respostas na língua de sinais no lugar de produzir um texto em português e oferecer a eles acesso a vídeos com a tradução para Libras das perguntas da prova, a exemplo do que foi feito na edição deste ano do Enem.

“Isso equipara o nível de respostas [dos surdos aos dos] candidatos que tenham a língua portuguesa como sua primeira língua”, dizem os diretores da Feneis, que são surdos,  em entrevista a EXAME.com por e-mail.

Hoje, de acordo com as Feneis, os candidatos surdos podem requisitar às bancas examinadoras a presença de um tradutor/intérprete para interpretar as questões da prova. No entanto, a Feneis afirma que essa solução não é suficiente por dois motivos.

O primeiro é que os intérpretes de Língua de Sinais não têm acesso prévio à prova para poder estudar e elaborar a melhor tradução possível. “A diferença básica entre interpretação e tradução é o tempo. Para traduzir, há uma preparação prévia do profissional que analisa as perguntas e as produz em Libras”, diz a Feneis.

Além disso, a qualificação profissional dos tradutores e intérpretes de Libras varia de região para região e de pessoa para pessoa. Isso significa que em um mesmo concurso diferentes interpretações da mesma prova podem ser repassadas para os candidatos surdos.

“A tradução é muito mais consistente [já que] se apresenta uma única versão para todos os candidatos, pois é filmada previamente”, diz o coordenador de comunicação da Feneis.

A ação foi protocolada no STF no último dia 14 de novembro e tem relatoria do ministro Marco Aurélio Mello.

Segundo dados do Censo de 2010, 9,7 milhões de pessoas têm deficiência auditiva. Desses, mais de 2 milhões têm surdez  severa, situação em que há uma perda entre 70 e 90 decibéis (dB). Cerca de um milhão são jovens até 19 anos.

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