Como o aumento dos juros está causando a onda de demissões em massa
Enquanto a taxa de juros estiver em patamares elevados como o atual, diversos projetos e iniciativas deixarão de ser atrativos e haverá ainda diversas empresas demitindo em massa para antecipar o cenário de crise financeira
Da Redação
Publicado em 9 de fevereiro de 2023 às 06h48.
Última atualização em 9 de fevereiro de 2023 às 15h45.
Atualização: este texto foi alterado às 15h40 a pedido dos autores
Por Mariana Palandi e Diego Lucchesi*
Desde o segundo semestre de 2022 e, mais recentemente, no início de 2023, uma onda de demissões em massa atingiu empresas brasileiras e estrangeiras dos mais diversos setores da economia. Algumas das companhias mais valiosas do mundo, como Meta, Amazon, Microsoft, Tesla e Google, que juntas têm um valor de mercado de mais de US$ 4,8 trilhões, anunciaram cortes significativos em suas forças de trabalho. Além dessas, a lista de empresas que realizaram layoff – jargão utilizado pelo mercado para caracterizar demissões em massa – é longa. O movimento atinge, inclusive, startups como Buser, Alice, Movile, iFood, Hotmart, Loft e QuintoAndar no Brasil.
O objetivo do layoff é simples: causar um corte drástico de custos a partir da demissão de um número significativo de funcionários. Mas por que isso está acontecendo logo agora? O principal motivo é a tentativa dos agentes de mercado de antecipar um momento de crise financeira.
Na verdade, a crise financeira vem se anunciando a partir dos aumentos consecutivos dos juros nos Estados Unidos desde maio de 2022 pelo Banco Central Norte-Americano (FED), o que sugere uma expectativa de recessão no país. Vale ressaltar que esse cenário gera um efeito cascata em outras localidades, já que as políticas econômicas do FED balizam as políticas econômicas de quase todos os países do globo, que também passam a elevar suas taxas básicas de juros.
Nesse sentido, já sabendo do cenário de contração econômica que vem se desenhando desde maio de 2022, não é de se surpreender que estamos em um período de demissões em massa. Com a alta da taxa básica de juros de uma economia, o custo de oportunidade de uma empresa em alocar recursos em iniciativas e projetos também aumenta. Isso ocorre porque a taxa básica de juros de uma economia refere-se ao retorno mínimo exigido por um investidor para abrir mão de seus recursos. Com uma taxa básica de juros elevada, contexto em que se torna rentável para o investidor alocar seus recursos em um título público sem praticamente qualquer risco, uma série de projetos que antes pareciam rentáveis deixam de ser atrativos, já que a sua taxa de retorno pode não compensar o custo de oportunidade do investidor, que passa a ser maior com o aumento da taxa básica de juros da economia.
Em última instância, à medida que vários projetos passam a não ser mais atrativos ao investidor, uma série de decisões estratégicas, visando diminuição dos custos e iniciativas para aumento da produtividade, passam a ser necessárias. Nesse sentido, uma das medidas adotadas pelas empresas é a de redução do quadro de funcionários.
Agora, imagine que o custo de oportunidade para alocação de recursos em um projeto cresceu não apenas para um, mas para a grande maioria dos agentes de mercado. Trata-se de um cenário de contração econômica, no qual os investimentos em projetos associados à economia real, geradores de emprego, são relativamente menos atrativos e, inclusive, desencorajados e desinvestidos.
Um estudo desenvolvido pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper) em novembro de 2022, intitulado “ A emergência da fome e a prioridade de acelerar o crescimento ” e realizado com 450 empresas brasileiras de capital aberto, aponta que o aumento de 1 ponto percentual no custo de oportunidade de uma empresa, em que a taxa básica de juros de uma economia é um dos componentes, diminui o investimento em 5,7 pontos percentuais.
Ou seja, pode-se dizer que, em um ambiente econômico de taxas de juros altas, o custo dos investimentos aumenta de tal maneira que, ao tomarem a decisão de alocar recursos, os investidores optam por iniciativas menos arriscadas e com elevado rendimento, como os títulos públicos, gerando desemprego. Por outro lado, juros baixos promovem o investimento privado em razão da maior quantidade de projetos que passam a ser rentáveis economicamente – em outras palavras, como a rentabilidade da alocação de capital em alternativas de baixo risco é menor, em busca de retornos maiores, o investimento privado precisa arriscar-se em outras iniciativas, potencialmente geradoras de emprego.
Nesse sentido, para que possamos voltar a um cenário de expansão econômica, com crescimento e estabilidade, é necessário que as entidades atuem com responsabilidade e maturidade para guiar a sociedade de forma a minimizar os impactos e acelerar uma retomada virtuosa da economia.
* Mariana Palandi é analista da Tendências Consultoria, onde trabalha com estratégia de negócios e finanças corporativas, incluindo modelagem econômico-financeira de empresas de diversos setores. É mestre em Administração de Empresas pelo Insper e bacharel em Ciências Econômicas pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
* Diego Lucchesi é analista da Tendências Consultoria e tem experiência em temas financeiros, incluindo valuation e estratégia de negócios. É mestrando em Economia pelo Insper e bacharel em Ciências Econômicas com trilha em Finanças Corporativas pela Fundação Escola de Comércio Álvares Penteado (FECAP).