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Como as desigualdades afetam a decisão das brasileiras em ter filhos

Mulheres com mais condições controlam sua reprodução, já as mais pobres têm mais filhos não programados, mostra relatório do UNFPA

Grávidas: renda e educação modificam a taxa de reprodução das brasileiras (Ricardo Funari/Getty Images)

Grávidas: renda e educação modificam a taxa de reprodução das brasileiras (Ricardo Funari/Getty Images)

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Clara Cerioni

Publicado em 17 de outubro de 2018 às 06h00.

Última atualização em 17 de outubro de 2018 às 09h38.

São Paulo — No Brasil, a escolha de engravidar ou não, e quantas vezes, ou mesmo de adiar a maternidade para trabalhar é uma questão de privilégio.

No décimo país mais desigual do mundo pelo índice de Gini, mulheres com mais oportunidades financeiras e educacionais durante a vida apresentam menor taxa de fecundidade, enquanto as mais pobres ficam grávidas mais vezes e mais novas, em média.

Essa é a realidade apresentada no relatório "O poder de escolha", elaborado pelo Fundo de Populações das Nações Unidas (UNFPA) sobre direitos reprodutivos e a transição demográfica, divulgado nesta quarta-feira (17).

A pesquisa revela que desigualdade econômica, falta de acesso à informação, precariedade nos serviços de saúde e má distribuição de renda impactam diretamente nas taxas de fecundidade.

Para comprovar esse cenário, o relatório apresenta dados de dois extremos. De um lado estão as mulheres com mais anos de estudo e com uma progressão maior na carreira profissional. Essas têm menos filhos e, inclusive, o número costuma ser menor do que o desejado.

Na outra ponta, que concentra o maior número de mulheres, estão aquelas com menos anos de estudo que ficam grávidas mais vezes do que queriam. Elas são jovens e, na maioria das vezes, a gravidez não foi planejada.

Para Jaime Nadal, representante do UNFPA no Brasil, essa realidade mostra que apesar dos avanços dos últimos anos, o acesso a serviços de saúde sexual e reprodutiva ainda está longe de ser o ideal.

"O Brasil passou pelo mesmo processo que outros países do mundo, em relação à queda da taxa de natalidade. No entanto, as meninas mais pobres, por falta de escolhas, oportunidades e atenção dos serviços públicos, ficaram à deriva", explica.

Os números corroboram com esse cenário. A parcela mais rica da população, que corresponde a 20% dos brasileiros, apresentam a menor taxa de fecundidade, com índice médio de 0,77 filho por mulher. Já os 20% mais pobres aparecem como os que mais têm filhos, são 2,9 por mulher.

Mulheres que estudaram entre cinco e oito anos também são as que mais têm filhos, com taxa média de 3 para cada mulher. As com mais de doze anos de estudos têm 1,18.

O que fazer para resolver?

A desigualdade na taxa de fecundidade no Brasil traz inúmeros impactos para a saúde pública — um exemplo são os casos das mulheres que, por não terem controle reprodutivo sobre seus corpos, se submetem a abortos clandestinos. Além disso, são aprofundadas as desigualdades do mercado de trabalho, de renda e de gênero.

Para solucionar o problema, o relatório apresenta quatro possibilidades. As políticas públicas precisam ser universais e de qualidade, os direitos jurídicos legais devem ser respeitados, a educação tanto para meninos quanto para meninas deve ser um direito resguardado e, por último, os homem precisam assumir seus papéis e tomar parte nas decisões.

"As mulheres, principalmente as mais vulneráveis precisam ter acesso a métodos contraceptivos eficazes. Também é preciso combater o matrimônio infantil, o estupro, a violência sexual e a impunidade. Para isso, a educação sexual é essencial. Mas isso tudo, sem a participação dos homens, não será alcançado", explica Nadal.

No mundo

Apesar de não existir nenhum país no mundo que garanta totalmente o direito reprodutivo das mulheres, o relatório divide as nações em quatro categorias que já estão mais avançadas ou menos nessa pauta.

A primeira categoria compreende os países mais desenvolvidos, como Estados Unidos, países da Europa, que têm taxa abaixo de 2,1 nascimentos por mulher.

O Brasil está no segundo grupo, em que a taxa de fecundidade está entre 1,7 e 2,5. Junto estão países latino-americanos como o Chile, países asiáticos como o Sri Lanka e países mediterrâneos, como a Turquia.

A terceira categoria compreende Bolívia, Camboja, Egito, Guatemala, Honduras, Jordânia, Quirguistão, Lesoto, Marrocos, Namíbia, Paquistão, Filipinas, Suazilândia, Tajiquistão e Turcomenistão. Nesses locais, a fecundidade está entre 2,5 e 3,9 filhos.

O último grupo é o que têm a taxa de fecundidade acima de 4 filhos por mulher. Ao todo, 43 países fazem parte e 38 se concentram apenas na África, como Nigéria e Congo.

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