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Cloroquina doada pelos EUA vira problema para os estados

Cerca de 3 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina precisam ser fracionados e o Ministério da Saúde quer que governadores assumam a despesa

Sugestão para os Estados assumirem custos do fracionamento foi feita na última sexta-feira (George Frey/Reuters)

Sugestão para os Estados assumirem custos do fracionamento foi feita na última sexta-feira (George Frey/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 21 de julho de 2020 às 12h13.

Doados pelos Estados Unidos e pela empresa Novartis ao Brasil para combate à covid-19, cerca de 3 milhões de comprimidos de hidroxicloroquina podem virar gasto extra dos Estados na pandemia. A droga precisa ser fracionada e o Ministério da Saúde quer que governadores assumam a despesa - ou seja, o "agrado" do presidente Donald Trump a Jair Bolsonaro acabou por se tornar, na visão de gestores locais, um "presente de grego".

Como as drogas entraram no País em frascos com 100 comprimidos, será preciso separar a dose exata indicada para pacientes do novo coronavírus - e, além disso, embalar o produto em caixa específica. O medicamento não pode ter contato com o meio externo e o processo precisa ser supervisionado por farmacêuticos.

A sugestão para os Estados assumirem custos do fracionamento foi feita em reunião na última sexta-feira, 17, pela equipe do ministro interino, Eduardo Pazuello. A ideia desagradou aos secretários estaduais.

Reservadamente, os gestores dos Estados lembram que a Saúde sequer deu destino para cerca de 1,2 milhão de comprimidos estocados no Laboratório do Exército. O órgão turbinou a produção da cloroquina, a pedido do presidente Jair Bolsonaro, e elaborou 3 milhões de comprimidos - o último lote, de 2016, foi de 265 mil unidades.

Também incomoda os secretários estaduais a insistência do Ministério da Saúde no tratamento com a hidroxicloroquina. Na mesma data em que informou aos gestores do SUS sobre a necessidade de fracionar o produto, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) reforçou que a droga é ineficaz para a prevenção e cura da covid-19. "A hidroxicloroquina deve ser abandonada em qualquer fase do tratamento da covid-19" , afirmou a entidade.

Procurado, o ministério confirmou que o medicamento terá de ser fracionado. Com base em orientação divulgada em maio pela Saúde, após Pazuello assumir a pasta interinamente, a ideia é separar caixas de 6 comprimidos de hidroxicloroquina de 400 mg ou, então com 12 comprimidos de 200 mg. Trata-se da dose indicada pelo ministério para o tratamento da covid-19. A Saúde afirma que a doação servirá para tratar 250 mil pacientes.

Questionado, o ministério não disse quanto deve custar aos Estados o fracionamento da cloroquina. Segundo pessoas presentes a uma reunião sobre o tema, nem a equipe de Pazuello nem secretários estaduais sabem qual será o valor exato desse gasto.

"O ministério continua insistindo em orientações de dose e posologia do medicamento sem nenhuma comprovação e base científica. Cada vez mais vão se acumulando estudos mostrando a falta de eficácia", afirma o médico, advogado sanitarista e pesquisador da USP Daniel Dourado. Para ele, criar uma "bula paralela" do medicamento, registrado no Brasil apenas contra doenças como malária, é uma infração sanitária.

Em nota, o Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass) disse que "não há racionalidade em defender o uso desses produtos dentro de uma política pública de medicamentos, muito menos para uso de forma precoce".

A Anvisa deve aprovar hoje, em reunião da diretoria colegiada, uma orientação sobre o fracionamento e a distribuição da droga. Os 3 milhões de comprimidos foram fabricados pela Novartis, sendo que 2 milhões foram doados pelo governo de Donald Trump, em 31 de maio, e 1 milhão pela própria farmacêutica. O medicamento elaborado por essa empresa não tem registro no Brasil. A Novartis disse que "não endossa" o uso de nenhum dos seus produtos fora das especificações. E reforça que "qualquer início e interrupção de uso de medicamentos deve ser avaliado em conjunto com um profissional de saúde". As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.

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