Brasil

Caso Marielle: começa nesta quarta o julgamento de Ronnie Lessa e Élcio de Queiroz

MP afirma que pedirá pena de 84 anos para os dois executores do assassinato, apesar de acordo de delação premiada

Agência o Globo
Agência o Globo

Agência de notícias

Publicado em 30 de outubro de 2024 às 06h33.

Última atualização em 30 de outubro de 2024 às 06h39.

Tudo sobreMarielle Franco
Saiba mais

Faz mais de seis anos que a vereadora Marielle Franco (PSOL) e o motorista Anderson Gomes foram assassinados. Na quarta-feira, 14 de março de 2018, o carro em que os dois estavam foi abordado no bairro do Estácio. Marielle foi atingida por quatro tiros na cabeça e morreu na hora. Na linha de tiro, Anderson também foi baleado e não resistiu. A única sobrevivente foi a assessora Fernanda Chaves, atingida por estilhaços. Hoje começam a ser julgados os ex-policiais militares Ronnie Lessa — que admitiu ser o autor dos disparos — e Élcio Queiroz — que confessou ter dirigido o veículo usado no ataque. Durante o júri popular, o Ministério Público do Estado do Rio (MPRJ) buscará a pena máxima de 84 anos para cada um dos réus. Caberá a sete jurados do Conselho de Sentença decidir pela condenação ou pela absolvição.

O pedido pela pena máxima será feito pela Promotoria durante o julgamento no IV Tribunal do Júri, apesar de o acordo de colaboração, assinado por Lessa e Queiroz, prever uma unificação de sentenças, com uma pena total entre 20 e 30 anos de prisão.

Quem foi Marielle Franco? Conheça a trajetória da ex-vereadora

‘Júri é soberano’

Como o júri não precisa considerar a delação premiada, os jurados vão deliberar considerando as qualificadores e as atenuantes apresentadas pela acusação e pela defesa. O advogado criminalista Taiguara Libano Soares, professor de Direito Penal da Universidade Federal Fluminense (UFF) e do Ibmec-RJ, explica que o júri é soberano e não está vinculado ao acordo de colaboração firmado pelos réus com a Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República (PGR) e homologado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

"O júri pode reconhecer as qualificadoras e os agravantes que poderiam resultar em uma pena extremada. Porém, a meu ver, o juiz tem um vínculo com o acordo homologado. Então, no fim, ele confirmará a condenação do júri, se for o caso, mas deve aplicar a pena no limite previsto no acordo de delação", avalia.

No julgamento, a defesa dos réus pedirá redução da pena, considerando a confissão do crime. Lessa e Queiroz estão presos desde 12 de março de 2019, pouco antes de os homicídios completarem um ano.

O MPRJ não quis se manifestar sobre a possibilidade de o pedido de pena máxima contrariar o que foi acordado na delação. Os termos da colaboração premiada estão sob sigilo.

Delação premiada

Ao confessar o crime em depoimento à Polícia Federal, Lessa indicou como mandantes do assassinato de Marielle os irmãos Domingos e Chiquinho Brazão — conselheiro do Tribunal de Contas do Estado (TCE-RJ) e deputado federal (sem partido-RJ), respectivamente. Já o ex-chefe da Polícia Civil e delegado Rivaldo Barbosa foi acusado de barrar investigações contra eles. Os três foram presos em março deste ano, mas todos negam qualquer participação.

O processo em que os supostos mandantes são investigados está no STF, que começou a ouvir na semana passada os envolvidos no caso. Em seus depoimentos, Domingos Brazão e o delegado Rivaldo Barbosa tentaram colocar em xeque a delação de Lessa e apontaram o ex-vereador Cristiano Girão como o mandante do crime. O político nega a acusação.

O conselheiro do TCE afirmou que foi incriminado na delação porque Lessa quer proteger Girão, que seria seu “comparsa”. Ele também disse que o ex-policial só fez a delação depois de Queiroz, por ter se sentido “acuado, encurralado”. As questões relacionadas aos mandantes e à motivação do crime devem ficar restritas ao julgamento do STF, que é o foro adequado já que há o envolvimento de um deputado federal. Assim como não devem ser tratadas as acusações contra Girão.

O julgamento que começa hoje será presidido pela juíza Lucia Glioche, titular do IV Tribunal do Júri. Os réus vão participar por videoconferência: Lessa, a partir do Complexo Penitenciário de Tremembé, em São Paulo; e Queiroz, do Complexo da Papuda, presídio federal em Brasília. Eles respondem por duplo homicídio triplamente qualificado (motivo torpe, emboscada e recurso que dificultou a defesa da vítima) e pela tentativa de homicídio contra Fernanda Chaves.

Se condenados, os ex-PMs já serão afetados por uma decisão tomada mês passado pelo STF. A Corte determinou que é possível a execução imediata da pena da pessoa condenada pelo tribunal do júri, mesmo que ela ainda possa recorrer a outras instâncias na Justiça.

Para a família, uma etapa

Como ainda há o processo que tramita no STF, a mãe de Marielle, Marinete da Silva, e a irmã da vereadora e ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco, destacaram que este julgamento é apenas uma das etapas para punir os envolvidos no crime.

"É uma expectativa muito grande. Depois de seis anos e sete meses, nós vamos ter justiça, e nós precisamos de uma justiça digna na condenação desses homens, que são réus confessos. Temos nos mobilizado enquanto família até hoje, enquanto instituto, sociedade, para termos isso", disse Marinete, em entrevista ao programa “Encontro com Patricia Poeta”, da TV Globo.

A mãe da parlamentar falou dos anos de busca por respostas e a surpresa com a revelação da participação de Rivaldo Barbosa. O delegado esteve à frente do caso no início das investigações. Dias depois do crime, ele chegou a se encontrar com a família de Marielle na casa em que viviam para falar sobre o compromisso que assumia na solução do assassinato. A prisão do ex-chefe da Polícia Civil em março deste ano, quando também foram levados à cadeia os irmãos Brazão, surpreendeu a todos, lembra Anielle:

"Tem as imagens dele sentado ao lado dos meus pais, e ele falava para os meus pais: “Faço questão, uma questão de honra, a gente vai desvendar”", lembrou a ministra. "Pra gente, naquele 25 de março, se não me falha a memória, num domingo, foi a maior surpresa, mas também a maior decepção. Porque a gente espera por justiça. Rever essas imagens me embrulha o estômago".

A viúva do motorista Anderson Gomes, Ágatha Reis, também falou sobre o julgamento e como foram os últimos seis anos sem o marido, tendo que viver a maternidade — o filho Arthur tinha 1 ano e 10 meses na época da morte do pai.

"Me peguei pensando em tudo o que aconteceu nesses últimos seis anos. Não só o tempo que levamos buscando justiça pelo Anderson e pela Marielle, mas também a pressão que a gente teve que fazer muitas vezes, toda a caminhada que foi necessária para chegar até aqui, chegar até o júri".

Acompanhe tudo sobre:Marielle Franco

Mais de Brasil

São Paulo tem 88 mil imóveis que estão sem luz desde ontem; novo temporal causa alagamentos

Planejamento, 'núcleo duro' do MDB e espaço para o PL: o que muda no novo secretariado de Nunes

Lula lamenta acidente que deixou ao menos 38 mortos em Minas Gerais: 'Governo federal à disposição'

Acidente de ônibus deixa 38 mortos em Minas Gerais