Brasil

Bolsonaro diz não acreditar que desigualdade salarial exista

O que não faltam, porém, são dados oficiais de diversas organizações para ajudar a esclarecer Jair Bolsonaro quanto à desigualdade entre homens e mulheres


	Jair Bolsonaro: "Eu mesmo não acredito que isso ainda ocorra", disse o deputado sobre a desigualdade salarial entre homens e mulheres
 (Reprodução/Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

Jair Bolsonaro: "Eu mesmo não acredito que isso ainda ocorra", disse o deputado sobre a desigualdade salarial entre homens e mulheres (Reprodução/Luis Macedo/Câmara dos Deputados)

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Da Redação

Publicado em 8 de março de 2016 às 21h53.

São Paulo - Recém-filiado ao PSC, o deputado federal Jair Bolsonaro (RJ) foi instado pela sigla a reafirmar ou não algumas posições pessoais na semana passada.

Em entrevista ao site oficial do partido, o parlamentar falou, por exemplo, do que acha de ser considerado machista, sobretudo por uma declaração que deu ao jornal gaúcho Zero Hora, em dezembro de 2014, falando sobre a desigualdade salarial entre homens e mulheres no país.

Não se recorda? Leia abaixo:

“Eu sou liberal. Defendo a propriedade privada. Se você tem um comércio que emprega 30 pessoas, eu não posso obrigá-lo a empregar 15 mulheres. A mulher luta muito por direitos iguais, legal, tudo bem. Mas eu tenho pena do empresário no Brasil, porque é uma desgraça você ser patrão no nosso País, com tantos direitos trabalhistas. Entre um homem e uma mulher jovem, o que o empresário pensa? ‘Poxa, essa mulher tá com aliança no dedo, daqui a pouco engravida, seis meses de licença-maternidade...’. Bonito pra c..., pra c...! Quem que vai pagar a conta? O empregador. No final, ele abate no INSS, mas quebrou o ritmo de trabalho. Quando ela voltar, vai ter mais um mês de férias, ou seja, ela trabalhou cinco meses em um ano”.

E não foi só:

“Por isso que o cara paga menos para a mulher! É muito fácil eu, que sou empregado, falar que é injusto, que tem que pagar salário igual. Só que o cara que está produzindo, com todos os encargos trabalhistas, perde produtividade. O produto dele vai ser posto mais caro na rua, ele vai ser quebrado pelo cara da esquina. Eu sou um liberal, se eu quero empregar você na minha empresa ganhando R$ 2 mil por mês e a Dona Maria ganhando R$ 1,5 mil, se a Dona Maria não quiser ganhar isso, que procure outro emprego! O patrão sou eu”.

Quase dois anos depois e com a meta de ser candidato à Presidência da República em 2018, Bolsonaro procurou ‘esclarecer’ essa polêmica.

“Eu dei uma declaração para um jornal e ela foi modificada. Bem, o que eu falei foi que hoje em dia a mulher ganha a mesma coisa que um homem. Se você presta um concurso público ou concorre a um cargo público qualquer, sendo um homem ou uma mulher, o salário é o mesmo”.

Quase ‘pediu desculpas’, não é? Bem, ele continuou:

“Na iniciativa privada, se alguém ainda acredita que existe uma diferenciação salarial, que essa pessoa apresente um projeto de lei para corrigir essa injustiça. Eu mesmo não acredito que isso ainda ocorra. Você acha que vou concordar com a ideia de pagar menos para a mulher só por ela ser mulher? Não, isso não é comigo. Sendo mulher ou homem, tendo competência para exercer a função, que seja remunerado de forma compatível e justa”.

Ainda no que diz respeito às mulheres brasileiras, Bolsonaro reforçou ser contrário ao aborto (“com tantos métodos contraceptivos por aí, ainda temos que falar em aborto? Inclusive, temos um projeto que permite a laqueadura e vasectomia a partir dos 18 anos de idade. Portanto, é claro que sou contra o aborto”), e contra o casamento gay (“para fins de proteção do Estado, a Constituição reconhece a união entre um homem e uma mulher como entidade familiar. Se alguém quiser apresentar uma Proposta de Emenda Constitucional para mudar isso e conseguir votos suficientes para aprová-la, ok, mas meu voto será contra").

Criador de ‘pérolas’, Bolsonaro ainda falou de outros temas, como segurança (“quando se fala em segurança, você não pode ter pena de bandido, achar que ele tem outra chance. Porque se você dá a segunda chance pra bandido, ele mata teu filho”) e da descriminalização da maconha (“o que você acha de um moleque fumando maconha na sala de aula? A informação que eu tive de uma pessoa do Uruguai é que, com a liberação das drogas, elas foram para dentro da sala de aula. Se depender de mim, tem liberação de droga nenhuma”).

Por ora, o deputado do PSC não indicou que vá se tornar evangélico. Quanto a 2018, “isso vai depender da aceitação da população em torno do meu nome”, afirmou.

“Se eu conseguir apoio suficiente, tenho legenda. Se não tiver, faremos o melhor para o partido. Eu sou apenas um recruta nessa briga de generais”.

Dados para Bolsonaro

Neste 8 de março, Dia Internacional da Mulher, o que não faltam são dados oficiais de diversas organizações para ajudar a esclarecer Jair Bolsonaro quanto à desigualdade entre homens e mulheres.

Dados do Ministério do Trabalho, colhidos junto à Relação Anual de Informações Sociais (RAIS), mostram que a participação das mulheres no mercado de trabalho passou de 42,79% em 2013 para 43,25% em 2014, o que correspondeu a 493 mil novos postos de trabalho.

Todavia, os rendimentos médios das trabalhadoras ainda são menores quando comparados aos dos homens com mesmo nível de escolarização: em 2014 a média de ganho masculina correspondia a R$ 2,6 mil, e a das mulheres a R$ 2,1 mil.

“Esta relação desigual não se justifica, a não ser por uma questão cultural e sociologicamente equivocada, mas o Ministério do Trabalho reforça a equiparação no mercado de trabalho, contribuindo para consolidar o verdadeiro papel da mulher neste mercado”, diz a superintendente substituta da Secretaria Regional do Trabalho do Estado de São Paulo (SRTE-SP), Vilma Dias.

Já a Organização Internacional do Trabalho (OIT) lançou nesta terça-feira o levantamento Mulheres no Trabalho: Tendências de 2016, o qual examinou dados de 178 países.

A conclusão é de que a desigualdade entre homens e mulheres persiste em um amplo espectro do mercado de trabalho global.

Além disso, o relatório mostra que, durante as duas últimas décadas, progressos significativos realizados pelas mulheres na educação não se traduziram em melhorias comparáveis nas suas posições de trabalho.

Em nível global, a disparidade de gênero com relação a empregos tem diminuído por apenas 0,6 pontos percentuais desde 1995, com uma relação emprego-população de 46% para as mulheres e quase 72% para os homens em 2015.

Não é só: as mulheres continuam trabalhando mais horas por dia do que os homens, tanto no trabalho remunerado quanto no não remunerado.

Nos países de alta e de baixa renda, em média, as mulheres realizam pelo menos duas vezes e meia mais trabalho doméstico não remunerado e trabalho relacionado a cuidados do que os homens.

Em termos de salários, os resultados do relatório confirmam estimativas anteriores da OIT de que, globalmente, as mulheres ainda ganham, em média, 77% do que ganham os homens.

O relatório observa que essa diferença salarial não pode ser explicada unicamente por diferenças de educação ou idade.

Esta diferença pode estar relacionada com a desvalorização do trabalho realizado pelas mulheres e das competências necessárias em setores ou profissões dominadas por mulheres, a discriminação e a necessidade das mulheres interromperem as suas carreira ou reduzirem as horas de trabalho remunerado para cumprir responsabilidades adicionais de cuidados, tais como cuidados de crianças.

Embora tenha havido uma pequena melhora na redução das diferenças salariais por gênero, se as tendências atuais prevalecerem, o relatório confirma estimativas de que seriam necessários mais de 70 anos para acabar completamente com a disparidade salarial de gênero.

“Alcançar a igualdade de gênero no trabalho, em linha com a Agenda de Desenvolvimento Sustentável da ONU para 2030 , é uma condição essencial para a realização do desenvolvimento sustentável que não deixa ninguém para trás e garante que o futuro do trabalho seja um trabalho decente para todas as mulheres e homens”, afirma Shauna Olney, Chefe do Departamento de Gênero, Igualdade e Diversidade da OIT.

Espera-se que, se for mesmo postulante à Presidência da República em 2018, que Jair Bolsonaro no mínimo atualize os seus conhecimentos sobre a desigualdade entre homens e mulheres no mercado de trabalho.

Não é mito: elas existem e precisam ser combatidas.

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