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Bendine e Odebrecht acertaram propina na sede do BB, em SP

A pista sobre o encontro na Paulista foi localizada no Outlook de Odebrecht, que chama Bendine pelo apelido "Dida"

Polícia Federal: reconstituiu todos os passos de Bendine desde junho de 2014 (Sergio Moraes/Reuters)

Polícia Federal: reconstituiu todos os passos de Bendine desde junho de 2014 (Sergio Moraes/Reuters)

EC

Estadão Conteúdo

Publicado em 28 de julho de 2017 às 12h39.

Última atualização em 28 de julho de 2017 às 12h45.

A força-tarefa da Operação Cobra, 42ª fase da Lava Jato deflagrada nesta quinta-feira, 27, reconstituiu todos os passos do ex-presidente do Banco do Brasil e da Petrobras, Aldemir Bendine, desde junho de 2014, quando supostamente ele deu início ao seu objetivo de tomar propina da Odebrecht.

A investigação mostra que Bendine se reuniu com o empresário Marcelo Odebrecht na sede do Banco do Brasil, que fica no mesmo prédio ocupado pelo escritório da Presidência da República em São Paulo, na Avenida Paulista.

A pista sobre o encontro na Paulista foi localizada no Outlook de Odebrecht, que chama Bendine pelo apelido 'Dida' - na planilha de propinas da empreiteira, Bendine era 'Cobra'.

Inicialmente, segundo o Ministério Público Federal, Bendine exigia R$ 17 milhões da empreiteira, valor equivalente a 1% de uma dívida da companhia junto ao BB. Na ocasião, a instituição financeira era dirigida por Bendine.

Em delação premiada, o executivo Fernando Reis, da Odebrecht, informou que agendou 'um primeiro encontro' com o publicitário André Gustavo Vieira Júnior - apontado como 'operador' de Bendine -, no Hotel Mercure São Paulo Jardins (Alameda Itu, 1151, Jardins, em São Paulo.

O encontro ocorreu no dia 23 de junho de 2014.

Reis contou que 'já neste primeiro encontro, André Gustavo, após dizer que falava em nome do então presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, relatou que o Grupo Odebrecht possuía uma agenda com o Banco do Brasil e demonstrou, de fato, conhecer detalhes, pois narrou três processos de crédito que as empresas do grupo tinham junto ao banco'.

Os processos se referiam a um crédito de R$ 600 milhões para o Estaleiro Enseada Paraguaçu, outro de 150 milhões para financiar a aquisição da EGF (processo de privatização em Portugal) e o terceiro de R$ 2,9 bilhões para a Odebrecht Industrial.

O executivo afirmou que André Gustavo 'claramente tinha a intenção de negociar uma 'comissão' sobre todas essas operações, mas os créditos relativos à EGF e ao Estaleiro não avançaram e as conversas evoluíram apenas em relação ao crédito da Odebrecht Agroindustrial'.

À época, a Odebrecht Agro negociava com o BB o alongamento de dívida vincenda - rolagem de R$ 1,7 bilhão -, além de nova rolagem, ao final da safra 2015/2016, de dívidas que venceriam no começo da safra 2016/2017.

Reis disse, ainda, que anteriormente ao encontro, 'não sabia das ligações' entre André Gustavo e Bendine. "Mas a riqueza de detalhes com que ele (André) apresentou a agenda do Grupo Odebrecht com o Banco do Brasil e as informações que ele trouxe sobre a relação da empresa com o então ministro da Fazenda Guido Mantega demonstraram que André Gustavo era, de fato, representante de Bendine."

Os investigadores descobriram que houve um novo encontro entre Reis e o suposto operador de Bendine no térreo do Hotel Excelsior, na Avenida Atlântica, 1800, Copacabana, Rio, onde André Gustavo estava hospedado.

"Na ocasião, André Gustavo teria insistido no pagamento da propina para Bendine e, após reiterada negativa de Fernando Reis, teria dito que tudo poderia ser resolvido com um valor correspondente a 1% do crédito negociado, o equivalente a R$ 17 milhões", afirma a força-tarefa da Lava Jato no pedido de prisão preventiva do ex-presidente do BB e da Petrobras.

Segundo a investigação, Marcelo Odebrecht decidiu que o grupo não iria pagar a propina solicitada por Bendine 'enquanto presidente do Banco do Brasil, pois não acreditava na influência deste sobre a equipe e os trâmites técnicos do banco'.

"Ademais, levantamento realizado por funcionários da Odebrecht Agroindustrial indicava que a tramitação do processo de liberação de crédito transcorria normalmente na área técnica do Banco do Brasil, sem que Aldemir Bendine tivesse qualquer interferência", sustenta o Ministério Público Federal.

A decisão do empreiteiro foi comunicada por Fernando Reis a André Gustavo em reunião no dia 16 de dezembro de 2014 na residência do publicitário em Brasília, no Lago Sul. Os investigadores conseguiram o registro de viagem de Reis para Brasília, naquele dia.

Pouco tempo depois, a então presidente Dilma escolheu Bendine para a presidência da Petrobras.

"Em razão dessa nova condição, (Bendine) teria vislumbrado a oportunidade de reencaminhar com mais efetividade a solicitação de propina feita à Odebrecht, uma vez que agora teria mais poderes para atuar de modo escuso no interesse do grupo econômico, que ao tempo receava os avanços da Operação Lava Jato e estava cautelarmente impedido de contratar com a Petrobras", assinala a força-tarefa.

Reis disse aos investigadores que, mesmo antes de ser noticiada a nomeação de Bendine para a Petrobras, recebeu 'de André Gustavo antecipando e confirmando a notícia, mostrando sua relação com Aldemir Bendine e a ascensão do mesmo na hierarquia de poder, sendo homem próximo e de confiança da presidente Dilma'.

Os investigadores destacam que Bendine convocou uma reunião, no dia 26 de janeiro de 2015, entre Fernando Reis e Marcelo Odebrecht. "Bendine já se valia de sua futura, porém certa, assunção do cargo de presidente da Petrobras para solicitar vantagens indevidas."

Segundo a investigação, Bendine convocou a reunião para 'em verdadeiro merchandising de seus futuros atos de ofício, tratar especificamente da incumbência e dos poderes que teria em seu novo cargo de amenizar os efeitos da Operação Lava Jato sobre as empresas investigadas, como uma forma de evitar potenciais delações'.

Ao fim da reunião, Bendine 'teria espontaneamente mencionado que o empréstimo do Banco do Brasil à Odebrecht Agroindustrial já estava em vias de aprovação, possivelmente como forma de transmitir o recado de que ele não havia esquecido da recusa do Grupo em lhe pagar a vantagem indevida referente ao empréstimo e reforçar que sua cooperação como presidente da Petrobras dependeria do pagamento da propina que lhe fora negada enquanto presidente do Banco do Brasil'.

A reconstituição dos passos de Bendine chegou ao ponto culminante, o encontro no prédio da Presidência da República em São Paulo.

Marcelo Odebrecht, em delação premiada, disse. "Bom, já estava no Banco do Brasil, ops desculpe, o Bendine tinha saído do Banco do Brasil, tinha ido para a Petrobras, a gente topou com a figura, a gente estava cheio de problema a esta altura, a Lava Jato tinha começado, a Petrobras tinha começado a fazer aquelas glosas, tinha bloqueado as empresas, entendeu, e, o mais grave, é, eu vou comentar um pouco isso lá na obstrução de justiça, mas, uma certa feita, uma reunião que eu tive com a Presidente, eu perguntei, Presidenta, quem é que, nesse assunto Lava Jato, tá criando várias dificuldades, inclusive quem é que pode ser o nosso interlocutor junto ao governo pra todo esse tema, os empréstimos travados, Petrobras com vários problemas... E ela diz, olha, fale com o Mercadante. É, eu até enviei uma nota para o Mercadante, sobre os temas que estavam gerando a confusão na Lava Jato, é, e, eu mandei para Mercadante, falei com Mercadante, mas logo depois eu tive esta reunião com o Dida, é uma reunião com o Dida ele já estava, ele ainda estava na sede do Banco do Brasil, mas já tinha sido nomeado Presidente da Petrobras, ou seja, foi uma reunião nesse ínterim, e aí, ele já estava, olhe... foi em janeiro, eu não tenho certeza se ele já estava, já tinha sido nomeado, mas nessa reunião não se falou nada do achaque, só que ele já trouxe a questão, por isso que eu queria trazer este ponto, ele já trouxe a questão, a mesma nota que eu tinha enviado para Mercadante, ele tinha trazido para esta reunião. Ele não mencionou que tinha recebido de Mercadante, mas ele trouxe a mesma nota, essa nota só tinha ido para Mercadante, e ele recebeu de Mercadante. Então, de fato ele se colocou, sem dizer que tinha sido definido por isso, olha, eu fui encarregado de ver com vocês quais são os problemas que está havendo. É, eu não me recordo agora se ele já tinha sido, nessa época, mais é fácil perceber, se nessa data de janeiro, se já tinha sido nomeado Presidente novo do Banco do Brasil. Bom"

A Procuradoria da República assinala que 'há registro de tal reunião no Banco do Brasil, Avenida Paulista, 2163, 18º andar - entrada da garagem pela Rua Augusta, 1788, na agenda Outlook de Marcelo Odebrecht'.

Depois do encontro do empreiteiro com Bendine na Paulista, tiveram andamento as negociações sobre a propina, reduzida para R$ 3 milhões, segundo a investigação.

Já na condição de presidente da Petrobras, Bendine e André Gustavo se encontraram com Fernando Reis, em meados de fevereiro de 2015, no térreo do Hotel Windsor Atlântica - Avenida Atlântica, 1020 - Copacabana, Rio. Bendine disse que estava hospedado no Windsor.

"Na oportunidade, Aldemir Bendine teria questionado Fernando Reis sobre a agenda do Grupo Odebrecht junto à Petrobras, querendo entender os assuntos, dizendo que 'entraria para resolver as questões importantes'.

Considerando, porém, que os assuntos específicos da área de Fernando Reis não eram relevantes, Bendine teria pedido que o colaborador promovesse um encontro com Marcelo Odebrecht", assinala a força-tarefa.

Entre o final de abril e início de maio de 2015, mais um encontro. Reis almoçou com André Gustavo no restaurante Rodeio do Shopping Iguatemi em São Paulo.

Na ocasião, o operador de Bendine propôs mais uma vez uma reunião com Odebrecht e o já presidente da Petrobras. Segundo a força-tarefa foi retomada "a solicitação do 'pedágio' feita pelo então presidente da Petrobras".

O novo encontro ocorreu na residência de André, no Lago Sul, em Brasília. Ali, Odebrecht e Bendine ajustaram os pagamentos. O compromisso consta na agenda Outlook de Marcelo Odedbrecht e foi mencionado em conversa de e-mail dele com Fernando Reis.

Em viagem de retorno de Brasília a São Paulo, Reis e o empreiteiro 'concluíram que, para evitar um desgaste na relação e eventuais represálias, deveriam ceder parcialmente à solicitação de propina efetuada por Bendine para 'reduzir a pressão' e manter aberto o canal de comunicação por intermédio de André Gustavo, que poderia vir a ser útil no futuro'.

Assim, Reis combinou com André Gustavo o pagamento de R$ 3 milhões, o qual foi operacionalizado sob o codinome 'Cobra', pelo Setor de Operações Estruturadas, o famoso departamento de propinas da empreiteira.

'Cobra' era o codinome de Bendine, segundo a planilha de pagamentos ilícitos da Odebrecht.

A propina foi repassada em três parcelas, enfim, todas em dinheiro vivo, de R$ 1 milhão cada - nos dias 17 e 24 de junho e 1º de julho de 2015, no apartamento 43 da rua Sampaio Viana, 180, Edifício Option Paraíso, em São Paulo, alugado pelo irmão de André Gustavo, Antonio Carlos, que também foi preso na Operação Cobra da Lava Jato.

Defesa

Em nota a assessoria do ex-ministro-chefe da Casa Civil Aloizio Mercadante afirma que:

"Como já explicado em nota anterior, o então ministro-chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, não recebeu nenhum empresário, diretor ou representante de qualquer empresa para tratar de assuntos relacionados à Operação Lava Jato.

No início de 2015, a chefia de gabinete da Presidência solicitou à Casa Civil que recebesse o Sr. Marcelo Odebrecht, que já estava no Palácio do Planalto e que manifestou grande preocupação com a situação econômico-financeira da empresa.

A Petrobras havia aplicado o bloqueio cautelar administrativo de 23 fornecedoras, incluindo o grupo Odebrecht, citadas na Operação Lava-Jato.

Na ocasião, esse empresário apresentou um texto técnico - jurídico, que embasava o recurso administrativo junto à Petrobras, porque o bloqueio cautelar não estava ancorado em decisão judicial.

Ele manifestou também suas preocupações com a Lei Anticorrupção e respectiva regulamentação, que poderia ampliar essa atitude para toda a administração pública, prefeituras e estados, envolvendo todas as empresas do grupo, mesmo as que não eram investigadas, ameaçando a estabilidade financeira da empresa e o emprego de 150 mil trabalhadores.

E, principalmente, pediu urgência nos acordos de leniência, tendo como resposta que não era possível, pois envolvia uma regulamentação e negociação bastante complexa entre CGU, TCU, PGR, RF, MJ, PF, entre outros.

Não cabia ação específica do governo em relação à decisão da Petrobras e o recurso administrativo foi encaminhado para o novo presidente Aldemir Bendine, sendo que já haviam recursos semelhantes de outras empresas contra esta decisão protocolados junto à Petrobras e na Justiça.

Durante a gestão de Mercadante na Casa Civil não foi concluída a regulamentação da Lei Anticorrupção e os marcos legais para os acordos de leniência.

Conforme foi amplamente divulgado pela imprensa na época, a gestão do então ministro na Casa Civil foi fortemente atacada exatamente por não interferir ou "estancar a sangria" da Operação Lava Jato.

Importante ressaltar que a própria Polícia Federal e a Procuradoria-Geral da República não constataram qualquer irregularidade nesse encontro, que faz parte das atribuições legais da Casa Civil da Presidência da República.

Tanto que não solicitaram qualquer iniciativa em relação à participação do ex-ministro nesse episódio."

Os advogados de Bendine - criminalistas Pierpaolo Bottini e Cláudia Vara San Juan Araújo - informaram a Moro que no dia 7 de julho entregaram petição à Procuradoria da República em que o ex-presidente da Petrobras abriu espontaneamente seu sigilo bancário e fiscal, disponibilizando as cópias de suas Declarações de Imposto de Renda Pessoa Física referentes aos anos de 2011 a 2016. Também disponibilizou extratos e demonstrativos bancários dos últimos cinco anos.

A defesa afirma também que no comando da estatal petrolífera, Bendine empreendeu 'importantes mudanças na governança da Companhia, com a criação de um rígido e sólido programa de compliance, antes inexistente e, ainda, com a realização de sensíveis alterações na forma de tomada de decisões: foram abolidas as deliberações individuais, passando-se a priorizar-se as decisões colegiadas, em camadas e por alçadas, a exemplo do que ocorria no Banco do Brasil durante sua gestão'.

A defesa sugere que o suposto rigor de Bendine atingiu inclusive a Odebrecht, cujo ex-presidente é um dos delatores do ex-mandatário da Petrobas.

O advogado Ademar Rigueira, que defende os publicitários André Gustavo Vieira e Antônio Carlos Vieira, afirmou nesta quinta-feira, 27, que André não se furtou a colaborar desde o início. "Ele se coloca a disposição em completo respeito à decisão. A relação mesmo de mérito foi um negocio feito com a Odebrecht, foi procurado pela Odebrecht, se colocou para resolver um problema, resolveu e cobrou os honorários", disse.

Segundo Rigueira, ele tem "uma relação de conhecimento, de amizade com o ex-presidente do Banco do Brasil, foi colocado para ele um problema, ele se prontificou a ajudar, identificou qual era o problema, levou para Odebrecht e o corpo técnico do Banco do Brasil solucionou o impasse".

"Já houve auditoria do Banco do Brasil que comprovou que tudo foi feito dentro da legalidade. Ele apenas facilitou os trâmites legais. Ele não é economista, não deu parecer. Mas ele resolveu a identificar o problema e facilitar um diálogo com a Odebrecht e cobrou por isso", disse.

Sobre Antônio Carlos Vieira, o advogado afirmou que:

"A relação que se fala do apartamento em que foi feito um pagamento, que ele era o locatário de um apartamento em São Paulo que servia a ele e ao irmão André Gustavo, e um pagamento foi feito lá. Não tem nenhuma vinculação. Ele não é citado em nenhum momento se fala no nome dele. Nem os delatores da Odebrecht, nem nenhuma outra pessoa. Isso para mim é uma grande injustiça, uma pessoa presa sem qualquer vinculação com isso", esclareceu.

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