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Batista, do Cenpec: desigualdade na educação tem se agravado

Especialista em educação fala sobre o modelo que permitiu que alguns estados melhorassem a qualidade do ensino

Antônio Batista, do Cenpec: "o Plano Nacional de Educação virou papel" (Cenpec/Divulgação)

Antônio Batista, do Cenpec: "o Plano Nacional de Educação virou papel" (Cenpec/Divulgação)

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Carolina Riveira

Publicado em 22 de setembro de 2017 às 17h06.

Última atualização em 22 de setembro de 2017 às 17h06.

Concluir o ensino médio parece um passo natural na trajetória escolar, mas não é para boa parte dos jovens brasileiros. De cada 10 jovens entre 15 a 17 anos, idade ideal para cursar esta etapa, somente seis estão matriculados regularmente, segundo o IBGE. Acima dos 25 anos, menos da metade (43,7%) da população concluiu os estudos. Nos países da OCDE, essa média é 80%. O cenário é preocupante.

Em busca de soluções, o Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec) analisou as políticas de quatro estados que se destacaram por terem os maiores avanços nos resultados do Ensino Médio: São Paulo, Ceará, Goiás e Pernambuco. Os resultados foram publicados no livro Políticas para o Ensino Médio e desigualdades escolares e sociais, baseado numa pesquisa que contou com equipes em todos os estados.

Em entrevista a EXAME, o coordenador do estudo, Antônio Batista, apontou que, apesar dos avanços, nem mesmo esses estados podem ser considerados exemplos a seguir, porque os resultados alcançados têm um teto dentro dos modelos em curso.

Os quatro estados que aparecem na pesquisa (Ceará, Pernambuco, São Paulo e Goiás) melhoram seus resultados do Ensino Médio nos últimos anos. Por que eles conseguiram avançar?

O modelo de política para Ensino Médio nesses quatro estados é muito parecido e está baseado, em primeiro lugar, em currículos muito pormenorizados, que chegam até a definir o que se vai fazer em cada aula. Ao mesmo tempo, um outro traço em comum é que eles têm sistemas de monitoramento muito fortes. É tudo parte de um estabelecimento de metas muito claras que precisam ser alcançadas. Também verificamos que existem as avaliações em larga escala, que são muito fortes e orientam a ação dos gestores nesses quatro estados, sempre acompanhadas de bonificações. É o que chamamos de gestão por resultados. Ao concluir o estudo, ficamos com a hipótese de que esse modelo foi o grande responsável pela elevação dos indicadores. Mas ele tem uma limite. Estados que começaram essa política mais cedo, como São Paulo, estão estagnados nas avaliações. Do ponto de vista de políticas focalizadas, todos os estados estudados são meritocráticos, e as políticas educacionais, na maior parte das vezes, não vêm ajudando a reduzir desigualdades.

A pesquisa mostra o ensino integral como um ponto em comum entre os Estados que tiveram bons resultados. A expansão do ensino em tempo integral é, inclusive, uma das propostas da reforma do Ensino Médio aprovada no Congresso. Ao mesmo tempo, a pesquisa aponta que essa política acentua as desigualdades. Por que isso acontece?

Todos os dados mostram que o ensino integral tem um efeito muito positivo, inclusive entre alunos de nível socioeconômico mais baixo. O problema é que nós não temos políticas educacionais que garantam o financiamento necessário para a expansão da educação integral no Ensino Médio. E essa oferta concomitante do integral com o parcial está gerando desigualdade. Seria interessante que tivéssemos educação integral e semi-integral para todos, da educação básica ao Ensino Médio. Mas neste momento, não há perspectivas para que a gente tenha um financiamento adequado.

Se não há perspectivas para um financiamento adequado, sobretudo com teto de gastos e queda na arrecadação, como fazer o Ensino Médio avançar?

Precisamos de mais recursos, é claro, mas também é preciso ver onde esse investimento é prioritário. O ensino em tempo integral é muito importante, sim, porque o trabalho educativo exige tempo. E o Brasil é um dos poucos países do mundo que tem essa coisa esdrúxula de ter carga horária de quatro, cinco horas. É preciso aumentar essa carga. Mas na minha opinião, o Ensino Médio não é adequado para isso: boa parte dos problemas do Ensino Médio está na formação que o aluno recebe antes, no Ensino Fundamental. Então, neste momento, valeria mais a pena que todo o Fundamental tivesse educação integral.

Por outro lado, não é melhor ter algumas escolas de excelência do que deixar que todas as escolas sejam ruins?

Muitas pessoas deram sorte de estudar nessas escolas públicas de excelência; foram “salvas” por essas escolas. Mas há muitos outros que precisam ser salvos. Seria melhor pensar em massificar um ensino bom do que focar em um conjunto de escolas. Em Pernambuco, por exemplo, essas escolas em tempo integral já representam quase 40% do total, mas precisaríamos de mais para que as oportunidades fossem iguais para todos.

Se formos escolher a prioridade de investimento, qual deve ser?

Não dá para avançar mais sem professores bem formados. O número de ingressos na licenciatura continua grande, mas o número de professores que se formam e atuam na área cai cada vez mais, porque a profissão é pouco atraente. Primeiro, precisamos tornar essa profissão atraente, e o que faz isso são os benefícios econômicos, é claro. Mas não só isso: também são importantes os benefícios simbólicos, prestígio, valorização, boas condições de trabalho, formação continuada. Também é preciso mudar o modelo de formação. Os cursos não preparam professores para de fato dar conta de enfrentar a sala de aula. Eles saem da Universidade e vão lidar com a escola real, que é uma escola precária, com permanente dificuldade.

Além da União, o financiamento da educação também tem grande participação de Estados e municípios, mas muitos deles, como o Rio de Janeiro, estão em gravíssima situação financeira. Nesse cenário, os investimentos em educação e as metas do Plano Nacional de Educação (PNE) serão deixadas de lado? 

O problema é que, além do teto de gastos, não existe vontade política. O Plano Nacional de Educação virou papel. Num cenário ideal, precisa o governo federal bancar. Mas os Estados também devem assumir sua responsabilidade, porque nem todos os Estados estão nessa situação calamitosa do Rio – São Paulo, por exemplo, não está. A educação simplesmente não é prioridade nesse país. Não tem um verdadeiro projeto de transformação da escola pública. A desigualdade no Brasil é compreendida como algo natural. Por que pensar em desenvolvimento da escola pública se os jovens de classe média vão para a escola particular? Os alunos mais pobres estão indo para escolas que não vão garantir a eles direitos fundamentais. Vivemos num país que se baseia muito no mérito, mas que, do ponto de vista da distribuição dos bens, é extremamente aristocrático.

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