Dilma Rousseff: com desembarque de governadores estaduais para reforçar ofensiva da petista, governo afirma que ampliou vantagem no placar de domingo (Ueslei Marcelino / Reuters)
Talita Abrantes
Publicado em 16 de abril de 2016 às 08h36.
São Paulo – Em algumas horas, a Câmara dos Deputados decide o futuro do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff. Se aprovado por dois terços da Casa, a denúncia segue para o Senado – onde nova votação define a abertura de um julgamento contra a petista.
Até ontem, algumas consultorias políticas davam praticamente como certa a vitória da oposição com a aprovação do impeachment na Câmara.
No entanto, o governo de Dilma Rousseff ainda não se deu por vencido. Ontem, seis governadores estaduais que são aliados da presidente desembarcaram em Brasília (DF) para fortalecer a ofensiva da petista na Câmara. A própria Dilma Rousseff teria protagonizado algumas negociações - segundo relato do jornal O Estado de S. Paulo.
Segundo projeção da Prospectiva divulgada no meio da tarde de ontem, somando os votos declarados e a inclinação dos indecisos, a oposição já poderia contar com 346 apoios - que seria suficiente para aprovar o impeachment na Casa. E o governo com 133.
Lembrando: para a denúncia ser aceita pela Câmara são necessários 342 votos favoráveis. Para barrá-lo, bastam 172 contrários.
A debandada de partidos de peso na base aliada, como PP e PSD, contribuiu para o agravamento da maré desfavorável para a petista. Na verdade, os últimos dias foram marcados por uma sucessão de graves derrotas para a atual ocupante do Palácio do Planalto.
A derradeira aconteceu na madrugada de sexta-feira, quando a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) rejeitou uma a uma todas as ações do governo para barrar o processo pela via jurídica.
Era a última estratégia de grande impacto de uma ofensiva já desesperada. E os magistrados – 8 dos 11 escolhidos a dedo pela gestão petista em mais de uma década de poder – trataram de enterrá-la.
No entanto, essa não era a única tática do governo. Desde o desembarque coletivo das bancadas, a aposta da articulação política de Dilma foi focar nas negociações individuais com os deputados indecisos. Segundo o ministro-chefe do Gabinete Pessoal de Dilma "o reforço dos governadores surtiu efeito nas bancadas" e ampliou a vantagem do governo.
De acordo com levantamento da Prospectiva, na última sexta-feira ainda existiam 34 parlamentares que não declararam suas intenções para o domingo e nem apresentavam uma tendência clara de voto.
Com isso, em termos puramente matemáticos, tanto governo quanto oposição ainda teriam margem para angariar mais votos – e, no caso de Dilma, até virar o jogo.
O problema: “As derrotas foram tantas ao longo da semana que fica difícil você não acreditar que o governo vai perder”, afirma Thiago Vidal, coordenador do núcleo de análise política da Prospectiva. “O que o governo não conseguiu fazer em duas semanas, dificilmente, conseguiria fazer em um dia”.
“Os dois lados estão negociando e oferecendo vantagens para os deputados do centrão, que a gente poderia chamar de partidos governistas fisiológicos”, afirma Humberto Dantas, professor do Insper e consultor da 4E Consultoria, em referência a legendas como PP, PSD, PR e PTB.
Em outros palavras, para além da questão de se pedaladas são ou não crime de responsabilidade, só vai ganhar mais votos dessas legendas quem tiver mais a oferecer.
Jogo perdido?
A questão é que, desde o início do mandato de Dilma Rousseff, o governo do PT perdeu o traquejo político para ganhar o apoio das bancadas. “É um governo que, ao longo de seis anos, não deu mostra alguma de capacidade de articulação”, afirma Dantas. “[O processo de impeachment] é também uma ruptura com esse governo que não soube negociar”.
“Dilma foi um desastre porque imaginou fazer política como quem faz burocracia”, diz Roberto Romano, professor emérito de Ciências Políticas da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
O resultado se materializou em fevereiro de 2015 quando o peemedebista Eduardo Cunha, já declarado desafeto da petista, foi eleito presidente da Câmara – subvertendo inclusive o acordo de sucessão entre PT e PMDB no comando da Casa.
Nem mesmo o carisma do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pode ser capaz de aplacá-lo.
Desde março, o petista se transformou no principal ativo da coordenação política de Dilma. Mesmo sem assumir o cargo de chefe da Casa Civil, ele tem coordenado, de um hotel de luxo em Brasília (DF), a força-tarefa para impedir o impeachment.
O cenário dos últimos dias sugere que o esforço pode ter sido em vão.
“O Lula é aquele camisa 10 que passou o jogo se aquecendo, se contundiu no aquecimento e, no fim do jogo, o cara entrou e caiu”, compara o consultor da 4E.
Na opinião dos especialistas, o resultado da votação de domingo deve ser um desdobramento dessa combinação de fatores. Mesmo assim, o professor da Unicamp afirma que ainda há espaço para o imprevisível na votação de domingo.
“Uma coisa que eu aprendi nos meus 70 anos é que você não conta antes votos do eleitor, não conta antes votos do Supremo Tribunal Federal e você não conta antes votos de deputado e de senador”, afirma.
No final da tarde de sexta, por exemplo, a deputada federal Clarissa Garotinho (PR-RJ), que está grávida de 36 semanas e tinha declarado voto favorável ao impeachment, solicitou o início de sua licença-maternidade.
Com a ausência da deputada no dia da votação, o governo ganha mais um voto já que cada abstenção ou falta rende pontos para o placar de Dilma.
“O jogo no momento da votação supõe uma série complexa de negociações, de pressões e chantagens”, afirma Romano.
Nas próximas horas, termina o prazo do governo para se livrar do risco de impeachment na Câmara. A única certeza, por ora, é de que nenhum dos lados vai descansar até que o último deputado proclame seu voto no plenário.