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Anac estuda cobrança da bagagem despachada pelos passageiros

A Anac decidiu revisar as Condições Gerais de Transporte, chamadas CGTA, que são as normas da aviação civil

Bagagem em aeroporto: se a regra entrar em vigor, as companhias serão autorizadas a cobrar por qualquer volume de bagagem despachado em voos domésticos (ColorBlind Images/Thinkstock/Thinkstock)

Bagagem em aeroporto: se a regra entrar em vigor, as companhias serão autorizadas a cobrar por qualquer volume de bagagem despachado em voos domésticos (ColorBlind Images/Thinkstock/Thinkstock)

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Da Redação

Publicado em 16 de junho de 2016 às 22h33.

A Anac (Agência Nacional de Aviação Civil) decidiu revisar as Condições Gerais de Transporte, chamadas CGTA, que são as normas da aviação civil. A ideia é criar regras e derrubar outras com o intuito de atualizar a legislação do setor.

O novo documento, porém, prevê propostas polêmicas, como a possibilidade de o passageiro pagar pelas bagagens que despachar e fim da obrigação das companhias de darem assistência aos passageiros em caso de atrasos ou cancelamento de voos em território internacional.

As medidas estão sendo discutidas há anos, mas apenas em 2016 a Anac decidiu levá-las ao debate entre consumidores, órgãos de defesa ao consumidor, companhias aéreas e outras instituições do setor aéreo.

O gerente substituto de Regulação das Relações de Consumo da Anac, Thiago Diniz, explica que a intenção é deixar mais claro para o passageiro e a empresa aérea o que é e o que não é permitido. “Elas [normas] vêm sendo revisadas desde 2010”, disse. “Queremos reunir tudo numa única legislação.”

Entre centenas de artigos e resoluções, os pontos abrangem todo o processo de um voo, desde a oferta da passagem até o retorno da viagem.

Pontos controversos

Uma das mudanças mais expressivas seria no despacho das bagagens. Se a regra entrar em vigor, as companhias serão autorizadas a cobrar por qualquer volume de bagagem despachado em voos domésticos, e o limite da bagagem de mão sobe de 5 kg para 10 kg.

Em voos internacionais, a franquia de duas malas de 32 kg cairá para duas malas de até 23 kg e, a partir do segundo ano de publicação da norma, as companhias poderão estabelecer livremente sua política de bagagem, ou seja, vai ocorrer a desregulação total do serviço que hoje é obrigatório.

Segundo Thiago Diniz, da Anac, o que a agência está propondo é desobrigar o limite. “Se a empresa quiser continuar oferecendo, ela pode. A Anac só não impõe a obrigatoriedade.”

Diniz diz que a medida é necessária por já ser uma rotina padrão em muitos países e por implicar uma queda real nos preço nas passagens. Segundo ele, uma minoria utiliza o máximo da franquia e aqueles que não o utilizam acabam pagando o valor como se utilizassem. “Se você despacha 20 kg de bagagem, você está pagando por uma quantidade que não utiliza.”

Também segundo Diniz, a necessidade de bagagem é “muito particular” e pesquisas apontam que em voos longos os brasileiros costumam utilizar até metade da franquia total (de 64 quilos para voos internacionais e de 23 quilos para nacionais).

Outra proposta da Anac é a suspensão dos direitos de assistência material (comunicação, alimentação, translado e acomodação) no exterior, em casos de cancelamento ou adiamento dos voos por força maior imprevisível, como mau tempo que leve ao fechamento do aeroporto, ou por um atentado terrorista.

Os órgãos de defesa do consumidor se posicionaram contra essa medida, pois, segundo eles, os passageiros perderiam os direitos já conquistados.

"Nas relações de consumo, prevalece a responsabilidade objetiva: as empresas são responsáveis por reparar os danos sofridos pelo consumidor independentemente de culpa, como dispõe o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor”, explica a advogada do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), Claudia Pontes Almeida.

“Seria um retrocesso”, avalia Maria Inês Dolci, da Proteste Associação de Defesa do Consumidor. “Imagine em algum momento da viagem acontecer qualquer problema e a agência reguladora dizer que você arque com as despesas de hotel, alimentação e comunicação. Queremos que isso [o direito à assistência] continue.”

Em relação a atrasos, a Anac propôs que as companhias aéreas só dessem assistência aos consumidores se o problema com o voo ocorrer em território nacional.

Atualmente, a Resolução 141/2010 da Anac prevê:

"Se o atraso do voo for superior a 1 hora, a empresa aérea deve fornecer acesso à comunicação (ligações telefônica, acesso à internet etc.); se for superior a 2 horas, a companhia deve oferecer alimentação ao passageiro; e, se maior que 4 horas, deve acomodar os passageiros em local adequado, oferecer traslado e até serviço de hospedagem, se necessário, sem limitação territorial."

Mas, segundo Diniz, da Anac, as regras que estão em vigor hoje não valem para os voos internacionais.

“Importante esclarecer que hoje a Anac já não tem como controlar voos com partida fora do território nacional. Se acontece um cancelamento de voo na Argentina, a Anac não tem como fazer valer a norma brasileira”, observa.

O prazo para reembolso também gerou críticas das associações. A nova legislação proposta pela agência reguladora possibilita ao viajante desistir da passagem e ter reembolso integral até 24 horas depois da compra, desde que o bilhete tenha sido adquirido com antecedência mínima de sete dias da data do voo.

Para os órgãos, esse é outro ponto negativo, uma vez que os consumidores têm atualmente o direito de desistência de até sete dias, quando for comprado bilhete pelo telefone ou pela internet.

As companhias também podem cancelar automaticamente trechos/voos caso o passageiro não compareça ao voo de ida ou ao primeiro trecho, sem avisar a empresa duas horas antes do voo, e cobrar até 100% da passagem caso o passageiro não embarque no voo sem comunicar a companhia.

Outras regras trariam benefícios aos consumidores, como a transferência do bilhete para terceiros, nos termos do contrato de transporte, o que é proibido hoje. Também poderá ser reduzido o prazo de reembolso da passagem de 30 para sete dias, em caso de desistência do passageiro.

Outra mudança obriga a empresa a corrigir, sem cobrar, o nome do passageiro no bilhete, se estiver errado.

Preço das passagens e vinda das low cost

A principal justificativa da Anac para as mudanças é adequar as regras brasileiras às que já são padrão em grande parte do mundo. “Esperamos aumentar a transparência da relação de consumo. O passageiro ser empoderado e a companhia ter segurança jurídica”, afirma Thiago Diniz.

As propostas também serão bem-vindas ao setor em um momento de crise, com queda no número de passageiros e custos cada vez maiores.

O presidente da Abear (Associação Brasileira das Empresas Aéreas), Eduardo Sanovicz, diz que as companhias aéreas arcam com custos muito elevados e que, com as medidas, elas poderiam reduzir gastos e oferecer passagens mais baratas.

“Até 2002, o preço de um bilhete era definido pelo governo e, depois que ele começou a ser regulado pelo mercado, o preço só caiu e o número de passageiros aumentou”, disse Sanovicz. Para o executivo, medidas como o fim da franquia de bagagem vai diminuir o preço dos bilhetes.

“A franquia de bagagem está embutida [no preço]. O que ocorre é uma injustiça tarifária, ou seja, você paga por outras pessoas. Se muda a regra, você só paga pelo que vai usar.”

O gerente substituto de regulação das relações de consumo da Anac diz que a desregulação pode contribuir com a queda nos preços, o que ocorreu em todo o mundo, e tornar o Brasil um mercado atraente para companhias low cost, conhecidas por voos extremamente baratos na Europa e nos Estados Unidos.

Diniz explica que hoje as companhias de baixo custo não veem o Brasil como um mercado promissor porque elas teriam uma série de obrigações que encareceriam os preços das passagens. Assim o negócio low cost não seria nada atrativo.

Com as desobrigações, como assistência, limite de bagagem e oferta de alimentação, seria possível baixar os preços das passagens. “Estamos contribuindo com uma série de fatores para empresas de baixo custo virem para o Brasil”, disse o executivo da Anac.

“Eu nunca vi reduzir o preço para o consumidor, acho difícil”, ponderou Maria Inês Dolci, da Proteste. “Querem retirar os direitos já assegurados.”

Andamento do processo

As propostas continuam sendo discutidas pela Anac, associações e empresas. Em maio, foi aberta uma consulta pública, na qual todos puderam contribuir com críticas e observações sobre as propostas.

Segundo Diniz, a Anac recebeu mais de 1,5 mil contribuições, um número elevado em relação às outras consultas, e deverá finalizar as novas regras até o fim deste ano.

A proposta da nova CGTA tem 127 páginas e pode ser acessada clicando aqui.

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