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"Estamos recriando a indústria de tecnologia"

Em entrevista exclusiva, o CEO da Motorola, Edward J. Zander, fala sobre tendências, iPod, operadoras de telefone celular

EXAME.com (EXAME.com)

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Da Redação

Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h20.

O engenheiro Edward J. Zander, 58 anos, esteve no Brasil pela primeira vez desde que assumiu a presidência da Motorola, em janeiro do ano passado. O Brasil é o terceiro maior mercado do mundo para a empresa, daí a importância da vinda do executivo. Zander deu a seguinte entrevista exclusiva a EXAME.

Revista EXAME Como o senhor compara a indústria da telefonia celular de hoje com a de computadores 20 anos atrás?

Edward J. Zander
Em primeiro lugar, não sei se ainda é um celular. Na Motorola, gostamos de falar do aparelho que era conhecido como o celular. Estamos recriando a indústria de tecnologia. Acredito que a assimilação da tecnologia vai acontecer mais rápido com o celular do que com os computadores. E a razão é que agora temos competição. Nos PCs, tínhamos apenas a Microsoft e a Intel. Essas duas empresas controlavam o ritmo da inovação. Na indústria do celular, há muitos fornecedores, tanto de hardware como de software. Hoje em dia ninguém mais pensa num PC desconectado. Quem compra um computador quer logo se conectar à internet. O que estamos fazendo, agora, é transportar essa experiência para os nossos aparelhos. A questão é: como levar música, vídeo, e-mail, informações corporativas para esses novos dispositivos?

EXAME Não vai demorar para que os celulares possam se comunicar diretamente com a internet, por meio de tecnologias como Wi-Fi e Wimax. Isso permite, por exemplo, fazer ligações telefônicas sem usar a rede das operadoras. Como isso afeta o seu relacionamento com as empresas de telefonia?

Zander É uma boa pergunta, e não tenho a resposta para ela, a não ser afirma que a tecnologia avança. É preciso olhar para o futuro. Minha experiência nessa indústria é: não lute contra a tecnologia. Vai acontecer, cedo ou tarde. Não vi, nas últimas décadas, alguém impedir o caminho da tecnologia. Nos anos 90, houve quem tentasse parar a internet. A Microsoft disse não à internet. A Intel também. A indústria precisa entender que, dessa vez, é preciso manter os padrões abertos. Acredito que haja operadoras que entendam isso. Estive com algumas daqui. Estamos falando de aparelhos capazes de usar a rede celular e a internet. Ainda faltam muitos anos para que a internet sem fio tenha abrangência. Com o Wi-Fi você consegue cobrir um prédio. O padrão 80216 (Wi-max) tem uma cobertura que se estende por quilômetros. Numa cidade densamente populada, como São Paulo, é uma ótima alternativa.

EXAME O senhor falou em padrões abertos. O senhor acredita que o celular vá ser como o PC, uma plataforma universal em que o mesmo software sirva em vários aparelhos? Hoje é preciso adaptar os programas para cada modelo.

Zander
Espero que haja algum tipo de padrão aberto, mas isso não significa comoditização. Também não quero que exista um só vendedor de software, por exemplo. Voltamos à questão da inovação. A competição é fundamental. O problema da indústria do PC é a falta de competição. Sou bastante franco com relação a isso. Ninguém inova porque você tem só uma plataforma de software e hardware há 25 anos. Se nós fossemos o único fabricante de aparelhos e eu gostaria que fosse assim, pois amo monopólios --, eu poderia tirar um ano de folga. Porque a inovação é controlada por mim. Mas temos Samsung, nós, a Nokia... todos lançam novos produtos, e isso garante uma indústria saudável.

EXAME Falando sobre perspectivas de crescimento. Logo haverá mais celulares do que pessoas na Europa Ocidental, por exemplo. Não há o risco de que os consumidores passem a trocar de aparelho com menos freqüência?

Zander
Certamente, mas não sei se vai ser agora. Veja o que aconteceu com o iPod. Música sempre foi música, está aí há muito tempo. Steve (Jobs) foi um gênio ao criar uma nova maneira de consumi-la. A propósito, acredito que música vai ser um grande negócio na telefonia celular nos próximos 12 meses. Isso tem um grande apelo para que as pessoas troquem de aparelho.

EXAME E com relação aos países emergentes? A Motorola acaba de anunciar na China um telefone de 50 dólares. Ele se destina só ao mercado chinês?

Zander
Não, a idéia é que ele seja vendido em todos os países emergentes. A maior parte do mundo está desconectada. Há uma enorme oportunidade de crescimento aí. Alguns anos atrás, os chineses queriam apenas modelos simples. Mas agora, em uma cidade como Pequim, os consumidores querem aparelhos sofisticados. Estive com autoridades nigerianas recentemente. Dos 150 milhões de habitantes do país, apenas 10 milhões têm acesso à rede. Eles querem chegar a 30 milhões nos próximos anos. Como você chega lá?

EXAME E como fica a situação das operadoras? Muitos dos aparelhos mais simples não têm como receber dados, o que limita as oportunidades de receita para as telefônicas.

Zander
Você tem de conversar com elas. O modelo de negócio das operadoras ainda está sendo discutido. Há a questão do subsídio, por exemplo, que pressiona as margens de lucro. Outra questão é a venda de aparelhos. Hoje, não vendo o celular diretamente para você. É tudo feito via operadora. Eu adoraria poder fazer isso, mas não sei se viverei para ver esse dia.

EXAME Como o senhor avalia a competição com os fabricantes asiáticos, que se especializam em modelos baratos?

Zander
Comparo mais uma vez com a indústria do PC no começo dos anos 90. Havia centenas de fabricantes. Hoje há cinco ou seis dominantes. No nosso setor isso também vem acontecendo. Há muita tecnologia aqui, não é só preço. As pesquisas custam caro. Ainda não é uma commodity. Se um indiano faz seu primeiro telefonema com um aparelho de 20 ou 30 dólares hoje, em dois anos ele vai voltar a você para trocar o celular. A marca também importa, como no caso da indústria de eletro-eletrônicos. É claro que sempre vai haver a camada mais baixa de consumidores. Todos tentam derrubar o iPod, mas ninguém consegue. Ele tem marca, tem tecnologia, é fácil de usar. Não é fácil competir com ele.

EXAME O senhor falou do iPod. O celular-iPod que a Motorola desenvolveu com a Apple ainda não foi exibido.

Zander
Não posso falar sobre isso se não ela me mata (ri e olha para Jennifer Weyrauch, diretora de comunicação da empresa, que acompanha a entrevista). O aparelho está praticamente pronto. (Zander faz uma demonstração do aparelho, que tem um software idêntico ao do iPod e vem com os fones de ouvido brancos, como o tocador da Apple). Você poderá colocar milhares de músicas num celular. Nem vai mais precisar de um iPod.

EXAME E o que a Apple acha disso?

Zander
Eles não viram ainda (risos). Brincadeira. Ele viu. Steve (Jobs) e eu somos bons amigos. Acho que o celular não vá substituir o iPod. Quando você sair para correr, por exemplo, vai querer o original. Eu imagino que você vai carregar algumas músicas para ouvir durante alguns dias. A idéia da Apple é trazer mais gente para o (serviço de venda de músicas iTunes). Ele também quer vender outros aparelhos. É preciso esquecer o pensamento convencional de vez em quando.

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