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'Não precisamos de mais conteúdo no mundo', diz fundador do Medium e do Twitter

Em entrevista exclusiva a INFO, Evan Williams fala sobre sua visão para o Medium, sua nova plataforma de publicação online

Evan Williams (Helena Price/INFOExame)

Evan Williams (Helena Price/INFOExame)

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Da Redação

Publicado em 17 de dezembro de 2014 às 07h33.

Desde que deixou o Twitter, em 2011, o cofundador Evan Williams tem se dedicado a um outro tipo de conteúdo online, mais profundo e analítico do que as mensagens de 140 caracteres. Williams é o fundador e presidente executivo do Medium, uma espécie de plataforma de blogs, com design minimalista, que mistura características de redes sociais.

Usado por empresas, escritores, blogueiros e jornalistas, o Medium tem atraído leitores online em busca de um tipo de texto que, segundo Williams, havia ficado em segundo plano na web e nas redes sociais. Com dois anos de operação, o site tem hoje 15 milhões de visitantes únicos, incluindo milhares de brasileiros. O Brasil, que ganhou um canal dedicado no Medium em outubro, é o quinto com maior audiência no Medium.

Para Williams, que também é o fundador do Blogger (popular plataforma de blogs comprada pelo Google em 2003), a ideia do Medium é ser um espaço online para que qualquer pessoa possa expressar opiniões e contar boas histórias, sem a obrigação de escrever com a mesma regularidade de um blog.

“Não precisamos de mais conteúdo no mundo, mas precisamos de histórias e ideias que toquem as pessoas e as façam pensar e refletir”, disse Williams a INFO, ao receber a reportagem em seu escritório, em São Francisco, nos Estados Unidos. A edição de dezembro/janeiro da INFO traz um perfil de Williams e seu trabalho no Medium. Abaixo, leia os principais trechos da entrevista:

 

Depois de passar anos no Twitter, por que se voltar a uma plataforma de textos longos e aprofundados?

Nós não pensamos no Medium como uma plataforma apenas para textos longos, embora claramente a maioria seja mais longa do que um tuíte. A forma como as redes sociais evoluíram é animadora e libertadora. Elas são uma força poderosa de expressão. Mas também é inegável que existe um limite para o que pode ser expressado e entendido em 140 caracteres, como no caso do Twitter. E eu sou fã de uma comunicação em formato curto e em tempo real. Mas também sou fã de histórias mais aprofundadas, com ideias que não podem ser articuladas tão rapidamente. Acho que existe espaço para ambos. São complementares. Mas, uma vez que o Twitter já existe, há uma necessidade maior de fazer esse outro tipo de conteúdo evoluir. Plataformas de publicação mais generalistas, e mesmo o formato de blog especificamente, não mudaram muito nos últimos dez anos.  

Depois que você deixou o Twitter, chegou criar uma empresa para desenvolver novos projetos. Mas o Medium só foi lançado mais de um ano depois. O que você fez nesse período?

É engraçado porque, quando eu saí do Twitter, minha mente imediatamente se voltou para a ideia de construir uma nova plataforma de publicação. Mas eu quis adiar isso por um tempo. Na época, eu pensei: por que não exploro outras coisas antes? E se eu realmente sentisse que era o que eu queria fazer, então me aprofundaria. E foi o que aconteceu. Depois de alguns meses, descobri que ainda estava obcecado por plataformas de publicação. Eu pensava que ainda havia muito a se fazer nessa área e existiam pouquíssimas pessoas na posição certa para fazer isso, como a minha equipe e eu. Achei que valeria a pena. O que sempre me animou mais em relação à internet é a ideia de que as pessoas têm acesso instantâneo a uma infinidade de histórias e ideias. Embora a internet seja a base de diversas áreas, como o e-commerce, eu sempre achei que a difusão de ideias era a mais animadora delas.

A origem da internet, inclusive, é muito ligada a esta ideia.

Sim. É algo fundamental. Mesmo que hoje exista uma quantidade opressiva de conteúdo disponível a todos, acho que vamos continuar a precisar de novas histórias e de novas ideias para nos ajudar a entender o mundo, ajudar a encontrar soluções para os problemas e a tomar melhores decisões… Nos últimos 15 anos, se tornou extremamente fácil publicar algo online. Mas ainda há muito mais a se fazer. Há uma necessidade de chamar a atenção para aquilo que realmente importa para as pessoas e não apenas para aquilo que é popular.

Por que acha que as ferramentas de publicação não evoluíram nesse período?

Existem empresas, claro, que tiveram muito sucesso nesta área, como WordPress, Tumblr e SquareSpace. Eles certamente evoluíram e se tornaram mais sofisticados. Hoje é muito mais fácil construir um site pessoal. Mas o objetivo do Medium é diferente. O Medium, na verdade, é muito menos sofisticado quando se trata de customização, design e ferramentas. Você não tem um site próprio no Medium. Nós tentamos manter todos os perfis muito similares para colocar o foco na simplicidade. Por outro lado, a ideia é maximizar o feedback e a distribuição.

Como isso é feito?

A conta no Medium é ligada a uma rede social. Um site ou um blog comuns são ilhas na web. Eles podem ganhar visitantes por meio de redes sociais, mas esses visitantes provavelmente não estão logados e não interagem entre eles. Nós queremos criar uma plataforma da qual as pessoas se sintam parte; uma plataforma que é mais viva e maior do que os próprios autores sozinhos. Nós ainda não desenvolvemos todos os mecanismos deste sistema. Mas o Medium é mais uma rede social do que uma ferramenta para criação de sites.

O Medium é uma forma de retomar o trabalho que você começou quando fundou o Blogger, em 1999?

Eu vejo o Medium como uma continuação do que eu fazia no Blogger e também como uma continuação do mundo do Twitter. Para mim, tudo sempre esteve ligado à autoexpressão e à troca de ideias. Há 15 anos eu estava pensando em algumas das mesmas coisas que nunca pude fazer no contexto do Blogger e agora estou trabalhando no Medium.

Que tipo de ideia, por exemplo?

Uma delas era uma ferramenta chamada de “Blogue sem um blog”. Eu conversava com muitas pessoas que tinham interesse em compartilhar seus pensamentos, mas não queriam abrir um blog e escrever com regularidade. Embora não seja tecnicamente difícil, você precisa pensar em muitas coisas para criar um blog. Precisa dar um nome, precisa de um subdomínio único, precisa escolher um template. E você precisa se comprometer. Para muitas pessoas, se o blog não é atualizado com frequência, isso é um fracasso, muito embora o conteúdo publicado possa ser muito bom. Uma comparação interessante é o Twitter. Não existe uma percepção de que você não está usando o Twitter se não estiver tuitando sem parar. Um número significativo de usuários só lê os tuítes ou responde outros usuários. Não vejo por que não poderia ser assim também para outros tipos de conteúdo.

A pessoa pode seguir um punhado de gente no Twitter e nunca postar nada.

Exatamente. Não tem problema nenhum. Mas nos blogs há essa suposição de que você precisa escrever com regularidade. E é muito difícil ganhar uma audiência se você não segue esta regra. O Medium está tentando quebrar isso. Se você só quiser ler os posts em vez de escrever, ótimo. Se quiser só comentá-los, tudo bem. Se quiser escrever com regularidade, OK. E se você quiser escrever muito raramente, tudo bem também. Naturalmente, a maioria não vai escrever com regularidade. Mas acho que poderemos chamar a atenção de pessoas inteligentes e articuladas, com ideias e experiências únicas, se elas tiverem um espaço para escrever só de vez em quando, sem compromisso, sem precisar configurar e manter um blog.

Os usuários entendem que não há um compromisso para escrever no Medium?

Estamos no início do processo de fazer as pessoas entenderem essa visão. Definitivamente já vemos algo assim. Vemos pessoas que nunca tiveram um blog e começaram a escrever. Vemos pessoas que tinham blogs, mas estão preferindo este modelo. Estamos tentando reduzir a lacuna entre as pessoas que apenas consomem e pessoas que escrevem.

O que é feito para valorizar o conteúdo do Medium?

Algo muito importante é que as histórias não são julgadas apenas pela quantidade de pessoas que as viram. Internamente medimos o tempo de leitura em cada texto. Os posts mais populares não estão lá apenas porque tiveram muitos cliques, mas porque há muitas pessoas que realmente os leram. A nossa página de “Top Stories” é uma lista diária dos 20 posts mais recomendados, baseada na indicação de pessoas que clicaram no botão “recomendar”. Esse é um bom sinal de qualidade. Temos também uma lista das 100 histórias mais populares de cada mês. O curioso é que não são os 100 posts mais vistos. São os que tiveram um tempo de leitura maior. A história número um de agosto, por exemplo, era um texto que levava 33 minutos para ler. É bastante longa e muito séria.

Por que valorizar o tempo de leitura?

Não é uma medida perfeita, claro. Alguém pode escrever algo valioso, porém conciso, e ter um tempo de leitura curto. Nós também levamos isso em consideração. Mas, entre as ferramentas que temos, acho que é a melhor medida. Há uma infinidade de coisas na internet e, se alguém realmente parou para ler uma história até o fim, há uma grande chance de ser um conteúdo relevante. Outro fator importante é que nós não focamos apenas o conteúdo mais recente. Há histórias no Medium que podem ter uma vida longa de circulação. Por exemplo, em setembro, a história mais popular foi escrita em fevereiro de 2013. Eu gosto disso porque, para este autor, é ótimo. Ele pesquisou bastante, teve trabalho para escrever, o texto não é superlongo, mas alguém descobriu o post e ele foi compartilhado outra vez. É valioso. As pessoas gostaram. Ainda é relevante. Nós não precisamos de mais conteúdo no mundo, mas precisamos de histórias e ideias que toquem as pessoas e as façam pensar e refletir. Ainda estamos começando a elaborar esses mecanismos para chamar a atenção para aquilo que é bom. Mas é a forma que estamos fazendo agora.

Vocês lançaram recentemente um canal brasileiro do Medium. Como ele funciona?

Por enquanto, queremos ajudar, de forma simples, as melhores histórias em português no Medium a ganhar audiência. Há alguns meses criamos uma ferramenta de tradução que permite ter múltiplas versões de um texto em diferentes línguas. Os usuários podem se cadastrar como tradutores voluntários. Assim, qualquer post no sistema pode ser traduzido se o autor aprovar. Nós selecionamos algumas das histórias mais populares em inglês e pedimos às pessoas para traduzirem para seus idiomas. O português é uma das línguas que estamos priorizando, mas, claro, há muitas histórias publicadas no Medium que são originalmente em português, incluindo alguns dos primeiros textos mais populares.

Você se lembra de algum especificamente?

Eu não conseguia entender porque ainda não tínhamos a ferramenta de tradução. Mas uma das histórias mais populares no começo era em português. E, além da ferramenta de tradução, temos algumas pessoas no Brasil que estão fazendo o conteúdo do Medium ficar conhecido no país. A maior parte do conteúdo ainda está em inglês e deve continuar assim no longo prazo. Mas queremos ter comunidades ativas em diferentes locais, falando diferentes línguas no Medium.

Os usuários brasileiros já representam uma fatia significativa?

Sim. O Brasil é o quinto na nossa lista de países. É o país mais bem posicionado que não tem o inglês como língua nativa. Ele aparece atrás de Estados Unidos, Reino Unido, Canadá e Austrália.

Também planeja traduzir a plataforma?

Sim. Não tenho uma previsão, mas espero que seja logo.

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