A Peloton vale hoje quase 10 bilhões de dólares (Peloton/Divulgação)
As ações da Peloton, empresa americana de equipamento para exercícios indoor, disparam, na maior alta percentual desde a estreia em Nova York — em setembro de 2019 —, após atrair interesse de potenciais compradores da companhia, entre eles, a Amazon.
No que parece ser uma faxina na casa antes da visita chegar, a Peloton anunciou na terça-feira, 8, um plano de reestruturação para poupar 800 milhões de dólares na operação e que para isso estava demitindo 2.800 pessoas.
Mas, para alívio dos ex-funcionários, a empresa garantiu que todos saíram com um ótimo benefício: a assinatura de um ano do aplicativo de treino em casa da companhia.
A história recente da Peloton é cheia de episódios ao estilo 'como ninguém pensou nisso antes?'. Tudo gira em torno da empresa acreditar que surfava uma onda eterna em um clima sempre bom.
Para entender melhor, é preciso voltar no tempo dois anos atrás, no início da pandemia. Na época, com os lockdowns mundiais, muita gente quis dar continuidade à rotina de exercícios de dentro de casa.
Foram às lojas e encontram as bicicletas ergonômicas e esteiras da Peloton equipadas com telas gigantes e recursos que as transformavam em uma central de entretenimento bem parruda, além do design minimalista e o status social ligado ao estilo de vida de ser ter uma na sala.
Assim, a demanda cresceu ao longo de 2020 ao ponto de se tornar difícil manter os estoques. A Peloton, claro, correu atrás de investimento e de investir na cadeia produtiva.
Foram gastos 400 milhões de dólares para criar uma fábrica em Ohio, nos EUA, e outros 420 milhões para comprar a Precor, uma das maiores fabricantes de equipamentos fitness do mundo. A empresa se posicionou de forma agressiva para construir rapidamente uma liderança no setor.
Então, em 2021, a história de sucesso da Peloton começou a desmoronar. Duas das esteiras mais vendidas foram retiradas do mercado após relatos de várias crianças feridas, com um caso resultando até mesmo em morte.
A empresa também teve de recolher os pedais de cerca de 27.000 bicicletas depois que surgiram ainda mais reclamações de lesões, cinco das quais exigiram pontos ou outros cuidados médicos.
O lançamento seguinte da empresa, o sistema de treinamento de força Peloton Guide, foi bem morno. E a demanda por seus produtos caiu quando algumas pessoas voltaram às academias depois que as restrições de quarentena foram suspensas.
O resultado foi o valor de mercado da Peloton despencando de um pico de pandemia de cerca de 50 bilhões de dólares para cerca de 8 bilhões de dólares na semana passada, após rumores de que a empresa interromperia a produção de todos os seus produtos.
Além disso, um agravante pitoresco foi quando a empresa foi incluída no reboot de Sex And The City, em uma cena em que o personagem Mr. Big, interpretado por Chris Noth, sofreu um ataque cardíaco fatal enquanto usava sua bicicleta Peloton no primeiro episódio da série no mês passado. Após a estreia do piloto, as ações que já iam mal ficaram piores.
O fundador e ex-CEO da Peloton, John Foley, se encontra entre muitas batalhas. Algumas semanas atrás, o fundo de investimento Blackwells Capital escreveu uma carta aberta exigindo que Foley fosse demitido por colocar a Peloton no atoleiro.
Entre várias razões listadas estavam as alegações de que Foley inicialmente se recusou a cooperar com a Consumer Product Safety Commission (CPSC), o Inmetro americano, nos recalls de esteiras, além de ter contratado a própria esposa como vice-presidente do braço de vestuário, e ter assumido compromissos imobiliários ruins, falhando em antecipar corretamente a demanda do consumidor e “invertido o roteiro de lançamento de produtos que ele mesmo idealizou.”
Na terça-feira, 8, Foley também divulgou que se afastaria do cargo de CEO, mas se manteria como diretor executivo, acreditando que apasiguaria os animos. Não adiantou.
Nesta quarta-feira, 9, Blackwells Capital voltou a dizer que Foley era o maior problema da Peloton, agora com o apoio de Eric Schiffer, CEO da empresa de private equity Patriarch Organization. “Esta empresa é grosseiramente mal administrada", disse o investidor.
Com a recente sondagem da Amazon para compra da empresa, todos que possuíam uma fatia em ações ficaram animados. Haveria ali uma saída para uma grande marca e produto com enorme potencial de crescimento – tudo dependendo de quem estaria no comando.
Há apenas um problema: Foley, diferente dos acionistas, não parece interessado em vender. Pelo menos, ainda não. Foley pode não ser mais CEO, mas ele e sua equipe controlam 80% do poder de voto, e até ele ser convencido, a Amazon é um bote salva-vidas incerto.