Os sites da Gawker Media, fundada por Nick Denton, seguem uma fórmula simples. Em suas próprias palavras: "quanto mais ultrajante, melhor" (Divulgação)
Da Redação
Publicado em 2 de maio de 2011 às 17h32.
São Paulo - Nick Denton é dono de um império digital que reúne alguns dos blogs mais acessados do mundo, como o Gizmodo, dedicado à tecnologia, e o pioneiro Gawker, de fofocas. O jornalista inglês, ex-correspondente do sisudo Financial Times, começou a erguer seu império em 2002, de seu apartamento no Soho, em Nova York.
Ao contrário de tantos blogueiros, Denton apostou alto na profissionalização do formato. Reuniu uma rede de colaboradores ao redor do mundo e passou a remunerá-los conforme índices de audiência e receita publicitária, o que determinou - e ainda determina - o foco editorial: fofocas, games, gadgets, carros, sexo e, acima de tudo, escândalos envolvendo celebridades ("quanto mais ultrajante melhor", diz).
A Gawker Media atingiu tal profissionalização que Denton não se reconhece mais como blogueiro, embora ainda o chamem de magnata da blogosfera. E não vê mais diferenças entre o perfil de seus funcionários e o das redações tradicionais. Denton tem a reputação de ser um gênio ousado e um frasista mordaz (do criador do Facebook, Mark Zuckerberg, já disse ser a Angelina Jolie da internet). Em 2007, sua fortuna foi avaliada em quase 300 milhões de dólares. Nesta entrevista, ele fala sobre os rivais, a AOL, o conceito de blog e as preferências de sua audiência.
Você se vê como um grande magnata da mídia?
Eu, um novo Rupert Murdoch? Se disser que sim, devo apontar que seria numa versão bem menor que a original. Ele tem um império de mídia que engloba televisão, rádio, revistas e internet. Eu comecei com blogs. Por mais influência que tenha nessa área, ainda não estou presente em todos os setores como gostaria.
Os sites da Gawker estão entre os mais acessadas nos Estados Unidos. Isso assusta as grandes empresas de comunicação?
Temos uma base de 15 milhões de pessoas visitando os sites mensalmente. Isso só nos Estados Unidos. No mundo, são mais 10 milhões. Se fôssemos um jornal nos EUA, seríamos o segundo maior do país, logo atrás do New York Times. Mas, sinceramente, se tem alguém que assusta os jornais, são os sites de busca como Google e o Bing. Seu alcance representa uma ameaça bem maior do que a Gawker.
A Gawker profissionalizou o conceito de blog. O que você pensa hoje do formato?
Não somos mais blogueiros, apesar de continuar atuando com a mesma paixão. Os blogs viraram uma nova peça no universo da mídia digital. No começo, eles chamavam a atenção de uma audiência específica, e alguns tinham o costume de repetir as notícias publicadas em outros lugares. Com o tempo, passamos a desenvolver uma receita mais jornalística. As pessoas começaram a olhar para os nossos blogs como sites de notícias e nós acabamos mudando nosso layout para refletir isso também. Nossos funcionários viraram colunistas, editores, repórteres, e redatores. Não há mais diferença entre eles e seus colegas que trabalham nas redações tradicionais de jornais e revistas. Para dizer a verdade, muitos deles vieram dessas mesmas redações. Existe uma troca de profissionais aí. A ESPN até quis contratar um dos nossos colunistas do Deadspin (risos).
A America Online adquiriu alguns dos concorrentes da Gawker. Como você analisa essa movimentação?
A AOL virou a nossa maior competidora. Seu escritório em Manhattan fica a alguns quarteirões do nosso. As negociações que eles fizeram resultaram na compra do Engadget, de tecnologia, do Joystiq, que fala sobre games, do político Huffington Post e do TechCrunch, que também fala sobre o mercado de tecnologia. São vários rivais sob o guarda-chuva da mesma empresa. Uma das coisas que me deixam confortável a respeito dessa situação é que a AOL está há mais de uma década em declínio. Entenda: eu os quero bem como seres humanos. Mas do ponto de vista da competição, quero que eles tenham o mesmo “sucesso” das outras aquisições que a companhia fez no passado.
Você colocaria seu projeto nas mãos de uma companhia como a AOL? Já recebeu tal proposta?
Nós nunca consideramos uma venda nos modelos do Huffington Post. Na verdade, estamos mais dispostos a fazer aquisições do que abrir mão dos nossos sites. Não há evidência de que uma grande companhia tradicional possa fazer a diferença no gerenciamento de uma iniciativa online. Sinceramente, acho que colocar o projeto nas mãos de um gigante de mídia pode ser a receita para um desastre.
A Gawker tem oito sites que tratam de assuntos que vão desde tecnologia até fofocas. Política e economia estão fora. Por quê?
O público está certamente interessado em política. A audiência do Huffington Post cresceu com base na raiva que os democratas nutriam pela administração George W. Bush. Embora os espectadores gostem de ler sobre o tema, os anunciantes não compartilham o mesmo gosto. Não existe um site com foco em política ou economia que tenha conseguido gerar lucro. Chegamos a ter uma página sobre o assunto, mas logo desistimos. Não encontramos um meio de torná-la rentável. O conteúdo político pode encontrar espaço em outros sites da casa, como o próprio Gawker ou mesmo o Jezebel, que é o nosso produto para o público feminino. Hoje nós escrevemos sobre o tema, mas de um jeito que agrade ao nosso público e investidores.
Qual é o impacto da audiência sobre o seu conteúdo?
Nós seguimos a necessidade do nosso público. Felizmente, a mídia online facilita a métrica da audiência dos artigos, o que nos permite estudar os tópicos mais interessantes para os leitores. Hoje os tópicos mais populares incluem Mark Zuckerberg, do Facebook, e Evan Willians, do microblog Twitter. Eles são líderes jovens e bem sucedidos nessa área de negócios virtuais. A métrica também permite nos ajustar rapidamente aos interesses do público. É dessa forma que a audiência influencia nossa cobertura.
Como é feito o noticiário de celebridades e fofocas? Vocês observam algum limite de privacidade?
Não, eu não acho que tenhamos algum tipo de limite específico. Nosso site Deadspin cobre escândalos sexuais e financeiros no mundo dos esportes. Um dos aspectos do seu sucesso é justamente a falta de limite. Quanto mais ultrajante, melhor.
Alguma cobertura em particular já o deixou orgulhoso do seu projeto?
Com certeza. Uma delas foi a revelação do protótipo iPhone 4 no ano passado (que a Gawker comprou de um funcionário da Apple). A Apple é uma companhia muito poderosa. Isso assusta a maioria dos jornais nos Estados Unidos, que costumam seguir suas ordens e instruções. Estou orgulhoso de ter produzido essa matéria sem medo. Nossa lealdade não está com a equipe de relações públicas da Apple, mas com os nossos leitores.
Vocês nunca mais foram convidados para uma coletiva de imprensa deles?
Não, nunca mais. É um sacrifício que estamos prontos a fazer em troca de uma história que ninguém mais conseguiria noticiar.
Recentemente vocês mudaram o desenho dos sites. Além de deixá-los mais amigáveis para os usuários de tablets, houve mais algum motivo para a alteração?
O desenho das páginas foi otimizado para trabalhar melhor com os navegadores modernos e com os próprios tablets. Você pode argumentar que estamos um pouco à frente do nosso tempo, e que esse foi um site criado para 2020 e não para 2011. Mas, como dizem: algumas vezes é melhor estar à frente do que ficar para trás.
Mas vocês perderam audiência com a mudança...
Sim, nossa audiência chegou a cair uns 25% com todas essas alterações. Mas nós esperamos que esse pessoal volte logo às nossas páginas. Não vamos voltar atrás.
A teia de Nick Denton Conheça os sites da Gawker Media
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