Internet das coisas: o pesquisador destaca também problemas de segurança que objetos conectados podem gerar (Thinkstock/Thinkstock)
Agência Brasil
Publicado em 7 de fevereiro de 2017 às 09h01.
Última atualização em 27 de setembro de 2017 às 18h58.
Além de promover o desenvolvimento de soluções tecnológicas, a regulamentação da internet das coisas precisa garantir a privacidade e a segurança dos usuários da rede.
A opinião é do professor e pesquisador Eduardo Magrani, do Centro de Tecnologia e Sociedade da Fundação Getulio Vargas - FGV - Direito Rio.
A consulta pública sobre o Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT) terminou à meia-noite de ontem (6).
Magrani explica que internet das coisas é um tema "guarda-chuva" que trata de objetos inteligentes interconectados, que vão desde carros automatizados até relógios inteligentes ou eletrodomésticos controlados via celular. Lembra que tudo isso gera muitos dados sobre os hábitos dos usuários.
"Inclusive dados sensíveis, eles podem saber o que a gente come, quanto a gente gasta de calorias durante o dia e qual é o nosso percurso para o trabalho ou para qualquer lugar. Todos esses dados são informações pessoais que, se comercializadas ou transferidas a terceiros sem o nosso consentimento, podem vir a gerar algum dano nas nossas vidas. Então, a internet das coisas acaba impactando a todos nós por remeter a questões de privacidade".
Magrani questiona a falta de transparência no uso das informações, segundo ele, um dos principais pontos a serem resolvidos no Plano Nacional.
"Você sabe para onde vão esses dados? Sabe para quem o Google transfere? Você sabe se ele transfere para o seu seguro de saúde cobrar mais caro? A gente não sabe, então, tem que haver mais transparência nessas coisas".
Além de questões de privacidade, o pesquisador destaca também problemas de segurança que objetos conectados podem gerar.
"A gente já tem exemplo de rackeamento de carros automatizados, de câmeras de vigilância, o que fez cair o Netflix e o Pay Pal em dezembro do ano passado. Todos esses exemplos remetem a falhas de segurança em internet das coisas", observa.
Outra questão a ser tratada na regulamentação, de acordo com Magrani, é o padrão tecnológico. "Para o seu celular se comunicar com a sua geladeira, deve haver um padrão compatível de conexão entre eles. Então, esse é um problema na internet das coisas, como a gente criar padrões que permitam essa intercomunicação entre os objetos. Essa é uma questão altamente técnica que está presente na consulta".
Há a preocupação, ainda, com mudanças no mercado de trabalho que a internet das coisas envolve.
"A gente precisa, nas escolas, universidades e cursos técnicos, preparar, capacitando esses alunos para um novo mercado do século 21, da chamada quarta revolução industrial. Hoje, já há a expectativa de que várias profissões vão desaparecer do mercado em função da automação. Escritórios de advocacia hoje estão demitindo advogados recém-formados e substituindo por softwares, por robôs, que fazem um trabalho parecido. Então, como a gente capacita essas pessoas para esse novo mercado que é altamente impactado pela tecnologia?", pergunta o professor.
Segundo o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTIC), que desenvolve o plano em parceria com o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a consulta pública sobre o Plano Nacional de Internet das Coisas (IoT) recebeu mais de 22 mil acessos, que geraram quase 2 mil contribuições por meio da plataforma Participa.br.
A consulta começou em meados de dezembro e o prazo inicial para o envio de contribuições era 16 de janeiro, mas, segundo o ministério, houve pedido de diversos setores interessados em participar e que não conseguiram mandar as contribuições a tempo, por causa das festas de fim de ano, assim, o prazo foi prorrogado.
De acordo com o pesquisador da FGV, especialistas na área contribuíram bastante para essa consulta pública, mas faltou engajamento maior da sociedade, com a participação de cidadãos "entendendo do que trata a internet das coisas e contribuindo com seu ponto de vista".
"Essa é a principal função de uma consulta pública pela internet, que o cidadão possa colocar a sua opinião. A gente viu muita participação de grupos específicos da sociedade civil e de empresas e pouco de cidadão individual. Isso significa que o Estado não fez um bom trabalho para capacitar as pessoas nesse tema, as pessoas continuam não conhecendo sobre os impactos da internet das coisas, achando que não têm nada a contribuir. E, na verdade, a internet das coisas trata de coisas que eles usam diariamente".
Magrani também critica o fato de a consulta ter sido aberta no período das festas de fim de ano, o que, para ele, prejudica o debate.
"O Estado tem o dever de capacitar as pessoas para o debate. Foram dois meses, mas começou em meados de dezembro, quase natal, e iam fechar no início de janeiro, em meio a datas festivas e ainda voltando de férias. Com que intuito o Estado quis colocar essa consulta pública na calada da noite? Afastar as pessoas do debate? A ideia é incluir as pessoas. É um equívoco colocar uma consulta pública entre natal e réveillon", disse ele.
O MCTIC informou que o próximo passo é "consolidar as informações coletadas na Consulta Pública e juntá-las às demais informações produzidas pelo Estudo de IoT, realizado pelo consórcio contratado pelo BNDES que trabalha para a Cooperação Técnica entre o BNDES e o MCTIC para gerar o diagnóstico e propor ações para o desenvolvimento da utilização e da geração de valor que a Internet das Coisas pode gerar para o país".