Pat Gelsinger, ex-CEO da Intel, tentou reposicionar a empresa como líder em semicondutores, mas enfrentou forte concorrência e desafios internos. (David Becker / Colaborador/Getty Images)
Redator na Exame
Publicado em 6 de dezembro de 2024 às 12h56.
Pat Gelsinger, contratado pela primeira vez pela Intel como técnico aos 18 anos, construiu uma carreira de destaque na gigante americana de semicondutores. Gelsinger retornou à empresa em 2021 como CEO com a difícil missão de resgatá-la de um período de estagnação e perdas significativas de mercado[/grifar].
Em dezembro de 2024, no entanto, sua gestão terminou de forma abrupta, marcada por uma queda de 59% no valor de mercado da companhia, que resultou na perda de confiança do conselho.
A Intel, outrora pioneira no desenvolvimento de chips e líder de mercado, tem enfrentado desafios estruturais e tecnológicos nos últimos anos, agravados pela crescente concorrência de rivais como Nvidia, TSMC e Samsung. Sob a liderança de Gelsinger, a empresa tentou implementar um plano ousado de recuperação, mas acabou se deparando com uma série de obstáculos que culminaram na maior crise de sua história recente, de acordo com reportagem do The Wall Street Journal.
Nos anos 2000, a Intel era o maior nome da indústria de semicondutores, dominando o mercado de processadores para computadores pessoais e servidores. Contudo, mudanças tecnológicas e de mercado transformaram o setor, e a Intel perdeu terreno para empresas mais ágeis e especializadas.
Enquanto a Nvidia e a TSMC prosperaram com chips de alta performance voltados para inteligência artificial e aplicações móveis, a Intel lutou para adaptar sua estratégia.
Em 2024, a Nvidia alcançou um valor de mercado de impressionantes US$ 3,4 trilhões (R$ 20,57 trilhões), enquanto a Intel caiu para US$ 103 bilhões (R$ 622,15 bilhões), refletindo uma perda de US$ 150 bilhões (R$ 907,5 bilhões) desde o início da gestão de Gelsinger.
Além disso, a Intel sofreu a maior perda trimestral de sua história em outubro de 2024, reportando um prejuízo de US$ 16,6 bilhões (R$ 100,43 bilhões), muito acima do esperado pelos analistas. O desempenho fraco da empresa resultou em sua exclusão da lista das dez maiores empresas de semicondutores do mundo, algo impensável há poucos anos.
Quando assumiu a liderança em 2021, Gelsinger apresentou uma visão ambiciosa: recuperar a posição de destaque da Intel como líder em design e fabricação de chips. Essa abordagem, chamada de "IDM 2.0", contrariava a tendência do setor, que havia se dividido entre empresas especializadas em design, como Nvidia, e fabricantes, como TSMC.
A estratégia de Gelsinger envolvia a construção de novas fábricas e a criação de um negócio de fabricação sob contrato para competir diretamente com a TSMC. Ele também foi um dos principais defensores do Chips Act nos EUA, que destinou bilhões de dólares para revitalizar a fabricação doméstica de semicondutores.
Apesar da visão ambiciosa, a execução enfrentou desafios. A Intel não conseguiu atrair grandes clientes para sua nova unidade de fabricação sob contrato, e sua cultura interna, focada em atender às próprias necessidades, dificultou a adaptação para servir outros clientes. Além disso, a empresa enfrentou atrasos no desenvolvimento de novos chips e viu sua posição no mercado de inteligência artificial ser eclipsada pela Nvidia.
O crescimento exponencial da demanda por chips para inteligência artificial deveria ter sido uma oportunidade para a Intel. No entanto, a Nvidia dominou esse mercado, com seus chips gráficos se tornando essenciais para aplicações de IA como o ChatGPT.
Enquanto a Nvidia registrava receitas recordes e se tornava a empresa mais valiosa do mundo, a Intel lutava para atingir suas metas. Em 2024, a Intel não conseguiu atingir sua previsão de receita de US$ 500 milhões (R$ 3,025 bilhões) com chips de IA, destacando sua incapacidade de competir nesse segmento crucial.
Outro revés significativo foi o fracasso da tentativa de aquisição da Tower Semiconductor, uma fabricante de chips sob contrato. A negociação foi bloqueada por reguladores chineses, frustrando os planos de Gelsinger de expandir a capacidade de fabricação da Intel.
Internamente, a Intel enfrentou problemas culturais. A empresa, acostumada a desenvolver chips exclusivamente para si mesma, teve dificuldade em adotar a flexibilidade necessária para atender a clientes externos. Essa rigidez limitou a capacidade da Intel de competir em um mercado dinâmico e centrado no cliente.
A saída de Gelsinger levanta questões sobre o futuro da Intel. Analistas sugerem que a empresa pode ser forçada a se dividir em duas unidades independentes: uma focada no design e outra na fabricação de chips. Essa divisão seria uma admissão de que a estratégia "IDM 2.0" não conseguiu alcançar os resultados esperados.
Apesar disso, a Intel continua sendo uma peça-chave na indústria de semicondutores, especialmente para o governo dos EUA, que depende da empresa para a produção de chips avançados usados na defesa nacional.
A Intel afirmou em comunicado que os esforços de Gelsinger revitalizaram suas tecnologias e criaram uma base sólida para o futuro. No entanto, será necessário um esforço hercúleo para recuperar sua posição de liderança em um setor tão competitivo.
Pat Gelsinger, amplamente respeitado como engenheiro e líder, deixa um legado complexo. Embora tenha falhado em reverter o declínio da Intel, ele foi um defensor incansável da inovação americana e da fabricação local de semicondutores. Sua saída marca o fim de uma era para a empresa e abre caminho para uma nova estratégia que pode definir o futuro da Intel.