Governo dos EUA processa Google por práticas anticompetitivas
Empresa tem histórico de acusações por práticas antitruste e já foi multada na Europa. Processo pode ter impacto no mercado de tecnologia como um todo.
Thiago Lavado
Publicado em 20 de outubro de 2020 às 12h30.
Última atualização em 20 de outubro de 2020 às 17h58.
O Departamento de Justiça dos Estados Unidos acusou o Google de manter um monopólio ilegal no mercado de buscas online e também de publicidade em mecanismos de buscas. É a maior investida da Justiça norte-americana contra uma companhia de tecnologia em uma geração.
De acordo com o processo, protocolado junto a uma corte de Washington DC nesta terça-feira, 20, as autoridades afirmam que a Alphabet, companhia-mãe do Google, tomou providências para impedir que concorrentes ficassem de fora desse mercado, valendo-se de contratos de negócios exclusivos, que incluem até mesmo pagamento bilionários à Apple, para que o buscador do Google fosse incluído como padrão nos iPhones fabricados pela empresa.
A ação na Justiça afirma que o uso de tais contratos prejudicou o surgimento de inovações e de competidores nesse mercado.
O movimento do Departamento de Justiça deve abrir um precedente de investigação, que pode se estender às legislações estaduais nos EUA. Dezenas de estados norte-americanos já tinham investigações em paralelo sobre o controle do Google em publicidade digital por meio de buscas. Com uma investigação suportada pelo principal órgão jurídico nacional, outros processos anti-truste podem estar no radar do Google.
A Alphabet nega esse tipo de acusações sobre práticas monopolísticas. Em um pronunciamento prévio, divulgado no Twitter do Google, a empresa diz que o processo tem falhas profundas. "As pessoas usam o Google porque elas escolhem fazer isso -- não porque são forçadas ou não conseguem encontrar alternativas".
Em um pronunciamento mais longo, divulgado no blog da gigante e disponível também em português, o Google diz que esta ação do Departamento de Justiça não ajuda os consumidores e, "ao contrário,promoveria artificialmente alternativas de pesquisa de qualidade inferior, aumentaria os preços dos smartphones e tornaria mais difícil o acesso das pessoas aos serviços de pesquisa que desejam usar".
"Entendemos que com o nosso sucesso vem o escrutínio, mas mantemos a nossa posição. A lei antitruste dos Estados Unidos foi projetada para promover a inovação e ajudar os consumidores, e não favorecer concorrentes específicos ou dificultar a obtenção dos serviços que esses consumidores desejam", disse ainda o Google, no texto, em que elenca argumentos contra as acusações.
Mas a empresa está diante desses holofotes há alguns anos: em 2018 foi condenada pela União Europeia a pagar uma multa recorde, de cerca de 5 bilhões de dólares, por práticas anti-competitivas no sistema operacional Android. Segundo a Comissão Europeia, a empresa forçava fabricantes de smartphones que usam Android a adotar uma série de aplicativos pré-instalados, como o navegador Chrome e a ferramenta de buscas.
À época, Sundar Pichai, presidente do Google, afirmou que a gratuidade do sistema estava correlata com o conjunto de aplicativos que garantem o sustento da empresa através da publicidade digital e que a decisão dos reguladores poderia colocar em risco a balança econômica por trás do sistema e "favorecer sistemas proprietários".
Tanto a decisão europeia, quanto a tomada nesta terça pelo departamento de Justiça, apontam para um problema maior: o Google está envolto em uma grande parte dos usos corriqueiros da internet — seja com o navegador Chrome, o Android, o buscador, o YouTube ou até o conjunto de ferramentas de trabalho disponível no Drive.
A acusação mais ampla traz à memória o imbróglio jurídico em que se meteu a Microsoft há pouco mais de 20 anos.Em 1998, os reguladores americanos foram atrás da empresa, que estava vinculando o navegador Internet Explorer ao sistema operacional Windows. Até Bill Gates, fundador e presidente da companhia à época, foi chamado a depor no tribunal.
A Microsoft era uma força singular no mercado de tecnologia e de computadores e por isso despontou na frente no então incipiente mercado de navegadores. Mas a decisão do Departamento de Justiça americano, uma das mais severas em casos de truste no mercado de tecnologia, impôs restrições séries em quão agressiva a Microsoft poderia ser na integração de sistemas operacionais e programas de computador. A resposta da Microsoft era de que era possível instalar outros navegadores — a mesma que o Google dá para seus aplicativos e sistemas.
O processo mudou o mercado de tecnologia nos anos seguintes, e este que surge agora contra o Google não deve ser diferente.
Atualização: este texto foi alterado às 17h58 para incluir o posicionamento completo do Google.