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Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h27.
O número de consumidores que realizam compras pela internet no Brasil saltou de 700 000 em 2001 para 8,1 milhões de em 2007 - um crescimento de mais de dez vezes nesta década. Isso significa que uma em cada cinco pessoas que navegam na internet no país é um consumidor eletrônico. O comércio virtual movimentou 4,4 bilhões de reais em 2006, alta de 700% em relação a 2001. Cada compra teve um valor médio de 296 reais. Os dados são da consultoria e-bit, especializada em comércio eletrônico. Para 2007, a e-bit prevê um faturamento de 6,4 bilhões de reais nas 3 000 lojas virtuais brasileiras, 45% a mais do que em 2006. E a estimativa de elevação no faturamento é de 35% por ano até 2010, quando o valor comercializado na internet brasileira deve atingir 15,5 bilhões de reais.
Em meio à explosão das vendas, um dado que chama a atenção é o aumento da presença de compradores de renda mais baixa. Entre 2001 e 2006, a renda média das pessoas que compraram produtos pela rede caiu de 4 014 para 3 683 reais. Em 2001, 6% dos consumidores eletrônicos ganhavam até 1 000 reais por mês, porcentagem que chegou a 8% em 2006. Entre as pessoas com renda entre 1 000 e 3 000 reais, o índice caiu de 38% para 45% no período.
"As lojas virtuais tiveram de elevar o mix de produtos oferecidos para atender às camadas de renda mais baixa", diz o diretor-geral da e-bit, Pedro Guasti. Segundo ele, a classe C é a maior compradora de produtos como telefones celulares, câmeras digitais, CDs e artigos de vestuário, mas ainda adquire poucos produtos de valor mais elevado, como eletroeletrônicos, eletrodomésticos e informática. No segmento de telefonia celular, 12% dos pedidos de compra são feitos por pessoas com renda de até 1 000 reais, ante apenas 5% das pessoas com renda acima de 8 000 reais.
A entrada de lojas como Pernambucanas e Marabraz no negócio de vendas virtuais em 2006 mostra que o peso da classe C nesse mercado deve aumentar ainda mais. Além disso, é uma oportunidade de diversificar o público - caso das Americanas, que aproveitou a web para se conectar a um público de renda mais alta, que não era o seu principal cliente. "Nos primeiros anos, a internet era uma iniciativa de aventureiros. Não havia volume expressivo de vendas que justificasse entrada de uma grande varejista das classes C e D", diz Guasti. "Mas, hoje, o varejista que não estiver na rede vai perder seu cliente para a concorrência", afirma Guasti.
Vendas de computadores
O avanço do comércio eletrônico ocorreu na esteira do aumento das vendas de computadores. Condições como a estabilidade econômica, a valorização do real frente ao dólar, a queda dos juros, a expansão do acesso ao crédito, o alongamento dos prazos de financiamento e a edição da Lei do Bem, que isentou os computadores da incidência de PIS e Cofins - e reduziu em 9,25% o preço dos PCs, em média -, revolucionaram o mercado brasileiro de informática e, conseqüentemente, de internet.
De acordo com dados da consultoria IT Data, contratada pela Associação Brasileira da Indústria Eletroeletrônica (Abinee), as vendas de computadores saltaram de 4,2 milhões em 2004 para 8,2 milhões em 2006 e devem chegar a 10,1 milhões até o fim de 2007, superando, pela primeira vez, as vendas de televisores - 9,5 milhões de unidades. Nos últimos três anos, a participação do mercado cinza (ou seja, informal) se inverteu: seu domínio caiu de 73% para 30% das vendas.
O Brasil já é o quarto maior mercado no ranking de vendas de computadores, atrás apenas de Estados Unidos, Japão e China, segundo a consultoria IDC - o país era o oitavo até 2006. Em vendas de computadores de mesa, o Brasil já é o terceiro colocado e, em notebooks, ocupa o 15º lugar - bem acima da distante 34ª posição de 2005. Os computadores portáteis, que representavam apenas 5,7% das vendas em 2005 - 323 000 unidades -, chegaram a 8,2% em 2006, e a estimativa é que atinjam quase 21% em 2007, ou 2,1 milhões de unidades. Para 2008, a previsão da IT Data é que os notebooks representem 32,2% do mercado, com 3,8 milhões de unidades de um total de 11,8 milhões de computadores vendidos.
"O computador é hoje o objeto de desejo da classe C, tendo em vista que as TVs de plasma ou LCD ainda são produtos muito caros e restritos às classes de renda mais elevada", diz Ivair Rodrigues, diretor de pesquisas da IT Data. E, ao adquirir o primeiro computador, uma parte da população já opta pelo notebook por sua praticidade e mobilidade, acrescenta Rodrigues. Nas lojas do hipermercado Extra, líder em vendas de produtos de informática, a cada cinco computadores vendidos, um é notebook.
"O preço tem grande peso na hora da compra, mas consumidor tem levado principalmente os computadores de configuração mais básica, mas sempre equipados com leitor e gravador de CD e DVD e monitor de LCD", diz Avelino Nogueira, gerente de eletroeletrônicos do grupo Pão de Açúcar. "Como a compra é parcelada, ele prefere pagar um pouco mais a cada prestação e adquirir um computador melhor e que possa ser utilizado para trabalho, estudo e lazer. Ou seja, por toda a família."
A indústria de informática comemorou o fenômeno, investiu em fábricas e contratou quase 10 000 funcionários no período - hoje, 25 200 pessoas trabalham diretamente para essas empresas e 95 000 para fornecedores. O varejo não ficou de fora e, segundo a IT Data, contratou ao menos dois funcionários especializados por loja para vender produtos de informática. Com 53 fabricantes disponíveis no varejo, é possível adquirir computadores por 900 reais e notebooks a 1 500 reais com parcelamentos sem juros em até 12 vezes. Até mesmo a gigante Dell desistiu recentemente de seu modelo exclusivo de vendas diretas e passou a oferecer computadores nas lojas do Wal-Mart.
Acesso à internet
Atualmente 22,1% dos 54,6 milhões domicílios brasileiros possuem computador e 16,9% têm acesso à internet, de acordo com os dados mais recentes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad), do IBGE. Segundo pesquisa da Ibope/NetRatings, cerca de 37 milhões de brasileiros têm acesso à internet, dos quais 30 milhões diretamente de suas casas. Desse total, 19 milhões são usuários ativos, dos quais 78% têm acesso por banda larga.
A banda larga já domina o mercado de internet: saiu de 343 000 conexões em 2001 para 6,5 milhões em 2007, segundo levantamento realizado pela consultoria IDC e pela Cisco. A maior parte desses acessos - 4,9 milhões - é feita por ADSL, tecnologia em que os dados trafegam pela linha telefônica, mas a modalidade de acesso que mais cresce hoje é a por cabo, oferecida pelas empresas de TV por assinatura - 1,4 milhão.
Os assinantes de banda larga se dividem hoje pela velocidade com que acessam à internet - que pode variar entre 256 kilobits por segundo (kbps) a 20 megabits por segundo (mbps), dependendo do preço que o assinante está disposto a pagar e da região em que vive. Quase 61% pagam por uma conexão com velocidade de até 1 mbps. Apenas 8,9% dos assinantes têm acesso entre 2 e 8 mbps e 1%, acima de 8 mbps.
Há ao menos dois problemas bastante claros que impedem a massificação do acesso à internet banda larga no Brasil: preço e disponibilidade. Um usuário que quiser ter uma conexão banda larga ADSL na velocidade mais baixa em sua casa não encontrará nada que custe menos de 50 reais, ou 26 dólares. Cerca de 40% desse valor se refere a impostos. Na Argentina, para ter acesso a uma conexão semelhante, o consumidor paga o equivalente a 19 dólares. Se quiser ter um acesso com velocidade de 10 mbps, o brasileiro pagará 211 dólares, enquanto o argentino pagará 163 dólares.
"O problema da internet banda larga brasileira não é qualidade. Mas as operadoras oferecem as velocidades de conexão mais altas a preços muito altos, pois o mercado ainda é pequeno", diz o analista de Telecom da IDC, Vinicius Caetano. Segundo ele, a atual estrutura do ADSL permite conexões com velocidade de até 20 mbps, mas as empresas disponibilizam até 8 ou 10 mbps por questões mercadológicas. "A estratégia delas é lançar, aos poucos, conexões com velocidades maiores e retirar do mercado as velocidades menores, sem promover redução de preços na faixa mais baixa, pois a margem a 50 reais já é pequena", acrescenta.
Em mercados amadurecidos, com grande número de assinantes, o custo da conexão se dilui entre os consumidores. Nos Estados Unidos, por exemplo, a velocidade de 20 mbps já é bastante comum e, no Japão, a conexão top chega a 100 mbps. Mas, para muitas pessoas, não é o preço que impede o acesso à banda larga, e sim a falta de oferta desse serviço na maioria das regiões. Cerca de 65% dos 5 560 municípios brasileiros não são atendidos por serviços de banda larga, de acordo com estimativa do governo federal. Metade da Região Metropolitana de São Paulo não dispõe do serviço.
As alternativas do governo para resolver essa questão passam pela aplicação das verbas do Fundo de Universalização dos Serviços de Telecomunicações (Fust) - que acumulava, até julho de 2007, cerca de 6 bilhões de reais -, pela licitação da 3.ª geração de celular e por negociações com as operadoras. Em 2003, foi definido por decreto que as companhias teriam como obrigação instalar Postos de Serviço de Telecomunicações (PSTs) para atender à população e oferecer telefones públicos e terminais com acesso à internet em cada um dos municípios brasileiros com mais de 50 000 habitantes. Como até hoje as empresas não cumpriram essa meta, o governo entende ser mais interessante substituir os PSTs pela instalação da infra-estrutura para a banda larga.
Segundo o coordenador de políticas de inclusão digital do governo, o assessor especial da presidência da República Cezar Alvarez - responsável por articular cerca de dez ministérios em torno de uma política nacional de longo prazo para o tema e pelos programas "Computador para Todos" e "Um Computador por Aluno" -, o embate está em torno da quantidade de municípios a serem atendidos. O governo quer a estrutura em todos, mas as empresas alegam que o custo superaria os gastos em PSTs e, por isso, querem atender apenas parte deles. O resultado dessa briga deve sair no final de 2007.
Dessas negociações depende o cumprimento da meta que o governo traçou para 2010. Até lá, todas as 120 000 escolas públicas deverão ter ao menos um laboratório de informática com acesso à internet. Entre as 17 000 escolas de ensino médio, a meta já está praticamente cumprida. Neste ano, 12 000 escolas de ensino fundamental foram equipadas. Em 2008, 13 000 devem receber laboratórios e 150 000 laptops do programa "Um Computador por Aluno" devem ser distribuídos. Segundo o Ministério da Educação, o investimento em equipamentos para escolas aumentou de 75 milhões de reais em 2006 para 150 milhões de reais neste ano, e deve dobrar em 2008.
"Nosso objetivo é promover uma ampla alfabetização digital e dinamizar as aulas para todos os estudantes, independente da renda. Vamos oferecer a infra-estrutura, capacitação e conteúdo digital de qualidade", diz o secretário de Educação a Distância do MEC, Carlos Eduardo Bielschowsky. Há discussões também sobre a possibilidade de abrir alguns laboratórios para uso da comunidade local nos fins-de-semana e em horários alternativos já a partir do início do ano.
Inclusão digital
Entretanto, para a população das classes D e E, da qual fazem parte 44% dos brasileiros, o uso do computador e o acesso à internet ainda estão restrito aos centros públicos. Segundo pesquisa da Latin Panel, que analisa hábitos de consumo das famílias brasileiras, apenas 3% dos domicílios das classes D e E possuem computador e acesso à internet.
Além disso, o avanço da presença de computadores e internet nos lares brasileiros nos últimos anos mostra que as desigualdades regionais permanecem. O Brasil figura na 49.ª posição em um ranking de 162 países organizado pela agência da ONU especializada em telecomunicações, com 16,1 computadores a cada 100 habitantes, e em 76.º lugar em uma lista de 193 países sobre acesso à internet, com 17,2 % de sua população total com acesso à rede. No entanto, dados da Pnad de 2006 indicam que, enquanto na região Sudeste 29,2% das residências têm um computador e 23,1%, acesso à internet, no Norte apenas 9,8% das casas possuem um computador e 6%, acesso à rede. No Nordeste, os índices são de 9,7% e 6,9%, respectivamente. Apenas 3,5% dos brasileiros e 13% dos domicílios têm acesso à banda larga, mas cerca de 40% desses acessos concentram-se em São Paulo, informa a IDC.
"Diferentemente dos países desenvolvidos, no Brasil temos um desafio muito grande a enfrentar, que é a enorme desigualdade digital que temos dentro do próprio país. É muito mais dramática a desigualdade digital interna entre regiões como o Norte e o Sudeste do que entre o Brasil e países desenvolvidos", diz o presidente da Rede de Informação Tecnológica Latino Americana (Ritla), Jorge Werthein.
Para essa parcela expressiva da população, a inclusão digital passa por 16 722 centros de acesso público existentes em 3 000 municípios - nem todos com banda larga - e por 108 projetos de inclusão digital desenvolvidos por ONGs em parceria com o setor privado - dados do Instituto Brasileiro de Informação em Ciência e Tecnologia (Ibict), órgão ligado ao Ministério de Ciência e Tecnologia.
A IBM, por exemplo, tem como política doar laboratórios de informática e capacitar multiplicadores para trabalhar em instituições que atendem crianças, adolescentes, adultos, idosos e deficientes visuais. O objetivo é trazer a tecnologia para a realidade de pessoas que não teriam outra forma de acessar a internet e aliar o conhecimento a princípios de cidadania, além de oferecer melhores condições na disputa por uma vaga de trabalho. Da mesma forma, o Instituto Ayrton Senna, em parceria com a Microsoft, tem como foco a inclusão digital de crianças e adolescentes em diversas comunidades de baixa renda em todo o país.
Ainda assim, apenas 2,8% dos brasileiros acessam a internet por meio de centros públicos, indica a Pnad. "Os telecentros estão sendo visitados pelas classes C e D, mas não tanto pela E. O pior é que ninguém sabe o porquê. É necessário fazer uma profunda investigação sobre como esses centros estão funcionando e se eles cumprem sua função social, dado o volume significativo de recursos que recebem", diz Werthein, da Ritla.
Embora não explique toda a complexidade da situação, a gerente de atendimento da Latin Panel, Fátima Merlin, fornece uma reflexão sobre o tema. "Quando perguntamos às classes D e E o que gostariam de adquirir caso tivessem uma melhoria de renda, uma parcela bastante expressiva respondeu que desejava comprar eletroeletrônicos, mas 24% responderam que comprariam mais comida. Quer dizer, ainda temos uma grande parte da população ávida para consumir o básico", diz Fátima.