Celunol quer usina de etanol celulósico em 2008
Empresa vai começar a erguer usina de médio porte no próximo ano, diz presidente
Da Redação
Publicado em 9 de outubro de 2008 às 12h18.
Nove anos atrás, a empresa ainda se chamava BC International, mas já apostava numa tecnologia promissora: o etanol extraído da celulose. A companhia inaugurou em 1998 uma usina experimental para produzir o biocombustível no estado americano da Louisiana. A iniciativa não deu certo, pois o etanol era obtido a um preço muito alto. Hoje, rebatizada de Celunol, a empresa volta ao mesmo estado para construir uma nova planta. Agora, diz o presidente Carlos Riva, as condições são melhores. Em fevereiro a companhia fundiu-se com outra empresa de biotecnologia, a Diversa, que tem ações negociadas na Nasdaq, a bolsa eletrônica americana. Riva conversou com EXAME pelo telefone, de Cambridge, Massachusetts, sobre as perspectivas das novas tecnologias de biocombustíveis.
EXAME - Qual é a tecnologia da Celunol para a obtenção de etanol de celulose?
Carlos Riva - Nosso processo é baseado no uso de micróbios para fermentar o açúcar e transformá-lo em combustível. Usamos ácidos e enzimas para quebrar a biomassa em açúcares e, depois, obter o etanol. Temos uma usina piloto na Louisiana e estamos planejando uma usina de demonstração (que tem capacidade superior, mas ainda insuficiente para a produção comercial). A idéia é que possamos produzir cerca de 5 milhão de litros de etanol por ano. Na usina piloto, testamos vários tipos de material celulósico. Já a usina de demonstração, que é 30 vezes maior, a idéia é funcionar continuamente e em modo comercial, embora seja pequena. Depois, devemos aumentá-la ainda mais, para chegarmos a algo como 100 milhões litros anuais. Mais adiante, nosso plano é operar diversas usinas. E já licenciamos nossa tecnologia para um empreendedor japonês, que ergueu uma usina de demonstração na região de Osaka.
EXAME - Qual é o investimento necessário para erguer uma usina de etanol celulósico?
Riva - No caso da nossa usina de 100 milhões de litros por ano, estimamos algo entre 125 milhões e 150 milhões de dólares.
EXAME - Qual é a vantagem de ser uma empresa iniciante nos Estados Unidos, onde há acesso fácil ao capital de risco e eventualmente uma abertura de capital?
Riva - Bem, a Diversa já é uma empresa de capital aberto e quando a fusão for efetivada nós também seremos. Isso nos ajuda a obter capital nos mercados públicos, o que é fundamental para financiar nossa expansão. Além disso, estamos na disputa por alguns tipos de garantia do Departamento de Energia para facilitar a obtenção de crédito junto aos bancos comerciais. E também conseguimos uma verba do governo para as nossas pesquisas.
EXAME - Qual é a peculiaridade da tecnologia da Celunol em comparação com as várias outras maneiras de obter etanol de celulose?
Riva - Usamos bactérias modificadas geneticamente, e tudo isso é patenteado. Também temos patentes que protegem o nosso sistema de produção. O trabalho científico foi desenvolvido na Universidade de Flórida, com recursos da nossa empresa. Portanto, a universidade detém as patentes, e nós temos o direito de uso exclusivo em todo o mundo. Nossos microorganismos são muito eficientes.
EXAME - Qual é a diferença dessa abordagem em comparação com os métodos tradicionais usados nas usinas de milho e cana-de-açúcar?
Riva - É bastante diferente. No milho, por exemplo, os açúcares não estão presos na celulose e, portanto, são relativamente fáceis de se obter. No etanol celulósico, estamos falando de várias biomassas diferentes, como madeira, capins, bagaço de cana. Em geral, tem sido mais difícil quebrar essa biomassa para obter o açúcar. Outra distinção importante é: uma vez que você consegue obter a quebra da celulose, há dois tipos de açúcares, um de cinco moléculas de carbono, e outro de seis moléculas de carbono. As leveduras usadas hoje em dia não são muito eficientes para quebrar o açúcar de cinco moléculas de carbono. Então, parte do nosso trabalho é aproveitar esse componente para conseguirmos uma produtividade maior. Essas são as questões fundamentais. A Diversa, empresa com a qual nos fundimos, é uma das principais empresas de enzimas especializadas do mundo. Têm uma vasta biblioteca genética para nos ajudar com as enzimas ideais para os nossos processos. A união das duas companhias faz muito sentido. E muito do nosso trabalho tem sido baseado no uso do bagaço de cana-de-açúcar, que é muito comum no Brasil.
EXAME - E como o senhor pretende obter essa matéria-prima?
Riva - Temos bons contatos na Flórida e na Louisiana, onde há a maior produção de cana nos Estados Unidos. Temos acordos com os produtores dessa região para usar seu bagaço. Também temos experiências com o que chamamos de "canas energéticas", parecidas com a cana-de-açúcar, que podem ser usadas como biomassa em nossas usinas.
EXAME - Em termos de produtividade, qual é o tipo de biomassa que gera mais etanol?
Riva - Há várias opções. Hoje, a questão é o custo. Qual é a mais barata, na região da sua usina? Essa é a medida mais importante. Nosso processo é basicamente indiferente com relação à biomassa. O importante é saber onde estaremos localizados.
EXAME - E na comparação de produtividade com milho e cana-de-açúcar?
Riva - Bem, há diferenças importantes. O etanol de celulose vai utilizar uma matéria-prima de baixíssimo custo. O milho, aqui nos Estados Unidos, é caro. Está perto de 4 dólares o fardo. Já no caso do celulósico, estamos falando de resíduos ou sobras da agricultura. Não há outros usos para essa biomassa. Não há a questão da comida, por exemplo. A nossa desvantagem é o custo atual é muito mais alto do que o de grãos, por exemplo. Temos o problema da questão de quebrar a biomassa, por exemplo. Mas só estamos começando a desenvolver essa tecnologia e ainda não chegamos ao ponto atingido pelo etanol de milho, por exemplo. Acredito que, com o tempo, seremos eficientes e teremos um custo aceitável.
EXAME - E o senhor tem uma previsão de quando esses ganhos de eficiência vão ocorrer?
Riva - Não. Isso tudo depende de vários fatores. Nós devemos começar nossa usina de escala comercial deve começar a ser construída no próximo ano. Eu diria que dentro de cinco anos teremos um número razoável de usinas e a partir daí o progresso será muito rápido.
EXAME - O senhor teve contato com usinas brasileiras? Algum tipo de negociação sobre licenciamento da tecnologia, por exemplo?
Riva - Ainda não fizemos contato, mas é um desejo. Nosso foco, por enquanto, é terminar nossa usina de demonstração. Mas é uma questão de falta de tempo, acima de tudo. Certamente vamos abrir um diálogo com os produtores brasileiros. Podemos usar o bagaço que hoje é queimado pelas usinas brasileiras e usá-lo para fazer etanol celulósico, o que aumentaria a produtividade.