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As redes sociais e a aposta no áudio: o que ficou do efeito Clubhouse?

Em entrevista à EXAME, especialistas do Instituto de Tecnologia Social mostram as diversas possibilidades que o futuro promete depois do ClubHouse

 (SOPA Images/Getty Images)

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Laura Pancini

Publicado em 24 de março de 2021 às 07h30.

Última atualização em 24 de março de 2021 às 10h50.

Clubhouse App

Clubhouse: o sucesso do app com um novo formato de áudio pegou de surpresa as redes sociais dominantes (Thomas Trutschel/Photothek/Getty Images)

Uma rede social de conversas de voz, em que qualquer usuário abre uma sala virtual, define um tema e sai debatendo o assunto com outros convidados para uma plateia virtual. Não há vídeos, nem fotos. Apenas áudio. E nenhuma conversa fica gravada. Foi com esse formato inusitado -- e uma boa dose de marketing viral -- que o Clubhouse atraiu milhões de novos usuários em janeiro e fevereiro, se tornando um dos aplicativos mais baixados dos primeiros meses de 2021. Mas o tempo passou e a febre do Clubhouse diminuiu. Há quem já tenha o desinstalado ou esquecido dele -- embora haja usuários fieis.

Seja qual for o destino do app daqui para frente, o que o efeito do Clubhouse mostrou, segundo especialistas ouvidos pela EXAME, é que o reinado das redes sociais dominantes, como Facebook e Twitter, ainda pode ser confrontado por empresas de tecnologia novatas com modelos inovadores.

Formatos como os áudios do Clubhouse, dos vídeos curtos do TikTok ou das fotos sem edição da Dispo são exemplos de como ainda há espaço para evoluir no mercado das redes sociais, para atrair usuários e competir contra os gigantes. O desafio de todas as empresas -- grandes ou pequenas -- é manter as pessoas engajadas, para que elas passem o maior tempo possível interagindo com outros usuários na plataforma, sem se cansar.

Para falar sobre o tema, a EXAME conversou com especialistas do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio) para entender quais foram as lições da febre do Clubhouse e o que esperar das redes sociais daqui para frente. Confira a seguir:

Os gigantes tentam se adaptar

O ClubHouse se tornou o novo aplicativo do momento no início de 2021. A rede social com foco na voz,  disponível apenas para iOS e através de convites, recebeu 10 milhões de instalações só em fevereiro, de acordo com dados do SensorTower.

Nela, usuários entram em salas de bate-papo que cabem até 5.000 pessoas para discutir tópicos de mesmo interesse. No fim de 2020, o aplicativo foi avaliado em 100 milhões de dólares, muito antes da participação de Elon Musk em um chat fazer com que o aplicativo começasse a bombar do dia para a noite. 

Mark Zuckerberg, fundador do Facebook, e Jack Dorsey, do Twitter, já encontraram formas de replicar o estilo do ClubHouse. Assim como os stories partiram do Instagram para todas as outras redes imagináveis, as salas do ClubHouse tiveram sua fórmula reproduzida (embora não exatamente) pelos gigantes.

Em fevereiro, o Twitter divulgou o Spaces, funcionalidade que será lançada para todos os usuários em abril e que permite que um grupo de até 10 pessoas se reúna para debater um assunto diante de uma audiência. Já o Instagram anunciou que agora suas lives poderiam ter até três outros convidados. Antes, só mais um convidado tinha acesso.

Seguindo os passos do TikTok, o YouTube anunciou o Shorts, uma ferramenta para produção de vídeos curtos em seu aplicativo móvel que, por enquanto, só está disponível nos Estados Unidos.  O Instagram também já tentou sua versão de criação de vídeos curtos com o Reels.

Todos têm recursos que permitem o usuário filmar, editar e compartilhar vídeos que não ultrapassam 1 minuto e navegação semelhante ao do TikTok. O diferencial do Shorts é que os usuários podem achar um áudio através de um vídeo do YouTube e criar um vídeo com o som facilmente, clicando em um botão "criar" logo abaixo das informações do canal.

De resto, tanto o Reels quanto o Shorts seguem recursos muito semelhantes aos do aplicativo chinês, que tem 689 milhões de usuários ativos mensais de acordo com pesquisa do Business of Apps.

“É uma lógica de mercado. Essas plataformas estão, sim, tentando inovar, mas elas usam seu poder para engolir a inovação de novos concorrentes. Os de fora precisam achar alguma coisa muito difícil de copiar para se destacar”, diz Victor Barcellos, especialista de Comunicação Digital da ITS-Rio. “Elas têm uma tendência ao monopólio, porque competem por número de usuários e atenção.”

O futuro do Instagram é fora dele

Buscando redes sociais que já estão ao nosso alcance, o Dispo tem potencial para se tornar o próximo app de sucesso. A ideia partiu do criador de conteúdo David Dobrik, que acumula 55 milhões de seguidores no YouTube, Instagram e TikTok. 

O Dispo traz a espontaneidade da câmera analógica para o digital e, de quebra, ainda compete com o Instagram como uma versão menos focada na foto perfeita. O usuário tira uma foto pelo aplicativo e só pode ter acesso a ela 24 horas depois, quando é publicada automaticamente no seu feed de notícias para seus seguidores.

“A ideia é justamente evitar aquela neurose coletiva de editar a foto ou colocar filtro e restaurar aquela experiência que perdemos quando fomos para a câmera digital”, diz João Victor Archegas, especialista em Direito e Tecnologia na ITS-Rio.

O Dispo foi lançado para todo o público na última semana de fevereiro e recebeu meio milhão de instalações no iOS. Apesar de começar o ano com um aporte de 20 milhões de dólares enquanto o aplicativo contava com apenas 10 mil usuários, um escândalo envolvendo o criador de conteúdo fez com que sua startup perdesse o apoio da Spark Capital, empresa de capital de risco, e levou a sua renúncia do conselho.

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Twitter e a loja de algoritmos

Uma crítica constante recebida pelas redes sociais dominantes no mercado é o problema dos algoritmos. Seu intuito é personalizar o conteúdo recebido pelo usuário, tentando garantir que ele vai gostar das publicações em seu feed e, consequentemente, passar mais tempo na plataforma.

É novamente a lógica de mercado, mas, com os anos, a comunidade virtual vem criticando mais e mais a otimização desta funcionalidade, que acaba criando bolhas e isolando usuários de opiniões e conteúdos diferentes.

A resposta do Twitter para este problema foi o projeto BlueSky, que dá a possibilidade do usuário ter mais controle e mais gerência sobre o algoritmo que faz a seleção dos conteúdos recebidos. A plataforma funcionaria como uma loja de aplicativos, onde o usuário pode visitar e escolher qual algoritmo ele quer usar para fazer a seleção e filtro do conteúdo.

Para Jack Dorsey, a plataforma seria "padrão para a camada de conversação pública da Internet". Ela conta com uma variedade de sistemas descentralizados, que, de acordo com relatório divulgado pela empresa, "lidam com os principais elementos da rede social, como descoberta, moderação e privacidade".

“É uma ideia que vem em resposta a essas críticas que as redes sociais vem sofrendo em relação aos seus algoritmos”, explica Archegas, que acredita que o sucesso deste projeto do Twitter pode não ser tão garantido. “Ele [o Twitter] já está bem estigmatizado, assim como o Facebook.”

Outro fator que pode levar ao fracasso do projeto, ainda sem data para lançamento, é que a descentralização não é tão lucrativa. A privacidade do usuário, ou a não coleta de dados no geral, podem acabar custando caro para Dorsey.

Há um fim para a coleta de dados?

Apesar do conceito de escolher seu próprio algoritmo ser chamativo, o crescente descontentamento de usuários por conta da coleta de dados também abre espaço para redes sociais que priorizam a privacidade

O anúncio do WhatsApp sobre a coleta de dados obrigatória para ser compartilhada com o Facebook fez com que o número de instalações no Telegram e Signal, concorrentes que são mais restritos com o uso de dados, crescesse 91% e 4.200% em uma semana, respectivamente. Porém, para Archegas, a coleta de dados é inevitável se as empresas querem competir no mercado de aplicativos.

“Acho que é possível [a não coleta de dados] se o mercado como um todo mudar, e isso não está fora do horizonte de possibilidades”, analisa Archegas, que ressalta que o mercado de redes sociais já transformou totalmente antes. Ele sugere que uma alternativa para a coleta de dados possa ser uma assinatura paga, como fazem Netflix e Amazon Prime

“Monetizar a plataforma através de uma assinatura pode quebrar essa lógica de anúncios que perturbam a experiência do usuário”, concorda Barcellos. “Eles dizem que quando o produto é gratuito, quer dizer que você é o produto. Com uma assinatura, você teria uma segurança que suas preferências não estão sendo usadas para direcionar anúncios.”

Facebook aposta na realidade virtual

Vislumbrando as possibilidades da rede social do futuro, Archegas realçou que a resposta pode estar em um hardware diferente do que estamos acostumados. Os computadores e celulares limitam as funções disponíveis ao compartilhamento de imagens, vídeos e áudio. O Pokémon Go, aplicativo de realidade aumentada no qual jogadores podem caçar as criaturas da animação pela própria cidade, é o maior exemplo do quão longe é possível ir atualmente dentro destes parâmetros, de acordo com o especialista.

No meio disso, surge a realidade virtual e a possibilidade da próxima rede social estar em um dispositivo completamente diferente do que a maioria está acostumada. O Facebook já está na frente desta corrida com a sua subsidiária Oculus, desenvolvedora de produtos de realidade virtual, comprada pela empresa em 2014.

“O Facebook está buscando entender se, no futuro, a rede social vai funcionar também no ambiente de realidade virtual”, explica Archegas, que comenta que o interesse de Zuckerberg na Oculus se dá por conta também da Apple e a Samsung já dominarem o mercado de celulares móveis. “Quando, de fato, vamos ter essa rede social é difícil prever. Pode ser em cinco anos ou talvez a moda nunca pegue. Mas, eu acho que o Facebook está no caminho certo.” 

A Oculus já lançou duas versões do Oculus Quest, seu óculos de realidade virtual. Recentemente, Zuckerberg anunciou que as versões 3 e 4 já estão nos planejamentos e devem chegar em breve ao mercado. Atualmente, o Quest 2 está disponível por 299 dólares no site da empresa.

“Uma das coisas que estou realmente animado para as versões futuras é conseguir o rastreamento ocular e o rastreamento facial. Você quer ter certeza de que o dispositivo tem todos os sensores para realmente animar de forma realista avatares para que você possa se comunicar bem”, explicou Zuckerberg recentemente em uma entrevista ao The Information.

O Facebook Horizon, jogo lançado em 2020 mas que ainda continua na versão Beta e com entrada através de convites exclusivos, é uma das apostas para a próxima rede social. Ela está disponível no Quest 2 e no Rift, outro produto de realidade virtual da Oculus, voltado para computadores. No jogo, as pessoas são representadas por avatares no espaço digital e podem interagir entre si e adentrar construções virtuais, como acontece no jogo Minecraft da Microsoft.

https://www.youtube.com/watch?v=Is8eXZco46Q

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