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60% dos grandes herbívoros correm risco de extinção

A única representante brasileira no grupo é a anta (Tapirus terrestres), que pode chegar a 300 kg e também está sob ameaça de extinção


	A única representante brasileira no grupo é a anta (Tapirus terrestres), que pode chegar a 300 kg e também está sob ameaça de extinção
 (Ryan Poplin/Flickr)

A única representante brasileira no grupo é a anta (Tapirus terrestres), que pode chegar a 300 kg e também está sob ameaça de extinção (Ryan Poplin/Flickr)

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Da Redação

Publicado em 1 de julho de 2015 às 11h56.

São Paulo - De acordo com uma revisão publicada recentemente na revista Science Advances, 60% das espécies remanescentes de grandes mamíferos herbívoros – aqueles com massa corporal igual ou maior que 100 quilogramas – correm risco de extinção. Quase todas as populações ameaçadas estão nas nações em desenvolvimento.

Os dados são da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN, na sigla em inglês) e foram levantados por cientistas de vários países, sob coordenação de William Ripple, da Oregon State University, nos Estados Unidos. Entre os autores está o pesquisador brasileiro Mauro Galetti, do Departamento de Ecologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) em Rio Claro.

“Lugares como a savana africana estão se tornando paisagens vazias e isso não é apenas uma questão ética ou estética. Afeta o funcionamento dos ecossistemas naturais. Todas essas espécies desempenham funções ecológicas importantes e, se elas desaparecerem, ninguém conseguirá substituí-las”, disse Galetti em entrevista à Agência FAPESP.

Das 74 espécies de mamíferos terrestres que compõem o grupo dos grandes herbívoros, 71 ocorrem em países em desenvolvimento e somente 10 nos países desenvolvidos.

A única representante brasileira no grupo é a anta (Tapirus terrestres), que pode chegar a 300 kg e também está sob ameaça de extinção.

De acordo com o artigo, os grandes herbívoros ocupam atualmente, em média, apenas 19% das suas áreas de ocorrência históricas.

“Isso é exemplificado pelo elefante (Loxodonta africana), pelo hipopótamo (Hippopotamus amphibius) e pelo rinoceronte negro ocidental (Diceros bicornis), que hoje ocupam pequenas frações de suas áreas históricas na África.

Além disso, muitas dessas espécies em declínio são pouco conhecidas cientificamente e necessitam seriamente de pesquisas ecológicas de base”, ressaltam os pesquisadores.

Também no caso da anta, disse Galetti, a área de ocorrência vem encolhendo nos últimos anos. Os cientistas não sabem ao certo qual é o tamanho da população remanescente no país.

“Originalmente, a anta era encontrada em praticamente todos os biomas brasileiros, mas hoje já há vários lugares da Mata Atlântica em que ela desapareceu. As causas principais são a caça ilegal, o desmatamento, a expansão agrícola e atropelamentos”, afirmou.

A caça, a expansão da pecuária e as mudanças no uso da terra – que incluem perda de habitat, invasão humana (como construção de estradas), plantações e desmatamento – são apontadas no artigo como as principais ameaças para os grandes herbívoros.

A vulnerabilidade desses animais é agravada pelo fato de se reproduzirem lentamente.

A caça ilegal voltada à obtenção de partes valiosas do corpo, como, por exemplo, presas e chifres, tem causado um declínio dramático na população de elefantes e rinocerontes em partes da África e na Ásia Meridional, revertendo décadas de esforços de conservação, disse o artigo.

A perda de habitat é uma ameaça significativa principalmente na América Latina, na África e no sudeste da Ásia e, segundo os autores, a causa tem origem nos países desenvolvidos e em sua demanda por produtos agrícolas e outras commodities.

“O Sudeste da África tem a maior taxa de desmatamento nos trópicos e, se o ritmo se mantiver, a região poderá perder 75% de suas florestas originais e quase metade de sua biodiversidade até o fim deste século”, ressaltaram os cientistas.

No caso da América do Sul, o processo de defaunação pode ter tido início há 10 mil anos, coincidindo com a chegada do homem ao continente. “Havia espécies de preguiça gigantes, tatus do tamanho de um fusca e outras menos conhecidas, mas a região já foi transformada em uma paisagem vazia. Há uma controvérsia na literatura científica sobre a principal causa ter sido o clima ou as ações humanas. Os impactos para o ecossistema estão só começando a ser compreendidos”, disse Galetti.

Consequências

Por consumirem grandes quantidades de vegetação, explicou o pesquisador, esses mamíferos ajudam a moldar a estrutura dos ecossistemas, prestando serviços como ciclagem de nutrientes, dispersão de sementes e controle de fogo.

“A quantidade de matéria orgânica que esses animais reciclam é enorme. Se eles desaparecerem em biomas como o cerrado brasileiro ou a savana africana, a vegetação vai crescer, secar e eventualmente vai pegar fogo”, disse Galetti.

No Brasil, acrescentou o pesquisador, espécies de plantas que possuem sementes grandes, como jatobá (Hymenaea courbaril), buriti (Mauritia flexuosa) e palmito amargoso (Syagrus oleracea), e muitas outras plantas são dependentes da anta para dispersão.

“Além disso, as antas competem por alimento com diversos roedores, ajudando a controlar populações prejudiciais à saúde humana por transmitir doenças como hantavirose.

A anta também é um dos poucos animais que servem de presa e ajudam a sustentar as populações da onça-pintada (Panthera onca), que por sua vez controlam vários animais que podem ser daninhos ao homem”, disse Galetti.

Os grandes herbívoros são a principal fonte de alimento para animais como leão (Panthera leo), hiena (Crocuta crocuta), tigre (Panthera tigris) e também para os animais menores que se alimentam das carcaças, como coiotes (Canis latrans), raposas (Vulpes vulpes), corvos (Corvus corax e águias (Haliaeetus spp.).

O declínio dos grandes herbívoros causa ainda efeitos diretos nos humanos, especialmente no que se refere à segurança alimentar nas regiões em desenvolvimento, ressaltou o artigo.

“Estima-se que 1 bilhão de pessoas dependem de carne de caça para subsistência e ela deve diminuir em torno de 80% nas florestas africanas nos próximos 50 anos. Além disso, os mais carismáticos e emblemáticos herbívoros atraem muitos turistas para áreas protegidas. O declínio do turismo deve afetar as balanças comerciais e as taxas de emprego principalmente nas áreas rurais do mundo em desenvolvimento”, diz o texto.

Direções futuras

Na avaliação dos autores, o esforço para salvar os grandes herbívoros remanescentes deve incluir a redução das taxas de natalidade humanas, diminuição do consumo de carne de ruminantes, combate da caça ilegal, expansão e maior financiamento de áreas protegidas e combate às mudanças climáticas.

O artigo ressalta ainda a necessidade de pesquisas sobre as espécies mais ameaçadas no sudeste asiático, África e na América Latina, entre elas o Búfalo-anão-de-Mindoro (Bubalus mindorensis), cabra-das-rochosas (Capra walie), suínos da espécie Sus cebifrons e Sus oliveri e outras sobre as quais também há menos de dez artigos científicos publicados.

No Brasil, uma espécie de anta recentemente descrita e denominada Tapirus kabomanii pode estar criticamente ameaçada pela caça e mineração na sua área de ocorrência.

“Em particular, mais pesquisas são necessárias para entender como o aumento da densidade humana e da pecuária, a mudança climática, a perda de habitat, a caça e as diferentes combinações desses fatores afetam esses grandes herbívoros”, afirmaram.

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