Reduza juros e libere recursos para desatar o nó das finanças e sair da forca (SXC)
Da Redação
Publicado em 26 de fevereiro de 2013 às 16h35.
São Paulo - Tomar crédito para comprar bens de alto valor, como um carro ou um imóvel, ou mesmo um eventual descuido das finanças pode ocorrer com qualquer pessoa e nem sempre enforca o devedor. Mas e quando uma dívida foge do controle e atinge uma cifra astronômica? O que fazer, por exemplo, quando uma doença na família, um forte descontrole financeiro ou uma perda de emprego geram uma dívida da ordem de 100 mil reais?
Segundo a Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), em fevereiro deste ano, 61% das famílias tinham algum tipo de dívida a pagar, ainda que sem qualquer parcela em atraso, maior patamar em 12 meses. Na faixa de quem ganha mais de dez salários mínimos, esse percentual foi de 54%. O percentual de dívidas em atraso foi de 22%, maior patamar desde junho de 2012, sendo 24,5% entre quem ganha menos de dez salários mínimos e 12,3% entre quem ganha mais de dez salários mínimos.
Veja a seguir o que fazer se você tem dívidas que somam centenas de milhões de reais e o passo a passo para se reorganizar e quitar seus débitos:
1. Amortize a dívida, não pague apenas juros
Primeira coisa é entender que, para que a dívida seja quitada, parte da parcela deve ser composta por juros e parte dela pela amortização, que é o pagamento do principal. Suponha que você tenha uma dívida de 100 mil reais, com taxa de juros de 2% ao mês. A primeira parcela terá 2 mil reais só de juros. “Isso significa que o devedor deve ter uma capacidade de pagamento de mais de 2 mil reais, para amortizar a dívida também”, explica Samy Dana, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV) e coautor do livro "Como passar de devedor a investidor".
Segundo o mesmo exemplo, ele explica que se o devedor conseguisse, por exemplo, pagar 6 mil reais no primeiro mês, a dívida cairia para 96 mil reais – 2 mil de juro mais 4 mil de pagamento do principal. No segundo mês, portanto, o juro de 2% incidiria sobre 96 mil reais, correspondendo a 1.920 reais. Se o devedor só pagasse os 2 mil reais de juro, sua dívida permaneceria em 100 mil reais, gerando um novo custo de 2 mil reais em juros no segundo mês. Se pagasse menos que os juros, por sua vez, a dívida ia crescer, uma vez que os juros do mês seguinte incidiriam sobre o principal e os juros não pagos do mês anterior.
2. Defina sua capacidade de pagamento
Em função disso, é fundamental que você defina uma capacidade de pagamento que exceda o valor dos juros que você está pagando. Por isso, a primeira atitude do inadimplente deve ser o de mapear todas as dívidas, as taxas de juros que incidem sobre cada uma e fazer uma faxina financeira, de modo a liberar uma quantia mensal para honrar as parcelas da dívida.
3. Troque dívidas caras por dívidas baratas
Se os juros que você paga estão altos ou você tem inúmeras dívidas, em atraso ou não, com credores diferentes, considere unificar tudo em um único empréstimo com juros menores. “Dever no cartão de crédito ou no cheque especial é suicídio financeiro”, diz Samy Dana. Os juros do rotativo do cartão custam, em média, 9,37% ao mês, e os juros médios do cheque especial custam 7,77% ao mês, segundo a Anefac. Já os juros médios do comércio batem 4,00% ao mês. Troque essas dívidas caras por linhas mais baratas, como o crédito consignado, com desconto em folha, que custa em média 1,8% ao mês, segundo o Banco Central. Já o empréstimo pessoal sai em média por 2,93% ao mês.
Existem duas maneiras principais de fazer essa troca: uma é renegociação com o próprio banco, tomando um empréstimo mais barato na instituição financeira com a qual você já tem relacionamento e onde deve a juros mais altos; a outra é por meio da portabilidade, que lhe permite migrar a dívida para outro banco que ofereça linhas de crédito mais baratas que o banco onde você se endividou. Esta última modalidade é mais vantajosa para linhas que não sejam financiamento habitacional, pois nesse caso os custos de cartório podem anular a diferença dos juros.
De qualquer maneira, a possibilidade da portabilidade pode ser usada como argumento para negociar com o seu banco credor, uma vez que se a concorrência oferece taxas mais baratas, pode ser que seu gerente se disponha a dar um desconto para você. Às vezes até trocar de agência de banco pode ajudar, pois outro gerente tem interesse em captar novos clientes.
4. Apresente garantias
As linhas de crédito mais vantajosas em geral são aquelas em que você pode pôr um bem em garantia. O crédito consignado é barato em relação às demais linhas porque a garantia é o seu próprio salário, desde que você tenha certa estabilidade no emprego e seu empregador tenha convênio com a instituição financeira.
Mas há outras modalidades: uma bastante interessante é o refinanciamento, em que você pode pôr um carro ou um imóvel quitado como garantia do empréstimo. O refinanciamento imobiliário é particularmente indicado para dívidas de altos valores, da ordem das centenas de milhares de reais. Normalmente é possível conseguir de 50% a 70% do valor do imóvel de empréstimo, a uma taxa de juros que costuma ficar entre 1% e 2% ao mês, e prazos de até 30 anos.
5. Priorize as dívidas mais nocivas
A união de vários débitos em uma única dívida bancária a juros baixos é particularmente indicada não só para quem tem dívidas a juros muito altos, mas também para atrasou o pagamento de dívidas que podem dilapidar o patrimônio ou incorrer no corte de serviços essenciais.
Priorize o pagamento das dívidas que podem levar à penhora de bens ou a punições na esfera criminal, como atraso de impostos, pensão alimentícia e linhas de crédito que têm um bem como garantia. Por exemplo, dever imposto de renda pode levar a uma multa pesada, mais juros equivalentes à Selic, e a sonegação deliberada pode dar cadeia. Atraso no pagamento do IPTU, da taxa de condomínio, de dívidas trabalhistas com empregados domésticos e de financiamentos que tenham o seu imóvel como garantia pode levar à penhora do bem, ainda que seja considerado bem de família. Dívidas com pensão alimentícia podem levar à penhora do imóvel, do salário ou até à prisão.
As demais dívidas não geram punições na esfera criminal, e normalmente nem à penhora de bens. Mas o atraso no pagamento da conta de água, de luz ou de gás, por exemplo, pode levar ao corte do fornecimento do serviço. Esse tipo de dívida em atraso também deve vir entre as prioridades.
“De forma geral, dever não leva à prisão, e normalmente os credores evitam a cobrança judicial, por ser muito caro. A empresa pode entrar com a ação, não encontrar patrimônio que possa ser alienado e ficar sem nada. Mas se o devedor tiver uma dívida grande, digamos da ordem dos 500 mil reais, e muito patrimônio, o credor pode entrar na Justiça para pedir a penhora dos bens”, diz o advogado Ronaldo Gotlib, autor do livro “Dívidas? Tô fora!” e outros livros sobre os direitos do tomador de crédito.
Se os casos acima não se aplicam a você, o máximo que pode ocorrer é seu CPF ser inscrito num cadastro de inadimplentes, como Serasa, SPC ou SCPC, o popular “nome sujo”. Nesse caso, é preciso negociar a dívida e começar a pagá-la para limpar o nome e voltar a ter acesso ao crédito. Para essas dívidas menos perigosas, Gotlib aconselha esperar até conseguir liberar recursos para renegociá-las e pagá-las.
6. Renegocie, mesmo que por via judicial
Para limpar o nome, não é preciso quitar a dívida, apenas renegociá-las e começar a pagar. Para isso, você deve entrar em contato com o seu credor e apresentar uma proposta de pagamento, com juros mais baixos ou um prazo mais longo. O importante aqui é ter capacidade de pagamento mensal para pagar juros e amortização, com uma parcela que caiba no bolso e não o deixe “enforcado” novamente. Essa é a melhor via para quem não tem, hoje, capacidade de pagar nem os juros da própria dívida.
O tempo para conseguir quitar a nova dívida, unificada, mais longa e mais barata, pode não ser breve. Uma simulação feita pelo professor Samy Dana mostra que, para quitar uma dívida de 100 mil reais a um juro de 2% ao mês em 12 meses seria preciso pagar cerca de 9.500 reais por mês, levando em conta que, a cada mês, cresce a fatia da amortização e reduz a fatia dos juros. Quem conseguir liberar 3 mil reais por mês no orçamento conseguirá o feito em 55 meses, ou cerca de quatro anos e meio. Mas se seu limite for 2.200 reais por mês, levará dez anos para quitar a mesma dívida.
Se os juros ou as condições de pagamento forem abusivos, é possível também promover uma renegociação judicial da dívida. No caso de uma dívida de mais de 40 salários mínimos, como é o caso do montante de 100 mil reais, a discussão teria que ser levada à Justiça comum, por fugir do escopo dos juizados especiais. O endividado pode procurar um advogado especializado para fazer o recálculo da dívida.
“A partir do contrato do crédito e dos valores já pagos, as assessorias especializadas recalculam os juros a partir da média de mercado”, explica Ronaldo Gotlib. Para ele, se a dívida é muito longa e a inadimplência ocorre logo no início do prazo, não vale a pena ir à Justiça, sendo melhor repactuar as condições diretamente com o credor. “Mas se os direitos estiverem sendo atacados, é possível conseguir bons acordos na Justiça, antes mesmo do desfecho do processo”, afirma.
Segundo o advogado, se o endividado consegue liberar recursos em seu orçamento para pagar a dívida, em 60 dias após entrar na Justiça ele consegue limpar seu nome e livrar-se de aborrecimentos maiores. Já se não tiver dinheiro, o prazo para começar a resolver um problema com uma dívida de 100 mil reais pode chegar a três ou cinco anos, diz Gotlib.
7. Cogite vender bens para amortizar a dívida
“Vender um carro é sempre uma opção, porque carro é um gasto”, acredita o professor Samy Dana, lembrando que carros perdem valor com o tempo, além de pesarem no orçamento. A venda de um imóvel também pode ser considerada, desde que seu valor não exceda muito o valor da dívida. Nesse último caso, um refinanciamento imobiliário pode ser mais indicado. “É melhor vender um imóvel e se remunerar primeiro, tentando recompor seu patrimônio aos poucos para recomprar o bem, do que dilapidar seu patrimônio no tempo”, diz.