Parando: com estoque elevado, a fabricante de embalagens Dixie Toga planeja dar férias coletivas (Leandro Fonseca / EXAME)
Da Redação
Publicado em 24 de setembro de 2014 às 10h00.
São Paulo - Boa parte do debate econômico das últimas semanas se deu sobre uma questão conceitual: afinal, o Brasil está ou não em plena recessão? Os dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística no fim de agosto atestaram que a atividade total no país recuou na primeira metade do ano — houve a chamada recessão técnica, caracterizada por dois trimestres consecutivos de desempenho negativo do produto interno bruto.
Como o acumulado em 12 meses ainda é 1,4% positivo, há quem resista a cravar que o país está em retração. Será preciso esperar o resultado do ano completo para tirar uma conclusão. Discussão à parte, os dados mostram uma deterioração generalizada: o PIB caiu em três dos últimos quatro trimestres.
A produção industrial declina há um ano. Os investimentos recuam há quatro trimestres e chegaram a 16,5% do PIB, o nível mais baixo desde 2006. A confiança de empresários e consumidores está baixa. O consumo das famílias e os serviços, duas estrelas dos últimos anos, perderam o brilho.
Para completar, a inflação anual continua em torno de 6,5%, o teto da faixa adotada como alvo pelo Banco Central. Diante de tudo isso, vale a pena discutir o termo para adjetivar a economia?
A discussão estará em pauta no dia 23 de setembro, na reunião do Comitê de Datação de Ciclos Econômicos (Codace), ligado à Fundação Getulio Vargas. Trata-se de um grupo de economistas que se encontram de tempos em tempos para avaliar a conjuntura.
“Independentemente do que o comitê concluir, existe uma verdade: a economia parou de crescer”, diz Affonso Celso Pastore, ex-presidente do Banco Central e presidente do Codace. O comitê é inspirado num similar existente nos Estados Unidos, que analisa um conjunto de indicadores econômicos, que incluem a situação do emprego, e decide se o país entrou em um ciclo recessivo.
Segundo o comitê, desde 1981 o Brasil já acumula oito períodos de retração, que somam um total de dez anos. Ou seja, quase um terço das últimas três décadas foi tempo perdido em termos de crescimento da economia. De acordo com Pastore, o mais importante é entender as causas do baixo crescimento.
Para ele, a situação atual indica a diminuição de uma capacidade do país: a de crescer sem gerar inflação — chamada de PIB potencial pelos especialistas. Nos seus cálculos, em 2007 o crescimento potencial do PIB brasileiro era de quase 4,5%. Hoje estaria em torno de 1,5%. Esse quadro é reflexo da queda na produtividade e do baixo nível de investimento registrados nos últimos anos.
Trata-se de um diagnóstico mais complexo do que o apresentado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega. O ministro culpou a conjuntura pelos dados decepcionantes — no caso, a Copa do Mundo e o desempenho da economia mundial. E prometeu crescimento no terceiro trimestre. Tradicionalmente, diversas atividades são mais fortes na segunda metade do ano.
Com base nesse histórico, as projeções dos analistas apontam para um avanço total no ano de até 0,5% — mas já há quem preveja praticamente um zero a zero. “Ainda que o PIB cresça, será mais um crescimento medíocre”, diz Sérgio Vale, economista-chefe da consultoria MB Associados.
Mudança de rumo
Está difícil enxergar a prometida reação no segundo semestre. Setores da base da economia não mostram sinais de alento. As vendas de aço da Gerdau tiveram queda de 4% no primeiro semestre. “Houve redução da demanda em razão da menor atividade de todos os setores”, diz André Gerdau Johannpeter, presidente da Gerdau, em recente apresentação de resultados aos acionistas.
As vendas da Dixie Toga, que produz embalagens, caíram 8% no ano passado e, neste ano, mais 7% até agora. “Eu vou me dar por satisfeito se conseguirmos fechar o ano com queda de 3,5%”, diz Marcos Barros, diretor financeiro da Dixie Toga.
Por enquanto, a realidade da empresa é de estoques altos. Estão 30% acima da média normal. Em dezembro, a Dixie Toga deverá dar férias coletivas. No primeiro semestre, cortou 4% do quadro de 5 400 funcionários.
As dificuldades da indústria refletem os desarranjos que também chegaram ao consumo. O PIB do comércio caiu 0,4% no primeiro trimestre e 2,2% no segundo. De acordo com a Confederação Nacional do Comércio (CNC), a queda reflete a confiança em baixa dos consumidores e a restrição no crédito, que ficou mais caro.
Em um ano, a taxa média de juro ao consumidor saiu de 36,2% para 43,2% ao ano, número mais alto desde 2011. “Isso tem afetado setores dependentes de crédito, como os de carros, material de construção e computadores”, afirma Fabio Bentes, economista da CNC. Na visão de Bentes, o comércio deve fechar o ano com o pior desempenho desde 2003.
Se a sensação que mais se dissemina é a de que 2014 será mais um ano da lista do tempo perdido, os olhos agora estão voltados para 2015. O ânimo vai voltar e os indicadores reverterão o sinal? Aí, a questão que se impõe é: quem estiver no comando do país vai transmitir confiança para a retomada dos investimentos? Os principais candidatos estão usando seus trunfos.
O tucano Aécio Neves adiantou que, se eleito, vai colocar o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga à frente do Ministério da Fazenda. Marina Silva, do PSB, promete dar autonomia plena ao Banco Central. E a presidente Dilma Rousseff declarou que vai trocar nomes de sua equipe econômica, o que incluiria o ministro Guido Mantega. De certa maneira, admitiu que os rumos precisam ser redefinidos. Pelo menos quanto a isso, todos já concordam.