Sicília: onde há fumaça — e vulcão cuspindo lava — deve haver fogo (Catarina Bessell/Exame)
Jonalista colaboradora
Publicado em 18 de dezembro de 2025 às 06h00.
Uns meses atrás, minha maior companheira de aventuras enogastronômicas pelo mundo, me ligou e perguntou: "Vem comemorar meu aniversário na Sicília? Convidei meus filhos e poucos amigos". Foi assim que fui parar em Palermo, empolgadíssima para degustar os vinhos da ilha, hoje tão na moda - especialmente os produzidos aos pés do Etna.
Na minha cabeça desfilavam cenas ensolaradas com limoeiros, olivais ondulantes e mesas repletas de pasta e caponata ao som do tema d'O Poderoso Chefão. Estereótipos grudam no sub-consciente como chiclete — mas nada que uma semana de chuva e frio de rachar não resolvesse!
Nossa casinha nas montanhas ficava em Sambuca, vilarejo natal dos Planeta, o clã que revolucionou o vinho local nos anos 80, quando a ilha ainda era vista como fábrica de tintos e brancos de massa, industrializados e vendidos a granel (como os Marsala que mais servem na cozinha do que para beber).
Ao visitar Ulmo, antiga fazenda onde os avós do atual CEO, Alessio Planeta, cultivavam grãos, percebi a dimensão do império. Andando entre as vinhas onde ovelhas pastavam, sua prima Chiara contou que aquela era a menorzinha das sete vinícolas que eles tem espalhadas por cinco regiões da ilha (sem falar na parte de hotelaria e gastronomia e na produção de azeite!).
Onde é que eu estava, que não havia enxergado a assombrosa ascensão da ilha como potência vitivinícola? Em meros vinte anos entrou no panteão da Itália, fazendo sombra à Toscana!
Diego, tio de Alessio, foi um dos pioneiros que importaram especialistas em cultura da vinha e enologia e deram o salto qualitativo que botou a Sicília no mapa dos críticos e distribuidores de peso. Pouco a pouco surgiram centenas de novos produtores que rasgaram novos territórios com fileiras de vinhas de variedades francesas (sempre mais fáceis de vender) e aprenderam a domar as uvas autóctonas, decifrando suas virtudes. Malucos obstinados como Marco Grazzi da Tenuta delle Terre Nere mapearam incansavelmente os micro-climas até concluírem que a Terra Santa da ilha eram as encostas ao pé do Etna, pondo-se a investir, vinificar e rodar o mundo cantando suas glórias vitíferas.
Deu tão certo que muita gente passou a comparar vinhos do Etna e seu caleidoscópio de solos e relevos aos da Borgonha: o território sagrado e multifacetado que dá vinhos que enófilos disputam a tapa e valem centenas ou milhares de Euros por garrafa. Em Sambuca, de notáveis, só provei dois brancos da Planeta: o chardonnay e um opulento fiano (uva nativa). Não posso dizer se o hype em torno da Sicília e seus vinhedos vulcânicos sustentam-se, mas hei de voltar. Onde há fumaça — e vulcão cuspindo lava — deve haver fogo.