Revista Exame

Um mercado de 2 trilhões de dólares

Para Dexter Galvin, esse é o potencial das oportunidades de negócios para as empresas num cenário de redução das emissões de carbono

Dexter Galvin: “As oportunidades relacionadas ao clima superam o custo de alcançá-las” (Divulgação/Divulgação)

Dexter Galvin: “As oportunidades relacionadas ao clima superam o custo de alcançá-las” (Divulgação/Divulgação)

Vanessa Barbosa

Vanessa Barbosa

Publicado em 18 de julho de 2019 às 06h03.

Última atualização em 18 de julho de 2019 às 15h12.

Em junho, um grupo de 88 investidores com quase 10 trilhões de dólares em ativos lançou publicamente um apelo por mais transparência sobre dados de impacto ambiental de 707 companhias baseadas em 46 países.

Com valor de mercado conjunto superior a 15 trilhões de dólares, o grupo inclui desde grandes empresas do setor de combustível fóssil, como as petroleiras BP, britânica, e Chevron, americana, até os gigantes do varejo online, o chinês Alibaba e o americano Amazon

O apelo exige a divulgação padronizada na plataforma da organização CDP, maior rede global de divulgação de emissões de carbono.

Não é um movimento isolado. Hoje, mais de 1 700 gestores de ativos que somam 80 trilhões de dólares já incorporaram dados de impacto ambiental em suas análises de investimento. Entre eles está o maior gestor de ativos do mundo, o americano BlackRock.

A pressão por transparência não vem apenas do mercado financeiro. Mas também de consumidores e até de funcionários. No caso da Amazon, num esforço inédito, mais de 6 000 empregados assinaram em abril uma carta aberta ao fundador e presidente mundial Jeff Bezos.

Nela, eles pedem a divulgação de um plano climático robusto e mensurável de redução de emissões da companhia, cujo valor de mercado gira em torno de 1 trilhão de dólares.

Para Dexter Galvin, diretor global de corporações e cadeia de suprimentos da CDP, com sede em Londres, trata-se de um momento que não impõe apenas desafios para as empresas. A organização estima oportunidades de novos negócios e produtos da ordem de 2,1 trilhões de dólares.

Em junho, em visita ao Brasil para participar do evento Conexão Carbono Zero, realizado pela própria CDP, pela ONG WWF e pela consultoria O Mundo Que Queremos, Galvin deu a seguinte entrevista a EXAME.

Quais riscos as mudanças climáticas representam para os negócios?

As maiores companhias com ações listadas em bolsas de valores no mundo antecipam riscos climáticos de cerca de 1 trilhão de dólares, grande parte nos próximos cinco anos. De um lado, há os riscos associados a impactos físicos.

Tempestades, enchentes, secas e incêndios florestais afetam os custos de produção, distribuição e vendas. Do outro, há os riscos regulatórios associados à transição para uma economia de baixo carbono.

Nosso estudo mostra que, desse montante de 1 trilhão de dólares reportados, cerca de 500 bilhões são classificados como virtualmente certos, e vinculados a mudanças legais e de políticas.

Quais mudanças são essas?

Para o setor de petróleo e gás, há o risco de perdas estimadas em 250 bilhões de dólares por desvalorização associada a ativos irrecuperáveis, que são as reservas de combustíveis fósseis que devem permanecer intocadas para atingirmos as metas do Acordo de Paris.

A indústria de serviços financeiros também está na linha de frente. Há uma pressão crescente por mais transparência sobre os investimentos que obrigará as instituições a apostarem mais nas energias verdes e na inovação e menos em fontes poluentes.

O estudo da CDP mostra que as oportunidades associadas às mudanças climáticas superam os riscos. Quais são elas e onde estão?

Em geral, são oportunidades ligadas ao aumento da demanda por produtos e serviços de baixa emissão e baixo impacto ambiental, como veículos elétricos, no setor de transporte, ou mesmo hambúrgueres feitos à base de plantas, no segmento de alimentos.

Em média, o valor potencial das oportunidades relacionadas ao clima equivale a quase sete vezes o custo de alcançá-las. As maiores oportunidades estão na cadeia de fornecedores.

Como as empresas podem explorar essas oportunidades junto com seus fornecedores?

Cito alguns exemplos. O Walmart, um dos maiores varejistas do mundo, tem uma ambiciosa política para diminuir em 1 bilhão de toneladas as emissões de gases de efeito estufa de sua cadeia de valor global até 2030.

Todos os fornecedores da fabricante de cosméticos francesa L’Oréal precisam ter uma meta de redução de emissões. Mais recentemente, a rede de lanchonetes americana Burger King incorporou no menu o hambúrguer vegetal da foodtech [também americana] Impossible Foods, dando escala ao produto.

Na CDP, trabalhamos com 125 das maiores empresas compradoras do mundo, que concentram 3,6 trilhões de dólares em poder de compra. Elas têm potencial para incentivar mudanças ambientais significativas em suas cadeias de suprimentos. Ninguém vai querer ficar de fora.

Além da cadeia de suprimentos de grandes empresas, como seria possível dar escala ao esforço de reduzir as emissões de carbono?

Temos pouco mais de dez anos para salvar o planeta e gastamos muito tempo pensando em grandes soluções institucionais para a transição. No entanto, existe pouco esforço de inovação nesse sentido.

Toda cidade do mundo tem algum ecossistema de tech hubs onde geeks e empreendedores se reúnem, e de onde surgem startups inovadoras.

Cadê os greenhubs da sustentabilidade? Onde estão os bilionários das mudanças climáticas? Precisamos reunir pessoas que tenham soluções genuínas com empresas e investidores interessados na mudança.

Que instrumentos podem ser usados para estimular o surgimento de startups verdes?

Nos Estados Unidos e na Europa, as empresas encaminham certas questões relativas ao engajamento de minorias e empoderamento feminino por meio de políticas de compra. Por que não fazer o mesmo com novos negócios menores e disruptores?

Há um trabalho a ser feito: encontrar os disruptores e conectá-los aos investidores e garantir que tenham investimento necessário para ganhar escala da mesma forma bem-sucedida que aconteceu na indústria de tecnologia.

Acompanhe tudo sobre:Revista EXAMEStartupsSustentabilidade

Mais de Revista Exame

Borgonha 2024: a safra mais desafiadora e inesquecível da década

Maior mercado do Brasil, São Paulo mostra resiliência com alta renda e vislumbra retomada do centro

Entre luxo e baixa renda, classe média perde espaço no mercado imobiliário

A super onda do imóvel popular: como o MCMV vem impulsionando as construtoras de baixa renda