André Ferraz, presidente da In Loco: bermuda, chinelo e lucro (Leo Caldas/Exame)
Mariana Fonseca
Publicado em 18 de julho de 2019 às 05h30.
Última atualização em 18 de julho de 2019 às 15h08.
O momento em que a computação será tão natural para nós quanto é a eletricidade foi previsto há mais de 30 anos pelo cientista da computação americano Mark Weiser. O fenômeno, conhecido como computação ubíqua, só agora virou base da estratégia de negócios de grandes e pequenas empresas mundo afora. Uma delas está em Recife.
Os oito fundadores e os quase 200 funcionários da startup de geolocalização In Loco aproveitam o potencial dos celulares e da tecnologia que identifica sua posição geográfica para impulsionar os negócios e melhorar a segurança dos clientes, que são empresas como o banco Santander, a montadora de carros Nissan, a operadora de telefonia Oi e a rede de cosméticos O Boticário. Por meio deles, as soluções da In Loco estão em 60 milhões de smartphones no Brasil e em 5 milhões de celulares nos Estados Unidos.
A In Loco nasceu em 2010, de um projeto dos alunos de ciência da computação na Universidade Federal de Pernambuco André Ferraz, Alan Gomes, Denysson Messias, Airton Sampaio, Gabriel Falcone e Lucas Queiroz, além dos designers Eduardo Martins e Júlio Rangel. O grupo sul-africano de mídia e tecnologia Naspers fez um investimento não revelado na empresa em 2013.
A sede fica no Porto Digital, região recuperada do centro da capital pernambucana para abrigar startups. Com o clima quente da cidade, até o presidente, André Ferraz, vai trabalhar de chinelo e bermuda. Apesar do ar informal comum a tantas startups, a In Loco é um caso raro: dá lucro há quatro anos.
O faturamento cresce anualmente 100% desde 2015 e a previsão é alcançar 130 milhões de reais neste ano fiscal. O primeiro impulso da empresa foi aplicar geolocalização ao marketing de lojas. Graças à tecnologia adotada, uma pessoa que passa na frente de um supermercado recebe no celular ofertas do local sem precisar fornecer e-mail, RG ou perfil em redes sociais. A cobrança da notificação é feita apenas quando o usuário entra no estabelecimento. A permissão para receber notificações é dada pelo usuário ao assinar termos de 25.000 aplicativos parceiros. Os apps recebem parte dos ganhos obtidos pela startup com os anúncios.
Aos poucos, a In Loco foi expandindo os serviços. Hoje, usa a geolocalização para impedir fraudes e enviar descontos sob medida. Faz isso mapeando onde as pessoas moram, por onde elas passam, quais serviços utilizam e em que horário. Se estão todas as noites no mesmo endereço, por exemplo, não precisam mandar comprovante de residência para abrir uma conta bancária — e isso diminuiu em 30% a desistência de abertura de contas em um banco. Outra instituição conseguiu barrar uma fraude ao descobrir que dez clientes no mesmo endereço tentaram abrir contas ao mesmo tempo, um indício de formação de quadrilha.
Até o final do ano, os serviços que unem geolocalização a segurança deverão ultrapassar o atendimento a estabelecimentos físicos. Ferraz estima que 80% dos principais apps brasileiros usarão a tecnologia da In Loco ainda em 2019. “Trabalhar com privacidade e segurança sempre foi nosso grande objetivo”, diz Ferraz.
O crescimento no Brasil deverá ganhar tração com a nova Lei Geral de Proteção de Dados, que entrará em vigor no final de 2020. A regulação, inspirada na europeia, exigirá dar ao usuário a possibilidade de receber e excluir informações guardadas sobre ele, algo que na teoria dá fôlego a soluções como as da In Loco.
Mas o foco é a expansão internacional, mirando a conexão de aparelhos que interagem com o ambiente, tecnologia conhecida como internet das coisas. Em junho, a empresa recebeu nova rodada de investimentos, de 20 milhões de dólares, liderada pelos fundos Valor Capital e Unbox Capital (de Luiza Helena Trajano, sócia da varejista Magazine Luiza).
Nos próximos 18 meses, a startup projeta alcançar 50 milhões de celulares nos Estados Unidos. “A In Loco é um exemplo de tecnologia de ponta saindo do Brasil com potencial global”, diz Scott Sobel, sócio do Valor Capital Group. Os pernambucanos vão enfrentar uma competição ferrenha. Apenas Israel, país referência em cibersegurança, tem 400 startups no setor, boa parte delas competindo pelos clientes americanos. De sandálias à la Mark Zuckerberg, do Facebook, Ferraz está pronto para a briga.