Revista Exame

O fundo inglês GLG perdeu a paciência com a Laep

Um fundo britânico de 23 bilhões de dólares está processando o maior acionista da recém-criada gigante nacional do leite — em disputa, uma dívida superior a 100 milhões de reais

Marcus Elias, controlador do fundo Laep: disputa judicial com fundo inglês em torno de dívida contraída para recuperar a Parmalat (Eduardo Knapp/EXAME.com)

Marcus Elias, controlador do fundo Laep: disputa judicial com fundo inglês em torno de dívida contraída para recuperar a Parmalat (Eduardo Knapp/EXAME.com)

DR

Da Redação

Publicado em 9 de julho de 2012 às 18h23.

Os últimos meses têm sido férteis em boas notícias para o investidor Marcus Elias, controlador do fundo Laep. Uma velha fonte de problemas, a Parmalat do Brasil, comprada pela Laep em 2006, foi resgatada pelo governo federal: no fim do ano passado, o BNDES orquestrou a fusão das duas maiores produtoras de leite nacionais, as problemáticas Monticiano e Bom Gosto, e deu origem ao maior processador de leite do país, a LBR, com faturamento anual estimado em 3 bilhões de reais.

A Laep de Elias era, por meio da Parmalat, sócia da Monticiano e acabou se tornando a maior acionista privada da nova companhia. Em fevereiro, um revigorado Marcus Elias voltou às compras ao adquirir a butique de luxo Daslu por 65 milhões de reais. E, em março, a LBR começou a negociar sua venda para a Parmalat italiana, num lance com potencial bilionário para os acionistas da empresa brasileira. A fase, portanto, parece ótima. Mas, nos bastidores, o cenário é bastante diferente.

Nos últimos meses, justamente quando a coisa começou a melhorar na arena dos negócios, Elias passou a enfrentar na Justiça um poderoso adversário: o fundo inglês GLG, que administra 23 bilhões de dólares. Segundo EXAME apurou, os ingleses acusam Elias de ter dado um calote em dívidas que ultrapassam os 100 milhões de reais.

A dívida pertence ao Emerging Markets Special Situations 3, fundo controlado pelo GLG e, como se pode deduzir, especializado em mercados emergentes. Há dois processos em andamento na Justiça brasileira, nos quais o GLG pede que a dívida seja paga. Um, que se refere a uma dívida de 69 milhões de reais, está sendo analisado pela 17a Vara Cível de São Paulo.

Outro, que trata de uma dívida de 35 milhões de reais, tramita na 25a Vara. O GLG é assessorado pelo escritório de advocacia Pinheiro Neto; a Laep, pela banca Ferro, Castro Neves, Daltro & Gomide. A disputa também tem ramificações nas cortes de Bermudas e Nova York.

Troca de acusações

Para entender a barafunda legal, é preciso voltar a 2007. Naquele ano, a Parmalat passou por uma aguda crise financeira. Numa tentativa de melhorar a situação da companhia, Elias levantou 180 milhões de reais com uma emissão de debêntures (títulos de dívida privada).


Após uma operação intermediada pelo banco americano Morgan Stanley, a dívida acabou assumida pelo GLG. Segundo a argumentação dos ingleses no processo que corre na Justiça, a dívida foi renegociada após a crise de 2008 — que, mais uma vez, piorou a situação financeira da Parmalat.

Ainda de acordo com o GLG, uma parcela de 31 milhões de reais teria de ter sido paga em dezembro de 2009. O pagamento não veio. Em setembro do ano passado, outra parcela, de 67 milhões, não teria sido paga. No mês seguinte, os ingleses acionaram as empresas de Marcus Elias na Justiça.

De acordo com eles, quatro fábricas de processamento de leite da Laep foram dadas em garantia para a tomada dos empréstimos — são unidades em São Paulo, Goiás, Minas Gerais e Rondônia. Caso as fábricas parem nas mãos dos ingleses, o GLG poderá acabar sócio da LBR, a gigante nacional do leite.

Os ingleses afirmam, ainda, ter uma opção de transformar seus créditos não pagos numa participação de 25% no capital da Laep — a opção poderia ser acionada a qualquer momento. O GLG calcula que a dívida total, hoje, é de aproximadamente 115 milhões de reais.

O próximo passo na estratégia dos ingleses é tornar pública a disputa. Eles vêm pleiteando a publicação de um protesto declarando a Laep inadimplente — o objetivo, aí, é deixar claro que qualquer empresa que se associar à Laep pode acabar obrigada a pagar a dívida ou ser alvo de processo.

Essa é uma manobra para evitar que a Laep venda ativos que, para o GLG, hoje garantem seus créditos. A medida tem potencial para envolver na disputa gente graúda, como a GP Investimentos, sócia de Elias na LBR, o BNDES, que injetou 700 milhões de reais na empresa, ou até mesmo a Parmalat italiana.


Segundo EXAME apurou, os ingleses não descartam usar meios para tentar impedir uma eventual fusão da LBR com a Parmalat italiana.

Marcus Elias se defende das alegações atacando aquilo que considera um fundo “abutre” que quer “retalhar” a Laep. Segundo ele, o fundo inglês passou a ser o detentor da dívida numa operação fraudulenta com o Morgan Stanley, que não poderia ter passado as debêntures ao GLG (o banco não quis se manifestar).

O fundo, segue Elias, es­ta­ria também tentando receber uma quantia superior à devida. No processo, a Laep alega ainda que na renegociação da dívida, ocorrida entre 2008 e 2009, o GLG se aproveitou da “tortuosa situação financeira da Parmalat” para “tirar vantagens ilícitas” e que seus executivos sofreram “coação” para assinar o contrato — em resumo, sob a ameaça de que, caso não aceitassem termos favoráveis ao GLG, a Parmalat corria o risco de ter a falência decretada.

“Queriam nos levar à falência, executar a dívida e receber os ativos a preço vil”, diz Elias. Segundo consta no processo, a Laep es­ti­ma que as garantias tenham valor de mercado superior a 1 bilhão de reais.

Nos documentos que EXAME obteve, o fundo inglês devolve na mesma moeda, acusando a Laep de “má-fé” e de fazer “acusações levianas” e alegações “absurdas”. Para os advogados do GLG, a renegociação da dívida em 2009 foi assinada de “comum acordo” e o fundo sempre desejou preservar a Parmalat da falência.

E os argumentos da Laep seriam nada mais que uma maneira de empurrar o que é líquido e certo — o pagamento da dívida — com a barriga. Estejam eles certos ou errados, o fato é que a disputa não deve acabar tão cedo.

A Laep convocou uma corte arbitral e conseguiu, na Justiça americana, acesso a informações referentes ao GLG que poderão ser usadas no processo que corre no Brasil. Elias também quer que o GLG pague à Laep uma indenização por ter cobrado valor “indevido”. “Agora, é briga”, diz ele. Os ingleses hão de concordar.

Acompanhe tudo sobre:Alimentos processadosEdição 0990EmpresasEmpresas italianasIndústrias de alimentosJustiçaLaepLBRParmalat

Mais de Revista Exame

Linho, leve e solto: confira itens essenciais para preparar a mala para o verão

Trump de volta: o que o mundo e o Brasil podem esperar do 2º mandato dele?

Ano novo, ciclo novo. Mesmo

Uma meta para 2025