Pedro Passos, presidente do IEDI: “A indústria brasileira está perdendo espaço até no mercado interno por falta de competitividade” (Germano Lüders / EXAME)
Da Redação
Publicado em 31 de março de 2015 às 11h40.
São Paulo - À frente do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial, conhecido pela sigla Iedi, Pedro Passos, um dos fundadores da fabricante de cosméticos Natura, tem se destacado como um incansável defensor da abertura da economia brasileira. Como sabemos, o Brasil ainda convive com tarifas de importação muito altas.
Sem competir, sem acesso à tecnologia e fora dos grandes fluxos de comércio, o país não consegue obter ganhos de produtividade. Na avaliação de Passos, uma janela de oportunidade surgiu no front comercial. Diferentemente do que aconteceu no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff, o governo brasileiro agora parece estar mais interessado numa aproximação com os Estados Unidos.
“É provável que esse seja um novo eixo de atuação que o Brasil vai começar a trilhar”, afirma Passos. “Mas a agenda para que isso ocorra precisa ser construída.”
EXAME - Na última edição de EXAME, a embaixadora americana em Brasília, Liliana Ayalde, disse haver espaço para a negociação de uma área de livre comércio entre o Brasil e os Estados Unidos. Dá para acreditar num acordo desses?
Pedro Passos - Somos favoráveis a que o Brasil se aproxime dos grandes blocos e, com certeza, os Estados Unidos são parte fundamental dessa estratégia. O modelo de desenvolvimento industrial brasileiro precisa de uma reorientação. Como parte dessa mudança, é necessário integrar mais o Brasil ao comércio internacional.
O único meio que outros países encontraram para progredir em termos de inovação e ganho de produtividade foi vinculando sua economia ao comércio mundial. O atual estágio da manufatura exige a conexão entre fornecedores de diferentes partes do mundo.
Para um país exportar mais, precisa importar mais. Uma aproximação com os Estados Unidos e uma definição da negociação em curso com a União Europeia são cruciais para a indústria brasileira.
EXAME - Essa posição é majoritária entre os industriais brasileiros?
Pedro Passos - É uma opinião que a cada dia ganha mais defensores. São pessoas que perceberam que o modelo de proteção do mercado interno não tem proporcionado ganhos de produtividade à indústria. Resultado: perdemos o mercado externo e o interno. Há quem diga que precisamos antes ganhar competitividade para depois nos integrar mais ao mundo. Mas cresce o número dos que defendem que essas coisas são concomitantes. Por quê? Senão, acabam não acontecendo.
EXAME - Uma abertura comercial com os Estados Unidos não acabaria provocando uma quebradeira generalizada na indústria?
Pedro Passos - Esse temor não pode nos paralisar. Uma agenda para a criação de uma área de livre comércio precisa ser construída com responsabilidade. Uma negociação desse tipo tem um calendário muito bem estudado para que, ao longo do tempo, o país tenha claro quais são os setores com maior potencial de exportação e quais poderiam se beneficiar com mais acesso a importações e novas tecnologias.
Uma abertura não acontece do dia para a noite. É um processo. Mas é importante que a política de comércio exterior brasileira defina isso como prioridade.
EXAME - Qual o perigo de o Brasil mirar o exemplo da Coreia do Sul, que se abriu ao comércio e inova, e acabar como o México, que abriu o mercado e se limita a montar produtos?
Pedro Passos - Apesar das dificuldades que tem enfrentado, a indústria brasileira tem participação de 1,7% no PIB industrial mundial, o que não é desprezível. De todas as grandes indústrias globais, 90% têm operações de manufatura no Brasil.
São essas multinacionais que fazem o comércio mundial crescer. Com essa base instalada, o Brasil tem potencial para fazer parte de processos industriais globais de maior valor agregado, mas é claro que fará montagens também.
EXAME - O senhor acha que o governo brasileiro é sensível à demanda dos industriais por uma aproximação com os Estados Unidos?
Pedro Passos - Esse é um bom desafio para a nova equipe econômica. O tema da aproximação com os Estados Unidos não vinha sendo colocado como prioritário no primeiro mandato da presidente Dilma Rousseff. Temos a impressão de que agora a necessidade de abertura ganha importância, mas ainda é uma agenda que precisa ser construída pelo governo e também pelos empresários.
EXAME - O histórico do governo Dilma é de proteção à indústria local e da mão pesada do Estado na economia. Não existe uma barreira ideológica à criação de uma área de livre comércio com os Estados Unidos?
Pedro Passos - Espero que não. Joaquim Levy, novo ministro da Fazenda, tem dado sinais favoráveis à ideia. Armando Monteiro, ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, esteve recentemente em Washington para falar com autoridades americanas. Teremos a visita da presidente Dilma aos Estados Unidos neste ano. É provável que esse seja um novo eixo de atuação que o Brasil vai começar a trilhar.