Revista Exame

Nos bastidores, o duro trabalho das agências

Com a velocidade do mundo digital, reputações estão sempre por um fio; atentas ao valor das marcas pessoais, empresas de comunicação adotam estratégias integradas para acompanhar a nova realidade

“Nossa missão é descobrir coisas interessantes sobre o cliente que nem ele mesmo sabia que daria pauta", diz Guilherme Pichonelli, CEO da agência de assessoria de imprensa Vira Comunicação (Gabriel Bertoncel/Divulgação)

“Nossa missão é descobrir coisas interessantes sobre o cliente que nem ele mesmo sabia que daria pauta", diz Guilherme Pichonelli, CEO da agência de assessoria de imprensa Vira Comunicação (Gabriel Bertoncel/Divulgação)

Giovanna Wolf
Giovanna Wolf

Colaboradora

Publicado em 15 de agosto de 2024 às 06h00.

É como um palácio em chamas, prestes a desmoronar. Quando surge uma crise de imagem, a empresa ou pessoa se vê diante de um perigo que se alastra com velocidade e violência, atingindo um de seus ativos mais preciosos: a reputação. Em um mundo onde as informações circulam rapidamente, em grande escala, e há cada vez mais opiniões e cobranças envolvendo preocupações sociais, bastam poucos movimentos para desencadear incidentes desse tipo.

É para conter crises e, principalmente, alavancar imagens e prevenir problemas, que trabalham agências de comunicação — ofício que ganhou novas dimensões nos últimos anos. “A internet e as redes sociais mudaram completamente a nossa função. Apenas os veículos tradicionais falavam antigamente. Agora, todo mundo tem voz”, comenta Taciana Veloso, que fundou a agência Índex em 1996, com apenas 22 anos.

Uma crise empresarial pode surgir de uma fala do CEO nas redes sociais, por exemplo — em contrapartida, os executivos também têm o potencial de ser os principais influenciadores de suas marcas. Além disso, pela multiplicidade de canais, talvez o melhor palco para determinado porta-voz seja um podcast, e não um programa de televisão. Às vezes, vale surfar as ondas do momento com agilidade, mas é um risco entrar de cabeça em qualquer barulho das redes. É um universo complexo, que mistura canais e interlocutores, o que exige um trabalho de comunicação integrado. Já se foi o tempo em que uma agência de comunicação podia se restringir a disparar releases sobre novidades de empresas ou celebridades, e a conseguir visibilidade em eventos.

Hoje, aos 49 anos, Veloso tem 200 clientes em sua agência, entre empresas e pessoas físicas, como a apresentadora Sabrina Sato e a influenciadora Boca Rosa. Há também o trabalho de marca pessoal em algumas corporações atendidas. Uma delas é a Cimed, um dos principais ­cases recentes de marketing digital — apenas no Instagram, o CEO da companhia, João Adibe Marques, soma 3,7 milhões de seguidores, enquanto a vice-presidente, Karla Marques Felmanas, tem 1,4 milhão.

“Cada vez mais, somos parceiros dos clientes. É o time que estará perto para executar estratégia, e também para trocas mais psicológicas. Com tanta mudança acontecendo, é importante entender o contexto em que estamos inseridos e compreender os novos códigos”, afirma a sócia da Índex, que, além de relações públicas, atua no universo de marketing de influência e mídias digitais.

“Nos últimos quatro anos, cresceu tremendamente a demanda por trabalhos direcionados a marcas pessoais de C-levels”, conta Ronaldo Rangel, diretor de crescimento da agência de marketing de influência Suba (Vitor Garcia/Divulgação)

Influência

Há no mercado um movimento de marcas se humanizando e pessoas se profissionalizando, explica Ronaldo Rangel, diretor de crescimento da agência de marketing de influência Suba, que trabalha com figuras como a jornalista Fernanda Gentil e o músico Lucas Lima, além de ter uma frente de posicionamento para marcas corporativas. Ele conta que, nos últimos quatro anos, cresceu tremendamente a demanda por trabalhos direcionados a marcas pessoais de C-levels.

“Em reuniões com empresas para falar de marca pessoal ou corporativa, não importa onde começa a conversa, quase sempre fazemos os dois trabalhos ao mesmo tempo”, afirma Rangel. Diante disso, a Suba aproveitou sua metodologia usada na comunicação de talentos (como artistas) para trabalhar a marca pessoal de executivos — por questões de confidencialidade, a agência não revela os nomes dos clientes atendidos nessa área.

“Todos nós somos marcas pessoais. Involuntariamente, estamos cuidando da nossa imagem todos os dias, em cada reunião. Você pode ter consciência de suas crenças e de como quer ser percebido, mas é possível aprimorar. A profissionalização é fazer isso com profundidade, até para saber o que é preciso aprender”, diz o diretor da Suba.

Fátima Pissarra, CEO da Mynd, que se define como uma agência de cultura digital, música, talentos e marketing de influência, também tem sido bastante procurada por perfis não artísticos. “As pessoas estão nas redes sociais. Temos feito cada vez mais trabalhos de transformar executivos em influenciadores. Para médicos, por exemplo, está um boom. Temos de afastar o estereótipo de que TikTok é só dancinha”, defende.

No centro desse trabalho está uma palavra muito usada atualmente por todos os profissionais de comunicação: “letramento”. Afinal, é consenso no mercado que, nos novos tempos, as principais crises de reputação nascem de discursos dissonantes da agenda ESG.

“Jamais vamos cobrar que o cliente seja perfeito em todas as esferas, mas vamos orientar, conversar e mostrar pelo que ele será cobrado. Na reunião, vai sair tudo redondinho. Conseguimos pegar os senões nos intervalos, por exemplo, quando o cliente vai fumar com o jornalista depois da entrevista e joga a bituca no chão”, comenta Guilherme Pichonelli, CEO da agência de assessoria de imprensa Vira Comunicação, que atende figuras como a atriz Maria Fernanda Cândido e o escritor Fabrício Carpinejar.

Para Pissarra, as pessoas devem entender que nem sempre precisam emitir opinião. “É um trabalho constante de como se portar e se mostrar — muita coisa não se pode mais falar. O desafio é que a marca pessoal tem ação própria, diferentemente de um produto físico.”

“A internet e as redes sociais mudaram completamente a nossa função”, afirma Taciana Veloso, que fundou a Índex em 1996 e hoje atende 200 clientes, entre empresas e pessoas físicas, como Sabrina Sato (Marcus Leoni/Divulgação)

Técnica

Mais do que construção de reputação, as agências de comunicação trabalham hoje com gerenciamento de reputação — é preciso administrar de perto a execução do plano, que pode mudar a todo instante. “Acredito no treino, em começar a fazer as coisas e aprender ao longo do caminho. Mas o dia a dia é intenso. Acontece muito em tempo real, usando o WhatsApp para trocarmos impressões rápidas com o cliente”, conta Veloso, da Índex.

A criatividade para se diferenciar é outro mantra. “Percebi que só falar sobre o que meu cliente faz era muito pouco para a sociedade que estava se formando. Sempre pergunto: ‘Por que o público vai te admirar?’”, pontua Pichonelli, da Vira. “Nossa missão é descobrir coisas interessantes sobre o cliente que nem ele mesmo sabia que daria pauta. Assim surgem as histórias mais legais, como uma modelo conhecida por ser bonita falando em um grande jornal sobre seus investimentos financeiros.”

Do lado do marketing de influência, a atualização constante das redes exige um serviço de inteligência. Na agência Mynd, há uma equipe de quase 100 pessoas, de planejamento e pesquisa, que monitora tendências e as direcionam para os talentos aproveitarem — como uma música que está bombando. Isso, porém, não deve engessar o cliente, alerta a CEO Pissarra: “Dá para notar o que é fake. O influenciador tem de ser verdadeiro. Você não fará uma boa publicidade da bebida se não gostar dela”.

Não há roteiro simples. O CEO da Vira compara o trabalho a jogos de tabuleiro: “Em geral, as pessoas gostam de jogar dama, mas assessoria é xadrez: você não pode ir em uma única direção, só na diagonal. Precisa ter estratégia”.

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