Em transição
Da loja de tudo à nuvem em tudo. O caminho da Amazon sempre indicou dominância, mas neste momento a empresa enfrenta o desafio de integrar seu potente negócio de computação em nuvem, a Amazon Web Services (AWS), com a inteligência artificial generativa, a tecnologia que impulsiona soluções como o ChatGPT. A razão é clara: acompanhar para onde vai o mercado e controlar a intensa disposição de rivais em vender a tecnologia como a solução dos problemas desta década.
Para tal, a empresa já tem um plano. Ele foi apresentado em detalhes durante o evento de novidades AWS re:Invent 2023, o qual a reportagem da EXAME acompanhou para entender, afinal, o que caberá à Amazon na corrida das inteligências artificiais.
O evento, que aconteceu na semana passada, teve mais de 50.000 participantes – que incluem clientes, parceiros e entusiastas de tecnologia – e 2.000 sessões técnicas ao longo de 5 dias, distribuídos pelos principais hotéis da iluminada Las Vegas, nos Estados Unidos.
Além dos painéis com parceiros da Amazon e executivos do alto escalão da companhia, o evento também possuía uma feira. Por lá, startups e empresas dominaram com suas propostas de inovação que usam, sobretudo, o poder computacional da AWS para impulsionar novas soluções em IA.
Do palco para os estandes, a mensagem da Amazon era uma só: vendemos nuvem, inteligência artificial e segurança, e somos a opção mais ‘business-friendly’ quando o assunto é IA.
Antes tarde...
Enquanto Microsoft e Google disputam com ChatGPT e Bard, respectivamente, a AWS chega um ano depois com o Amazon Q. A IA generativa da varejista – que foi, de longe, o maior anúncio do evento – é voltada somente para empresas e opera na nuvem da AWS.
A Amazon se aproveita de uma brecha que a OpenAI, por exemplo, não consegue garantir: a segurança de dados. Isso porque o chatbot do ChatGPT armazena informações como endereço IP, localização e a própria conversa com o usuário, o que o distancia do uso das empresas.
Ao mesmo tempo, para dizer que não chegou na festa de mãos vazias, a Amazon já investiu US$ 4 bilhões na Anthropic, que detém a IA Claude e compete diretamente com a IA generativa de Sam Altman. Também disponível como chatbot, o Claude pode ser acessado pelo Amazon Bedrock, e as empresas trabalham juntamente para desenvolver novos modelos de base para a IA.
Além da Anthropic, a AWS aproveitou o evento para anunciar parcerias com Nvidia e Salesforce. A empresa de Jensen Huang trará novos “superchips” H200 em serviços da AWS, previstos para lançamento no próximo ano.
A novidade foi anunciada com Huang ao lado de Adam Selipsky, CEO da AWS, no principal palco do “re:Invent”, indicando que a colaboração deve se fortalecer no próximo ano entre as duas empresas.
Ao todo, 30 serviços da AWS oferecem algum recurso em IA – e empresas como iFood, Serasa, Itaú e Nubank fazem parte do leque de clientes, que já ultrapassa 1 milhão. No último trimestre, as vendas no serviço em nuvem da Amazon avançaram 12% na comparação anual, a US$ 23,1 bilhões, quando analistas previam US$ 23,2 bilhões.
Gerar talentos
Outro pilar que a AWS ressaltou ao longo do evento foi o treinamento de talentos, tema que sempre foi desafio no setor de tecnologia. A AWS já treinou 21 milhões de pessoas em tecnologia de nuvem, e a expectativa é alcançar 29 milhões até 2025. Segundo relatório da Accenture, 62% das PMEs já usam soluções em nuvem e há uma expectativa de que esse número suba para 90% até 2030 – também é esperado que 8,4 milhões de vagas com novas aptidões apareçam até lá.
Agora, a gigante tenta garantir que talentos busquem pela AWS ao procurar por cursos de IA generativa. De acordo com pesquisa encomendada pela AWS, os empregadores estão dispostos a pagar pelo menos 46% a mais para contratar talentos com habilidades em IA. Ao mesmo tempo, é estimado que 65% das empresas da América Latina têm dificuldade em encontrar e reter talentos com a experiência necessária. A empresa já oferece o treinamento gratuito ‘AI Ready’ e espera que 2 milhões de pessoas sejam treinadas pela plataforma até 2025.
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Não somos um convidado, e sim o anfitrião
A AWS chega atrasada na festa da IA generativa, mas quer deixar claro que a experiência da empresa com a tecnologia é de décadas. São 25 anos de experiência em inteligência artificial, destacou a empresa em mais de uma apresentação.
Há uma estratégia por trás de afirmações como essas, melhor resumida por uma frase de Cléber Morais, Diretor Geral da AWS no Brasil, durante o evento: “Somos pioneiros, então temos vantagem competitiva”, disse.
Vale ressaltar que a AWS não é a única empresa a dizer isso: como a inteligência artificial não é um conceito novo (o termo passou a ser usado em 1950) e já era aproveitada de outras formas, muitas gigantes da tecnologia exaltam orgulhosamente que têm experiência de anos no setor.
“O que vimos em 2023 foi uma grande janela de oportunidade para mostrarmos o que já estava no nosso portfólio”, comenta Américo de Paula, Líder de Arquitetura de Soluções para a América Latina. É verdade, claro, mas também não diminui o mérito de ‘players’ mais novos como a OpenAI.
Morno, com potencial de ebulição
Após um ano do ‘boom’ do ChatGPT, a Amazon anuncia sua entrada definitiva no mercado de IA generativa de forma morna.
Quase cochichando, a AWS disfarça a insegurança de entrar tão atrasada na tecnologia do momento utilizando palavras como “preparo” e “segurança”.
Entre um anúncio de destaque – o Amazon Q –, foram horas de novidades que só são relevantes para desenvolvedores e, por enquanto, não apresentam nenhum potencial transformador na vida do consumidor final.
Ao mesmo tempo, a AWS anunciou a solidificação de parcerias com marcas fortes, como Nvidia e Salesforce. Por isso, é difícil medir o impacto num primeiro momento. A água está morna, mas há indicativos de que a AWS pode esquentar a competição com sua receita de sucesso devagar.
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Créditos
Laura Pancini
Repórter
Formada pela PUC-SP. Começou como estagiária na Exame em 2020. Já passou pela Home do site e as editorias de Pop, Ciência, Tecnologia e IA. Hoje, cobre startups, fundos de investimento e empresas de tecnologia em Negócios.