Exclusivo: Tino Marcos revela qual pergunta gostaria de ter feito a Ayrton Senna
O jornalista foi o último brasileiro a entrevistar o piloto, homenageado pela Heineken no espaço da marca no Grande Prêmio do Brasil de Fórmula 1 deste ano
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Publicado em 8 de novembro de 2024 às 17h30.
Última atualização em 8 de novembro de 2024 às 17h46.
Símbolo nacional, Ayrton Senna continua vivo e admirado. A campanha “Hoje e sempre nos unindo”, da Heineken, serve de prova. Ela celebra a trajetória do piloto, uma das raras unanimidades nacionais, e convida os brasileiros a brindarem o ídolo internacional que, ainda hoje, segue emocionando e unindo o país.
Lançado no dia 17 de outubro, o filme The Toast faz parte da campanha. Em resumo, rememora de forma emocionante a primeira vitória do tricampeão mundial em Interlagos, em 1991. Mostra as arquibancadas cheias, aplaudindo o campeão, e o momento clássico do ídolo erguendo seu troféu com apenas uma das mãos. Culmina com um grupo de amigos levantando uma garrafa de Heineken para brindar ao piloto.
“Nos anos 1990, Ayrton Senna se tornou a grande referência de um Brasil que dá certo, um Brasil que funciona e brilha”, diz o jornalista Tino Marcos, último brasileiro a entrevistar Ayrton, em Mangaratiba, na casa do piloto. “Sentíamos orgulho, pois muitas nações invejariam ter um Ayrton Senna.”
Marcos foi o último brasileiro a entrevistar o piloto em um plantão inesperado — e um dos convidados de honra do Heineken Village — Senna Edition, no Grande Prêmio de São Paulo de F1 deste ano (a marca é patrocinadora global do circuito).
Confira, a seguir, uma entrevista exclusiva com Tino Marcos intermediada pela Heineken. Nela, o jornalista fala sobre o papel que Ayrton Senna desempenha até hoje.
Você foi o último brasileiro a entrevistar o Ayrton Senna em vida. Do que mais lembra dessa entrevista e o que ela significou para você?
Foi uma entrevista inesquecível para mim, pois foi um plantão inesperado na frente da casa do Ayrton em Mangaratiba. Alugamos uma lancha e ficamos lá esperando. Escrevi um bilhete e pedi ao caseiro, que estava varrendo a frente da casa, para entregá-lo a ele. Ayrton apareceu meio contrariado, pois não havíamos combinado nada, mas implorei para que ele falasse uma palavrinha para o Fantástico, e ele acabou concordando. Curiosamente, no final da entrevista, ele percebeu que estava sem o famoso boné do Nacional, que usava sempre. “Ah, deixa pra lá,” ele disse. Estava claro que só queria que eu terminasse e fosse embora, para que pudesse curtir o restante do passeio em paz.
“Em uma época em que o futebol brasileiro não conquistava títulos há tempos, Senna acabou se tornando uma referência de força e sucesso para o Brasil no esporte”
Como você descreve a relação que estabeleceu com o Senna, e como ela influenciou sua visão sobre ele como ídolo e ser humano?
Passei a acompanhar Ayrton Senna de perto quando ele ainda competia na Fórmula 3, na Inglaterra, pois eu cobria automobilismo no jornal. Assim, pude ver de perto a força e o talento excepcionais de um piloto que já começava a dominar todas as competições de que participava. Em uma época em que o futebol brasileiro não conquistava títulos há tempos, Senna acabou se tornando uma referência de força e sucesso para o Brasil no esporte, algo que o futebol não conseguia alcançar naquele momento.
O que você acha que as pessoas, de maneira geral, desconhecem sobre o Ayrton Senna como ser humano?
Acho que o lado menos conhecido de Ayrton Senna é o seu espírito brincalhão, um gozador que sempre encontrava uma forma de fazer uma graça com os outros. Lembro, por exemplo, da inauguração do kartódromo dele, na fazenda no interior de São Paulo, que fui cobrir. Ele estava a mil, pregando peças em todo mundo. Na corrida principal da inauguração, ele inicialmente não participaria; deu a largada com a bandeira e voltou para o box. Mas, de repente, pegou um kart e começou a ultrapassar todos, terminando em terceiro lugar. Esse lado mais descontraído do Senna é algo que o grande público talvez não conheça tanto.
Quais características tornavam o Senna tão especial e unificador para os brasileiros?
Eu acho que ele encontrou um terreno fértil no Brasil para alcançar tanta popularidade, porque a Fórmula 1 já era muito popular. O Emerson já abriu as portas desse esporte para os brasileiros, depois veio o Nelson Piquet também, com muitas conquistas; então, o Brasil já estava habituado a acompanhar a Fórmula 1, e com a trajetória fantástica do Ayrton Senna, acabou consolidando com uma relação única entre os brasileiros e o Senna.
“Ele [ Senna ] era uma figura global, mas que nunca perdeu sua forte conexão com o Brasil."
Como você percebe a importância do Senna na construção da identidade nacional brasileira nos anos 1990?
Nos anos 1990, Ayrton Senna se tornou a grande referência de um Brasil que dá certo, um Brasil que funciona e brilha. Sentíamos orgulho, pois muitas nações invejariam ter um Ayrton Senna. O Japão, por exemplo, o idolatrava — e o idolatra até hoje de uma forma muito especial. O mundo todo reverenciava Ayrton Senna, e nós, como brasileiros, nos orgulhávamos muito disso. Ele próprio alimentava essa brasilidade, sempre buscando a bandeira do Brasil a cada vitória e fazendo declarações para os brasileiros. Era uma figura global, mas que nunca perdeu sua forte conexão com o Brasil.
Após 30 anos do legado de Senna, como você vê a continuidade da sua presença na cultura e na sociedade brasileira?
Eu acho que a morte prematura acabou potencializando muito a paixão dos brasileiros pelo Ayrton Senna, a despedida dele tão precoce, da maneira como foi, tão mobilizadora. Todo mundo lembra o que ele estava fazendo naquele 1º de maio de 1994, então ele multiplicou muito essa coisa de adoração por ele em função do que aconteceu.
Acredita que a história do Senna ainda inspira as novas gerações, mesmo aquelas que não o conheceram correndo?
A popularidade do Ayrton Senna, até hoje, me lembra um pouco o exemplo de Bob Marley na música. Assim como Bob Marley, que partiu prematuramente, grande parte do público atual não chegou a vê-lo, mas continua a venerá-lo. O mesmo acontece com Senna: o mundo do automobilismo o reverencia, e nós, brasileiros, ainda mais. Essa renovação da sua imagem e de suas conquistas foi bem conduzida, especialmente pelo Instituto Ayrton Senna, que mantém viva sua memória por meio de trabalhos muito dignificantes. É por isso que, hoje, ao andar por São Paulo, especialmente em semanas de Grande Prêmio, vemos a imagem de Senna espalhada pela cidade em fotos, desenhos e referências diversas.
“Gostaria de saber como ele percebia essa pressão nos momentos em que as coisas não estavam saindo como ele havia imaginado”
Como foi ser um brasileiro durante a época em que o Senna estava no auge da Fórmula 1, e quais sentimentos isso evoca em você ao lembrar desse período?
Como fã de Fórmula 1, eu já acompanhava o esporte antes da era Ayrton Senna e vibrava muito com Nelson Piquet e o próprio Fittipaldi; lembro-me bem dessa época. Porém, foi com Ayrton que essa paixão atingiu seu auge, especialmente nas manhãs de domingo, que se tornaram quase um compromisso de felicidade para os brasileiros ao assistir suas peripécias na pista. Então, isso acho que foi o momento do auge do Ayrton Senna na Fórmula 1, foi também um momento de maior relação dos brasileiros com a Fórmula 1, sem dúvida nenhuma.
Que perguntas você gostaria de ter feito para o Senna e não teve oportunidade?
Gostaria muito de ter tido a oportunidade de, naquele mês que antecedeu sua morte, perguntar a ele sobre o nível de preocupação e pressão que sentia. Na época, ele já estava muito pressionado, pois havia ido para a Williams, onde todos esperavam que teria o melhor carro, e assim o mundo veria o melhor piloto no melhor carro. Porém, isso não estava se concretizando, e ele se via cada vez mais pressionado, ainda mais com o surgimento do fenômeno Michael Schumacher. Gostaria de saber como ele percebia essa pressão nos momentos em que as coisas não estavam saindo como ele havia imaginado.