Sem preconceito — profissionais contam histórias de inclusão no trabalho
No Fórum EXAME Diversidade, mulheres, negros, pessoas com deficiência e pessoas LGBTI+ mostram aceitação em um mundo corporativo que se abre aos poucos
Murilo Bomfim
Publicado em 27 de março de 2019 às 16h04.
Última atualização em 8 de junho de 2020 às 13h57.
São Paulo — Se o nascimento de uma criança, que pode ser previsto, causa descontentamento a algumas empresas pela ausência do funcionário, o imprevisível anúncio da chegada de um bebê adotado pode ser ainda mais complicado. Foi o que ocorreu com Fernando Cunha, especialista em soluções da SAP.
“Eu estava trabalhando quando a vara da infância me ligou para avisar que o bebê tinha chegado”, disse, em um depoimento no EXAME Fórum Diversidade , que reúne representantes de instituições públicas e privadas, ONGs e especialistas na manhã desta terça-feira (27) em São Paulo. Ao contrário do que se poderia imaginar, a vinda da criança não criou problemas no trabalho. Ciente do processo de adoção, a SAP colaborou com todo o período de adaptação de Cunha e seu marido para a chegada do filho.
“Tive mudanças nos horários para estar com meu filho em dias diferentes, acompanhá-lo na hora do jantar, por exemplo, para criar empatia”, diz o especialista. Como qualquer outro filho de funcionário da empresa, a criança tem acesso à creche e ao plano de saúde.
Esta não foi a primeira vez que a SAP demonstrou estar disposta a colaborar com a inclusão de pessoas LGBTI+. Cunha também teve apoio ao se casar, em 2012, e ter o nome de seu marido incluído como dependente para ter acesso a benefícios com facilidade e sem questionamentos. “São coisas que parecem pequenas, mas que fazem diferença nas nossas vidas”, diz.
Marianna Jorge de Moraes também se sente natural em seu ambiente de trabalho. Gerente de marcas na área de Marketing e Inovação da Natura, Marianna tem uma deficiência física e acredita que, em seu trabalho, isso não faz nenhuma diferença. “A empresa tem uma série de iniciativas para que as pessoas com deficiência interajam com os colegas da melhor forma possível”, diz. Ela cita, como exemplo, a criação, na empresa, de um grupo de estudos de Língua Brasileira de Sinais, o código gestual usado pelos surdos para se comunicar.
Para ela, viver a diversidade é, na realidade, não vivê-la. “Quando a diversidade vira algo do quotidiano, nem pensamos nisso. É natural passar na frente da fábrica e ver deficientes auditivos, cadeirantes, sempre trabalhando muito alegres. Isso elimina as barreiras. Todos têm capacidade e são incentivados a fazer o seu melhor.”
Para que que um ambiente como o descrito por Marianna seja implantado numa empresa, é preciso engajar as equipes de liderança. Foi o que afirmou Paulo Baraúna, diretor executivo de negócios e operações da White Martins. Um entre os três negros de sua turma de 23 alunos de um curso de engenharia, Baraúna enxerga a importância da variedade de pessoas e, consequentemente, de percepções em uma organização. Ele cita três pontos para uma melhor inclusão: o estabelecimento de métricas e objetivos transparentes e mensuráveis, o desenvolvimento de políticas de atração e o estímulo à geração de oportunidades.
A atração de diferentes pessoas dá às empresas a oportunidade de ter benefícios com as trajetórias de seus funcionários. Isso pode ser visto, por exemplo, nos casos do Instituto Avon, que tem como missão promover o empoderamento da mulher, e de Mafoane Odara, coordenadora de projetos da organização. “Venho de uma família de ativistas que se preocupa em reduzir desigualdades”, disse. “Chego à Avon com essa responsabilidade, após 20 anos trabalhando na área social e pensando no papel das empresas na inclusão.”
Mafoane destacou que as pessoas têm capacidade de se empoderar e as empresas devem garantir que elas tenham ferramentas para isso. Segundo ela, três fatores interferem no empoderamento feminino: a falta de autonomia econômica, a baixa qualidade de vida e a violência urbana.
No Instituto Avon, a coordenadora de projetos consegue deixar sua filha na creche, levá-la em viagens de trabalho e flexibilizar seus horários. “Vi minha filha falar ‘mamãe’ pela primeira vez; presenciei seus primeiros passos”, diz. “Estar perto dela me dá a segurança de ser uma profissional melhor e a certeza de que eu não preciso escolher entre ser mãe e ser executiva.”