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Sem Eike, qual o futuro do Glória?

Em 2008, assim que soube que o Hotel Glória corria o risco de ser demolido para dar lugar a mais um shopping center, o empresário Eike Batista, no auge da popularidade, anunciou que a REX, braço imobiliário de seu grupo, o EBX, desembolsara 80 milhões de reais pela compra do Glória. Era metade do valor […]

HOTEL GLÓRIA: durante muitos anos, foi a segunda casa dos cacifes da política brasileira /  (Divulgação/Divulgação)

HOTEL GLÓRIA: durante muitos anos, foi a segunda casa dos cacifes da política brasileira / (Divulgação/Divulgação)

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Da Redação

Publicado em 29 de abril de 2016 às 20h58.

Última atualização em 22 de junho de 2017 às 18h24.

Em 2008, assim que soube que o Hotel Glória corria o risco de ser demolido para dar lugar a mais um shopping center, o empresário Eike Batista, no auge da popularidade, anunciou que a REX, braço imobiliário de seu grupo, o EBX, desembolsara 80 milhões de reais pela compra do Glória. Era metade do valor que ele pretendia gastar numa ampla reforma, que incluía, entre outras mudanças, a construção de uma piscina aquecida com borda infinita, um restaurante com cúpula de vidro e um lobby com pé-direito de 11 metros. O Gloria Palace (sem acento, para internacionalizar o nome), prometia Eike, ficaria pronto em agosto de 2011 e seria o mais luxuoso hotel do Rio de Janeiro, um dos orgulhos da cidade-sede dos Jogos Olímpicos de 2016.

O roteiro que se seguiu é conhecido. Os arroubos megalomaníacos custaram caro a Eike, que viu seu império ruir. O Glória, cuja reforma foi paralisada no segundo semestre de 2013, quando a petroleira OGX, atual OGPar, pediu recuperação judicial, arrastando as demais empresas do grupo controlado pelo empresário, transformou-se num prédio em ruínas, um tormento para os moradores da região, preocupados com o acúmulo de poças de água na construção abandonada, foco para proliferação do mosquito Aedes aegypti.

Em fevereiro de 2014, uma esperança: Eike anunciou a venda do hotel para o fundo suíço Acron por 200 milhões de reais. Em novembro do mesmo ano, os suíços reformularam o contrato para atrair o empresário de volta ao empreendimento, o que se mostrou um tiro no pé: Eike, desinteressado do negócio, atrasou os procedimentos legais para a conclusão da venda. A piora da crise econômica brasileira e os impactos do setor de petróleo na atividade do Rio levaram os suíços a desistir de vez da compra. Nesse meio tempo, a Four Seasons, uma das maiores redes hoteleiras de luxo do mundo, mostrou também interesse em administrar o novo Glória, mas desistiu pelos mesmos motivos.

No começo deste ano, surgiu um novo comprador. O Mubadala, fundo soberano de Abu Dhabi, decidiu comprar o Glória e uma fatia de 29% da OSX, empresava naval controlada por Eike, atualmente em processo de recuperação judicial. No início de março, o Glória representou o maior alívio para Eike em toda a sua derrocada — ao repassar o hotel definitivamente para o Mubadala, ele recebeu a quitação das dívidas com os árabes. Ou seja: Eike está quite com seu maior credor e, de quebra, não tem mais nada a ver com o hotel.

O fundo árabe ainda não anunciou oficialmente a data de reinício das obras do novo Glória e se vai manter o projeto original, elaborado pelo arquiteto Hamilton Casé em parceria com o americano Jeffrey Beers, responsável pelo design interno do hotel. O que se comenta nos bastidores é a possibilidade de Eike voltar no futuro a ser dono de parte do estabelecimento. Mas, por causa de tantas reviravoltas, ninguém mais se arrisca a fazer previsões quando o assunto é o Hotel Glória.

Charme e história
Nunca houve um hotel como o Glória. No Rio, apenas o midiático Copacabana Palace, o preferido dos turistas, superou-o em charme e elegância. Mas durante muitos anos, sobretudo até o Rio deixar de ser a capital da República, era o Glória, próximo ao Palácio do Catete, a segunda casa dos cacifes da política brasileira. Ou a primeira, como no caso de Getúlio Vargas, que morou por muitos anos no hotel. Já Jânio Quadros fez do Glória o QG de sua campanha presidencial. Por motivos não menos nobres, Juscelino Kubitschek e João Goulart, dois notórios mulherengos, acharam no Glória o refúgio perfeito para suas aventuras amorosas.

“Não houve um presidente, desde Epitácio Pessoa, que mandou construir o hotel, até Lula, passando por Vargas, Geisel, JK, Sarney e FHC, que não tivesse pernoitado pelo menos uma noite no Glória”, diz o jornalista Zuenir Ventura, que, como repórter, cobriu vários eventos no hotel, de desfiles carnavalescos a cerimoniais políticos.

Se o Glória voltará a recuperar seu charme e história ainda é um mistério. É preciso, primeiro, voltar a colocá-lo de pé. Seus antigos hóspedes e frequentadores, porém, lamentam que Eike não tenha tido a sensibilidade de preservar um dos patrimônios da casa, o Teatro Glória, inaugurado em 1970, com capacidade para 350 lugares, palco de grandes espetáculos.

O também jornalista Sérgio Cabral, pai do ex-governador do Rio, Sérgio Cabral Filho, vai ainda mais longe. Ele lembra que, antes do Teatro Glória, funcionava no mesmo lugar, dentro do hotel, a lendária boate Béguim. “Foi lá que Carmen Miranda causou comoção ao aparecer de surpresa, em janeiro de 1955, para assistir ao show No País dos Cadillacs”, diz Cabral. Meses depois, Carmen morreria, vítima de uma overdose de barbitúricos. Manter toda essa história viva, agora, depende dos árabes.

(Tom Cardoso)

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